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Jornalista e colunista do Broadcast

Opinião|Quando a confiança falha

O futuro pode ser promissor, mas a realidade se mostra difícil, o que trava a economia

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Cortar os juros mais agressivamente é a única saída para injetar um novo gás nos índices de confiança, os quais, em outubro, interromperam meses de recuperação? Não são poucos os economistas a repisarem a seguinte ladainha: sem confiança, o Brasil não sai da recessão. Com quase nenhum espaço fiscal para estimular a demanda, caberá enfim ao Banco Central a tarefa de ressuscitar a economia?

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Há cinco semanas a projeção do Produto Interno Bruto (PIB) de 2016 vem piorando na pesquisa semanal Focus, do Banco Central, e há três semanas os analistas vêm revisando para baixo a expectativa de crescimento do PIB em 2017. Parece até que, no último mês, o mercado financeiro teve um choque de realidade em relação ao verdadeiro estado de saúde da economia brasileira: a convalescença deve ser bem mais demorada do que se acreditou com base na melhora recente dos índices de confiança de empresários e consumidores.

O impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff e a nomeação por Michel Temer de uma equipe econômica com respaldo entre investidores e empresários alimentaram uma significativa melhora nos índices de confiança. O da indústria, por exemplo, atingiu em setembro o maior nível em mais de dois anos e o do consumidor subiu ao maior patamar desde janeiro de 2015.

Mas, à medida que os indicadores da atividade econômica, como produção industrial e vendas no varejo, começaram a registrar quedas no terceiro trimestre, a confiança deixou de melhorar. Em outubro, o índice de confiança do setor de serviços recuou depois de sete meses em alta. O consenso entre analistas para o desempenho da economia no terceiro trimestre piorou: de estabilidade para um recuo ao redor de 0,6% do PIB. Com isso, o crescimento da economia esperado para o último trimestre deste ano deu a lugar à expectativa de estabilidade, na melhor das hipóteses. Crescimento mesmo, apenas no primeiro trimestre de 2017.

Por que, afinal, os índices de confiança não se provaram um indicador tão preciso para prever a retomada da economia quanto foram para antecipar a derrocada diante da crise política e fiscal gerada pelo governo Dilma? Porque, apesar de empresários e consumidores estarem mais otimistas em relação ao futuro, a parte do indicador de confiança sobre a situação atual segue frágil. Ou seja, o futuro pode até ser promissor com a aprovação de medidas fiscais, como a PEC que limita o gasto público à inflação, mas a realidade se mostra difícil, o que ainda trava consumo e investimento.

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Diante da frágil recuperação econômica, muitos acreditam que a redução num ritmo mais acelerado da taxa de juros pelo BC poderia ser a única saída. Depois do corte de 0,25 ponto porcentual dos juros, para 14% ao ano, há quem defenda uma redução de 0,50 ponto na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) marcada para 29 e 30 de novembro. Todavia, o BC já sinalizou que agirá com cautela ao baixar os juros. De um lado, alguém poderia dizer que, ao cortar a taxa Selic num ritmo mais lento, a economia demorará mais para voltar a crescer. De outro, é possível dizer que, ao agir com cautela, o BC ancora de forma mais consistente e sustentável as expectativas de inflação em prazos mais longos, o que, por tabela, pode gerar maior confiança de que, no futuro, o Brasil estará em melhores condições para crescer. Não à toa a projeção de inflação para 2017, no Focus, caiu para 4,94%, ante 5,06% quatro semanas antes.

Apesar da tentação em turbinar a atividade econômica via corte de juros mais agressivos, o Banco Central terá mais sucesso em contribuir para uma melhora nos índices de confiança se os agentes econômicos perceberem que a condução da política monetária não mira apenas a atividade econômica ou uma inflação menor no curto prazo, mas uma estabilidade de preços consistente e prolongada. Um BC com credibilidade é a melhor moeda para a confiança na economia.

Opinião por Fábio Alves

Colunista do Broadcast

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