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Os muitos desastres econômicos da Europa

É deprimente pensar na Grécia hoje em dia. Então vamos falar de outro assunto, ok? Você sabe como anda a economia da Finlândia?

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Por Paul Krugman
Atualização:

É deprimente pensar na Grécia hoje em dia. Então, vamos falar de outro assunto, ok? Vamos começar falando a respeito da Finlândia, que não poderia ser mais diferente daquele país corrupto e irresponsável ao sul. A Finlândia é uma cidadã europeia modelo; seu governo é honesto, as finanças são sólidas e a classificação de crédito é consistente, permitindo ao país tomar empréstimos a juros baixíssimos.

A Finlândia está também no oitavo ano de uma crise que reduziu em 10% o Produto Interno Bruto (PIB) per capita, e o declínio não dá sinais de estar perto do fim. Na verdade, se não fosse o pesadelo no sul da Europa, os problemas enfrentados pela economia finlandesa poderiam muito bem ser vistos como um desastre épico.

Aposentado grego se desesperaem frente à agência bancária em Atenas Foto: SAKIS MITROLIDIS/AFP

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E a Finlândia não está sozinha. O país faz parte de um arco de decadência econômica que se estende por todo o norte da Europa desde a Dinamarca - que não usa o euro, mas administra sua economia como se o fizesse - até a Holanda. Todos esses países estão em situação muito pior que a França, por sinal, cuja economia é sempre objeto de publicidade ruim por parte de jornalistas que odeiam sua forte rede de segurança, mas cujo desempenho tem sido superior ao de quase todos os demais países europeus, com exceção da Alemanha.

E quanto ao sul da Europa além da Grécia? Funcionários de governos europeus vêm alardeando a recuperação na Espanha, que fez tudo que deveria fazer e cuja economia finalmente voltou a crescer e até criar empregos. Mas o sucesso na concepção europeia significa um desemprego que ainda está perto de 23% e uma renda per capita que ainda está 7% abaixo do nível anterior à crise. Portugal também implementou obedientemente uma rigorosa austeridade - e está 6% mais pobre do que antes.

Por que tantos desastres econômicos estão ocorrendo na Europa? Na verdade, o mais impressionante a essa altura é o quanto os relatos das origens das crises europeias são diferentes. Sim, o governo grego tomou empréstimos demais. Mas o governo espanhol, não - a narrativa na Espanha envolve o crédito privado e uma bolha imobiliária. E a história da Finlândia não tem nada a ver com dívida. Em vez disso, o problema é a fraca demanda por seus produtos florestais, que ainda representam boa parte das exportações do país, e os tropeços da manufatura finlandesa, especialmente a Nokia, antiga campeã nacional.

Mas o que todas essas economias têm em comum é o fato de, ao entrarem para a zona do euro, elas se colocaram numa camisa de força econômica. A Finlândia viveu uma seríssima crise financeira no final dos anos 1980 - muito pior, no início, do que a crise atual do país. Mas os finlandeses conseguiram produzir uma recuperação relativamente rápida em boa medida com a acentuada desvalorização da moeda, tornando suas exportações mais competitivas. Dessa vez, infelizmente, não há moeda para desvalorizar. E o mesmo vale para os demais pontos problemáticos da Europa.

Isso significa que a criação do euro foi um erro? Bem, sim. Mas isso não equivale a dizer que a moeda comum deveria ser eliminada, agora que existe. A necessidade urgente é soltar as amarras da camisa de força. Isso envolveria medidas em múltiplas frentes, desde um sistema unificado de garantias bancárias até a disposição de oferecer alívio para a dívida de países que tentam se ajustar à má sorte renunciando à austeridade excessiva e fazendo todo o possível para aumentar a inflação subjacente na Europa - atualmente abaixo de 1% - ao menos até a meta oficial de 2%.

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Mas há muitos governantes e políticos europeus que se opõem a qualquer coisa que possa tornar o euro viável, que ainda acreditam que tudo ficaria bem se todos demonstrassem disciplina suficiente. E é por isso que há ainda mais em jogo no referendo de domingo na Grécia do que a maioria dos observadores percebe.

Um dos maiores riscos de o eleitorado grego optar pelo 'sim' - ou seja, votarem pela aceitação das exigências dos credores, repudiando assim a posição do governo grego e, provavelmente, derrubando-o - é que isso vai incentivar e legitimar os arquitetos do fracasso europeu. Os credores demonstrarão sua força, sua capacidade de humilhar quem quer que desafie as exigências por uma austeridade sem fim. E seguirão afirmando que a imposição do desemprego em massa é o único rumo responsável.

E se a Grécia optar pelo 'não'? Isso nos levará a um terreno assustador e desconhecido. É possível que a Grécia abandone o euro, algo que causaria imensas perturbações no curto prazo. Mas isso também dará ao país a chance de uma recuperação real. E servirá como um saudável choque para a complacência das elites europeias.

Ou, em termos um pouco diferentes, é razoável temer as consequências do voto no 'não', porque ninguém sabe o que viria a seguir. Mas devemos temer ainda mais as consequências de um 'sim', pois, nesse caso, sabemos o que viria em seguida - mais austeridade, mais desastres e, finalmente, uma crise pior do que qualquer coisa que já tenhamos visto.

Tradução de Augusto Calil

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