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O superávit está desaparecendo

Afrouxar as metas fiscais gera reações previsíveis: a S&P advertiu que Brasil pode perder status de bom pagador

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Por Redação
Atualização:
Ministro Levy disse que flexibilização da meta não foi capitulação, mas um recuo tático Foto: Ueslei Marcelino/Reuters

Quando o Brasil conquistou seu grau de investimento, em 2008, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva comparou o "grau especulativo" em que o País se encontrava antes a um sujeito preguiçoso que gasta o dobro do que ganha, principalmente com jogo e bebidas. Dali em diante, bravateou o ex-presidente, com seu linguajar tipicamente popularesco, o Brasil seria um trabalhador responsável, preocupado em "cuidar da família". No entanto, sob o comando da sucessora e pupila de Lula, Dilma Rousseff, o Brasil corre o risco de sofrer uma recaída e voltar à vida de embriaguez e jogatina.

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Na terça-feira, a agência de avaliação de risco Standard & Poor's afirmou que os brasileiros estão sujeitos a perder seu tão acalentado status de "bom pagador" se não se emendarem. A advertência foi uma resposta à decisão do governo brasileiro, anunciada na semana passada, de reduzir as metas de superávit primário (isto é, descontados os custos com o serviço da dívida) do País para o período de 2015 a 2018. As metas deste ano e do ano que vem encolheram de 1,1% e 2,0% do Produto Interno Bruto (PIB), respectivamente, para 0,15% e 0,7%. "O governo parece ter jogado a toalha em relação ao ajuste fiscal", queixa-se um executivo de um banco de investimentos. Acredita-se que as outras grandes agências de avaliação de risco não perderão tempo em seguir o exemplo da S&P.

O Banco Central tinha esperanças de poder baixar as taxas de juros em breve. O afrouxamento fiscal inviabiliza isso: na quinta-feira, a autoridade monetária elevou os juros (pela sexta vez consecutiva) em meio ponto porcentual, para 14,25%.

O ortodoxo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, diz que a redução das metas não é uma capitulação, e sim um recuo tático. A desaceleração do PIB está sendo mais acentuada do que o previsto, esclarecem autoridades governamentais, o que pressiona a arrecadação. Pelos novos cálculos da área econômica, as receitas com impostos serão R$ 122,5 bilhões (US$ 37 bilhões) inferiores ao projetado inicialmente para este ano.

Levy pretende engordar o caixa do governo com receitas extraordinárias, geradas por ações como o leilão de concessões de infraestrutura, algumas privatizações (tímidas) e uma anistia tributária para a repatriação de recursos mantidos no exterior. Mas se a economia não voltar a crescer de forma mais vigorosa - e não há sinais de que isso vá acontecer -, a dívida pública bruta deve superar os 70% do PIB até 2018, calculam analistas do BNP Paribas. Esse nível de endividamento é inconsistente com um grau de investimento, tendo em vista a elevada conta de juros do Brasil, diz o especialista em finanças públicas Mansueto Almeida. Conservar a nota de crédito implica reformar a Previdência Social, o regime de previdência do funcionalismo público e outras despesas fixas, que respondem por 80% do Orçamento, mas são politicamente intocáveis.

O mercado parece concordar com a S&P. O preço que os investidores têm de pagar para se proteger de eventual inadimplência nos títulos do Brasil disparou logo após o anúncio oficial da semana passada, e agora é mais alto do que o prêmio pago por quem quer se proteger de um calote da Turquia, cujos títulos a S&P classifica como especulativos. Em uma semana, o real se desvalorizou 3,9% ante o dólar.

A S&P se preocupou em ressaltar que a revisão da perspectiva do rating do Brasil não significa que o rebaixamento da nota de crédito é inevitável. A Índia passou dois anos em condição semelhante, antes de voltar a ter uma perspectiva estável, observa a agência. Levy e o Banco Central têm feito alguns progressos (o déficit em conta corrente diminuiu; as expectativas de inflação são mais favoráveis). É possível que a advertência da S&P ajude o governo brasileiro a pôr a cabeça no lugar. Mas o receio de uma recaída é cada vez maior.

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© 2015 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. TRADUZIDO POR ALEXANDRE HUBNER, PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM.

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