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Perda com ‘gatos’ na rede elétrica chega a R$ 8 bi

Diariamente, cerca de 5% da energia produzida no País é furtada do sistema; maior número de fraudes ocorre nas distribuidoras do Norte

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Por André Borges e BRASÍLIA
Atualização:
'Gatos' consomem uma média de 5% da produção diária nacional de energia Foto: Hélvio Romero/Estadão

Todos os dias, um volume de energia suficiente para iluminar todo o Estado de Santa Catarina e seus 7 milhões de habitantes é roubado da geração elétrica nacional. São mais de 15 milhões de megawatts de energia que, por hora, escorrem pelos cabos das ligações clandestinas, os famosos “gatos”, que só em 2015 geraram prejuízo superior a R$ 8 bilhões.

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Os dados apurados por novo estudo do Instituto Acende Brasil, especializado no setor elétrico, expõem o tamanho do rombo financeiro que, no fim das contas, acaba sendo cobrado dos consumidores que mantém suas contas e instalações em ordem. Isso ocorre porque as distribuidoras trabalham com margem de preço suficiente para arcar com as diferenças entre a energia que compram das usinas geradoras e aquela que efetivamente faturam para seus usuários. Caso contrário, correriam risco de ir à bancarrota.

Na média, o roubo elétrico suga diariamente 5% da produção nacional de energia. A diluição, golpe dado por milhões de instalações clandestinas, ajuda a ofuscar o tamanho do estrago. Os R$ 8 bilhões furtados em 2015 e que não chamam a atenção da população superam, com folga, os R$ 6,2 bilhões que a Petrobrás teve de declarar em baixas contábeis no mesmo ano, por conta da corrupção escancarada pela Operação Lava Jato, da Polícia Federal.

“Há um problema moral nisso tudo. A sociedade acaba tolerando uma situação dessas como se fosse natural, porque se trata do que se costuma chamar de pequeno furto. Mas quando observamos a dimensão do problema que é produzido, encaramos como a realidade do setor é assustadora”, diz Claudio Sales, presidente do Acende Brasil.

Calote. Aos golpes, soma-se o peso da inadimplência. Clientes que somam mais de dois anos de atrasos no pagamento da conta de luz geram prejuízo de mais R$ 3 bilhões por ano. Somados com os gatos, chega-se a um rombo de R$ 11 bilhões.

As distribuidoras da região Norte do País concentram o maior número de fraudes. A Amazonas Energia (AME), controlada pela estatal Eletrobrás, vê regularmente 32,5% da energia que lança pelas linhas de transmissão do Estado ser consumida por instalações ilegais. Na Companhia de Eletricidade do Amapá (CEA), esse volume foi de 28,1% em 2015.

O baque mais agressivo das fraudes é sentido pelo Rio de Janeiro. A Light, uma das maiores distribuidoras do País, entrega energia para 4,2 milhões de clientes. Outras 1,75 milhão de unidades de consumo, porém, (sejam consumidores formais da empresa ou não) roubam energia diariamente dos postes cariocas. Na Baixada Fluminense, conforme números da própria empresa, 40% da carga são desviadas por golpes. As fraudes consomem ainda 30% do que chega até as zonas Norte e Oeste do Rio.

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Do total da energia distribuída na área de concessão da empresa, 23,4% é furtada, o equivalente aos 6 mil megawatts consumidos por todas as residências do Espírito Santo. Nos cálculos da Light, se todos esses furtos fossem eliminados, a tarifa de energia no Rio cairia 17%.

As maracutaias têm sobrecarregado as distribuidoras do Rio e, segundo a Light, provocado interrupções no fornecimento. “Entre os dias 22 e 31 de janeiro a Light atendeu 30 mil chamados em razão de interrupções”, declara a empresa.

Apesar de o maior número de ligações irregulares ser nas favelas, é nas mansões e nos bairros nobres do Rio que ocorrem os maiores assaltos elétricos. Donos de casas de luxo roubam energia para fazer a manutenção de suas piscinas, por exemplo, consumindo um volume de energia muito superior à média de pequenas casas. Dentro da clientela ilegal, as áreas nobres respondem por 55% do total desviado, segundo a Light.

Em janeiro, a Light fez 30,4 mil inspeções para encontrar ligações irregulares. Foram identificadas 20,4 mil irregularidades, um índice de acerto de aproximadamente 70%. “Neste mesmo período, foram efetuados junto à polícia 26 registros de ocorrência, com quatro prisões”, informou a empresa.

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Setor público. O setor público, que deveria ser exemplo de responsabilidade financeira com o setor elétrico é na verdade seu principal caloteiro. Por consequência, também afeta a contabilidade das distribuidoras de energia todos os meses e o bolso da população. 

A iluminação pública e os órgãos municipais e estaduais lideram a lista de inadimplência em todo o País, segundo dados do Instituto Acende Brasil. Enquanto o calote de ao menos três meses nas contas de luz oscilou entre 2,6% e 3% em 2015 entre consumidores residenciais, comerciais e industriais, no poder público o índice dobrou, indo a 6%. 

Nos últimos anos, a inadimplência registra volumes crescentes, saltando de R$ 3,2 bi em 2013 para mais de R$ 5 bi em 2015. É um reflexo da alta das tarifas após a eleição presidencial de 2014. Em 2015, a conta de luz subiu mais de 50% devido ao “realismo tarifário”, que interrompeu o controle artificial do preço de energia, pelo governo, nos anos anteriores.

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Pelas regras atuais, a distribuidora de energia pode realizar o corte do consumidor por conta de inadimplência, mas só tem 90 dias para tal. Após esse prazo, a empresa não pode suspender a energia por conta de fatura vencida e não paga. 

Volume médio anual de energia furtada 
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