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Onde vai acontecer a próxima crise?

Dívidas das empresas podem levar a novos desequilíbrios, agora com os juros subindo

Por THE ECONOMIST
Atualização:
Peso das dívidas.A agência de classificação de risco S&P diz que, em 2017, 37% das empresas globais estavam muito endividadas. Foto: Bryan R. Smith/AFP

As taxas de juros estão subindo e provavelmente colocarão os mercados financeiros sob pressão. Investidores e reguladores adorariam saber de onde virá a próxima crise. Qual é o culpado mais provável? Crises financeiras tendem a envolver um ou mais desses três ingredientes: empréstimos excessivos, apostas concentradas e um descompasso entre ativos e passivos. A crise de 2008 teve aquela gravidade toda porque envolveu os três – grandes apostas em produtos estruturados ligados ao mercado imobiliário, balanços bancários que estavam sobrecarregados e também dependentes de financiamentos de curto prazo. A crise asiática do final da década de 1990 aconteceu porque as empresas tomavam muitos empréstimos em dólar e tinham receitas em moeda local. A bolha da Internet teve consequências menos sérias porque as apostas concentradas estavam em ações; a dívida não desempenhou um papel significativo. Pode parecer surpreendente afirmar que a gênese da próxima crise provavelmente está à espreita na dívida corporativa. Os lucros vêm crescendo fortemente. As empresas do índice S&P 500 estarão rumo a um ganho anual de 25% quando forem publicados todos os resultados do primeiro trimestre. Algumas empresas, como a Apple, estão nadando em dinheiro. Mas muitas outras não estão. Nas últimas décadas, as empresas têm buscado tornar seus balanços mais “eficientes”, elevando a dívida e aproveitando a dedutibilidade fiscal dos pagamentos de juros. Empresas com dinheiro de sobra tenderam a usá-lo para recomprar ações, seja sob pressão de investidores ativistas, seja para aumentar o preço das ações (e, portanto, o valor das opções dos executivos). Ao mesmo tempo, um prolongado período de taxas baixas fez com que se tornasse muito tentador assumir mais dívidas. A agência de classificação de crédito S&P Global diz que, em 2017, 37% das empresas globais estavam altamente endividadas. Isso representa cinco pontos porcentuais acima dos números de 2007, pouco antes da crise financeira. Da mesma forma, mais acordos de private equity estão acumulando dívidas maiores, em um nível superior a qualquer outro momento desde a crise. Um sinal de que a qualidade de crédito do mercado vem se deteriorando é que, globalmente, a classificação média dos títulos está caindo de maneira constante desde 1980, de A para BBB-. O mercado está dividido em títulos com grau de investimento (dívida com alta classificação de crédito) e especulativos, ou “lixo”, títulos que se encontram abaixo desse nível. A linha divisória está na fronteira entre BBB- e BB +. Então, o título médio se acha, agora, apenas um degrau acima do lixo. A qualidade caiu mesmo entre as dívidas com grau de investimento. De acordo com o Pimco, um grupo de gestão de fundos, nos Estados Unidos 48% desses títulos agora estão classificados como BBB, bem mais que os 25% dos anos 90. Os emissores também estão mais endividados do que antes. Em 2000, o índice de alavancagem líquida para os emissores BBB era de 1,7. Agora é de 2,9.Retornos maiores. Os investidores não estão exigindo maiores retornos para compensar a deterioração da qualidade da dívida corporativa; bem ao contrário. Em discurso recente, durante uma conferência na London Business School, Alex Brazier, diretor de estabilidade financeira do Bank of England, comparou o rendimento dos títulos corporativos com a taxa livre de risco (a previsão do mercado para a tendência das taxas oficiais no curto prazo). Na Grã-Bretanha, os investidores não estão exigindo que praticamente nenhum retorno excedente dos títulos corporativos reflita o risco de crédito do emissor. Nos EUA, o spread é o menor em 20 anos. Assim como as taxas baixas encorajaram as empresas a tomar mais dívidas, os investidores se sentiram tentados a comprar os títulos por causa dos baixos retornos disponíveis em dinheiro. Seguro. Brazier também revelou que o custo de fazer seguro contra um emissor de títulos que não consegue pagar, conforme medido pelo mercado de credit default swap, caiu 40% nos últimos dois anos. Isso faz parecer que os investidores estão menos preocupados com o calote corporativo.  Mas um modelo que analisa a maneira como os bancos avaliam a probabilidade de inadimplência, compilado pelo Credit Benchmark, uma empresa de análise de dados, sugere que os riscos quase não mudaram nesse período. Assim, os investidores estão recebendo menos retornos pela mesma quantidade de risco. Combine isso com o declínio da liquidez no mercado de títulos (porque os bancos deixaram de ser formadores de mercado) e você tem a receita para a próxima crise. Pode não acontecer este ano, nem mesmo no próximo. Mas já dá para ver alguns sinais ameaçadores. Matt King, estrategista do Citigroup, diz que as compras externas da dívida corporativa americana secaram nos últimos meses e que o retorno sobre a dívida com grau de investimento até agora neste ano foi de -3,5%. Ele compara os mercados com uma dança das cadeiras. À medida que os bancos centrais retiram o estímulo monetário, eles vão tirando cadeiras da roda. Em algum momento, alguém vai ficar sem cadeira e desabar no chão./ TRADUÇÃO RENATO PRELORENTZOU

© 2017 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM

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