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O sexo frágil

Na classe trabalhadora de países desenvolvidos, os homens estão em dificuldades

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Por Redação
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À primeira vista, o patriarcado parece mais sólido que nunca. Mais de 90% dos presidentes e primeiros-ministros são homens, como também o são quase todas as principais lideranças empresariais do planeta. Os homens ocupam posição dominante em áreas como finanças, tecnologia, cinema, esporte, música e até em shows de stand-up. Em boa parte do mundo, ainda desfrutam de privilégios sociais e legais só porque têm um cromossomo Y no DNA. Pode causar estranheza, portanto, dizer que eles estão em maus lençóis.Mas não são poucas as razões para preocupação. Se os homens ocupam majoritariamente os degraus mais altos da sociedade, também formam o grosso dos que estão por baixo. Em comparação com as mulheres, é muito maior a probabilidade de que eles sejam presos, percam o contato com os filhos ou cometam suicídio. Nos países desenvolvidos, é 50% maior a chance de um menino ser reprovado em matemática básica, leitura e ciências.E, nesses países, há um grupo em particular para o qual as condições são ainda mais adversas. Os homens com baixo nível de escolaridade têm enfrentado dificuldades para lidar com as mudanças drásticas ocorridas no mercado de trabalho e no lar nos últimos 50 anos. A desvalorização da força muscular, causada pelo uso crescente da tecnologia e pela expansão do comércio, dificultou para os homens menos escolarizados encontrar um papel no local de trabalho. Por sua vez, auxiliadas por sua maior capacitação, as mulheres vêm tomando conta de setores em expansão, como saúde e educação. À medida que a educação foi se tornando mais importante, as meninas ultrapassaram os meninos (a não ser nas fases mais avançadas da vida acadêmica).No setor industrial, é comum que os homens que perdem o emprego nunca mais voltem a trabalhar. E para um homem desempregado é difícil conquistar uma mulher que se disponha a viver a seu lado. O resultado, para os homens de baixa qualificação profissional, é uma combinação venenosa: sem emprego, sem família e sem perspectivas.Das nucleares às físseis. Os políticos de esquerda tendem a se concentrar no aspecto econômico. A redução nas oportunidades de trabalho para os homens, dizem eles, perpetua a pobreza e destrói famílias. Nos EUA, de 1979 a 2013, a remuneração dos homens que concluíram apenas o ensino médio caiu 21%, em termos reais; entre as mulheres com a mesma qualificação, observou-se um aumento de 3%. Dos homens americanos que têm só o diploma do ensino médio, cerca de um quinto está desempregado.Já para os políticos de direita, o problema é o colapso da família. A vasta maioria das mulheres deseja um companheiro que faça a sua parte, tanto em termos financeiros, como domésticos. Mas elas preferem ficar sozinhas a se unir a um sujeito preguiçoso, mesmo quando não parece haver coisa melhor disponível no mercado: nos Estados Unidos, os homens desempregados dedicam a tarefas domésticas e cuidados com crianças ou idosos a metade do tempo dedicado por mulheres que se encontram na mesma situação. Mas passam muito mais tempo que elas assistindo televisão.Daí o desmanche das famílias trabalhadoras. As famílias estruturadas em torno de um pai e uma mãe, que ainda são a regra nas camadas mais privilegiadas da sociedade, vêm desaparecendo nas camadas mais pobres. Nos países desenvolvidos, de 1980 para cá, o porcentual de nascimentos fora do casamento triplicou, chegando a 33%. Em algumas regiões, onde a atividade manufatureira tradicional entrou em colapso, o índice chega a 70% ou mais. Os filhos de famílias desfeitas aprendem menos na escola e têm maior probabilidade de abandonar os estudos e, posteriormente, costumam ganhar menos do que os filhos de famílias que permanecem unidas. Também não se mostram muito capazes de constituir famílias estáveis.Esquerdistas e direitistas com frequência parecem estar falando grego uns com os outros. Mas suas explicações não se contradizem: na origem do problema estão tanto mudanças de ordem econômica, como de ordem social, e as duas causas se reforçam mutuamente. Além disso, os problemas tendem a se agravar. Mais segmentos da economia serão profundamente afetados pela tecnologia, e, apesar disso gerar benefícios para a sociedade como um todo, tornará supérfluos os trabalhadores que não conseguirem se atualizar. A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) prevê que o número absoluto de famílias monoparentais continuará a aumentar em quase todos os países ricos. Os meninos que crescem longe do pai tendem a ter mais dificuldade para estabelecer relacionamentos duradouros, criando um ciclo de disfunção masculina.Funileiro, soldado, cabeleireiro. O que pode ser feito? Parte da solução está numa mudança nas atitudes culturais. Na última geração, os homens de classe média aprenderam que precisavam ajudar a cuidar dos filhos e acabaram modificando seu comportamento. Os homens das famílias trabalhadoras têm de seguir o exemplo. As mulheres se deram conta de que podem ser cirurgiãs e físicas sem perder a feminilidade. Os homens precisam entender que o desaparecimento de trabalhos manuais tradicionais não tem volta e que eles podem ganhar a vida como enfermeiros ou cabeleireiros sem perder a masculinidade.Os governantes também precisam dar sua contribuição, pois há algumas leis que só fazem piorar o problema. Os Estados Unidos reduzem a oferta de homens disponíveis para o casamento trancafiando milhões de jovens condenados por crimes menores e dificultando sua vida profissional quando eles saem da cadeia (no Estado da Georgia, por exemplo, indivíduos com condenações criminais não podem alimentar porcos, ser bombeiros ou trabalhar em casas funerárias). Vários países ricos desestimulam o casamento ou a coabitação entre homens e mulheres pobres ao reduzir os benefícios a que eles têm direito quando se casam.Ainda mais importante que abolir políticas públicas insensatas é reequipar o sistema educacional, que foi pensado numa época em que a maioria dos homens trabalhava com os músculos. Os políticos precisam reconhecer que o baixo desempenho escolar dos meninos é um problema sério e é preciso enfrentá-lo. Determinadas políticas trazem benefícios para todo mundo, mas em especial para os meninos. A educação pré-escolar contribui para que os meninos se estruturem e estejam mais preparados para desenvolver habilidades verbais e sociais. Países com sistemas vocacionais bem-sucedidos, como a Alemanha, têm resultados mais positivos que os países anglo-saxões quando se trata de motivar os rapazes de perfil não acadêmico e guiá-los na busca de um emprego.Em termos mais gerais, as escolas precisam se tornar ambientes mais acolhedores para os meninos. Precisam reconhecer que os garotos têm mais prazer em ficar correndo de um lado para o outro do que as meninas: é melhor proporcionar a eles diversas atividades esportivas e brincadeiras em que possam gastar energia do que medicá-los com Ritalina ou esbravejar com eles porque não conseguem parar quietos na carteira. Precisam oferecer a eles mais modelos masculinos: a contratação de um número maior de professores homens para dar aulas no ensino fundamental cumpriria a dupla função de pôr os meninos em contato com homens com os quais eles podem se identificar e mostrar a eles que um homem pode tanto ser um bombeiro, como um professor.A crescente igualdade entre os sexos é umas maiores conquistas do período pós-guerra: as pessoas têm mais oportunidades que nunca de realizar seus sonhos, seja qual for o seu gênero. Mas alguns homens têm tido dificuldade para lidar com esse mundo novo. É hora de dar uma mãozinha para eles.2015 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. TRADUZIDO POR ALEXANDRE HUBNER, PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM.

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