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Ex-ministro da Agricultura e coordenador do Centro de Agronegócios da FGV

Opinião|Salada indigesta

Mesmo com bons resultados, agropecuária foi bem castigada neste ano

Atualização:

Vai terminando mais um ano e, de novo, todo mundo faz o balanço do que passou e especula sobre o que virá. Os agentes do agro estão convencidos de que 2017 foi um bom ano. Mesmo com a queda dos preços das commodities e com a famigerada Operação Carne Fraca, a agropecuária brasileira deu mais uma importante contribuição para o País, especialmente por causa da safra recorde de grãos, cuja produção cresceu 27,8% em relação ao ano anterior. Quanto ao PIB, o setor rural deverá crescer 11%, bem mais do que será o crescimento total, que ficará perto de 1%. Também terá importante desempenho no saldo comercial: as exportações do agronegócio de janeiro a outubro de 2017 foram de US$ 82 bilhões, 12,2% a mais que no mesmo período do ano passado, com um saldo de US$ 70,18 bilhões.

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E os produtores rurais, mostrando mais uma vez sua fé no futuro do País, estão terminando de semear outra grande safra de grãos, com aumento de 1,9% da área plantada, e usando a mais moderna tecnologia. O tamanho da colheita de 2018 ainda depende de São Pedro, e é cedo para fazer qualquer previsão.

Mas, mesmo com esses bons resultados, a agropecuária foi bem castigada no ano que termina, com uma complexa “salada” de problemas. 

Um bom exemplo disso é o Código Florestal, lei de 2012 que trouxe a possibilidade de legalização de todas as propriedades rurais, além de propiciar o conhecimento da real ocupação das áreas, viabilizando a ação pública e privada na preservação florestal. Pois passados cinco anos da promulgação da lei, sua implementação está pendente de decisão do STF sobre a constitucionalidade de alguns artigos, gerando dúvidas sobre a validade do Programa de Recuperação Ambiental.

Também do STF vem uma outra insegurança. Em 2011, o Supremo avaliou como inconstitucional a cobrança do Funrural. E este ano mudou de posição, passando a considerar que o tributo é devido. Isto criou uma crise tremenda, uma vez que desde 2011, muitas empresas compradoras de produtos agrícolas descontaram o Funrural, algumas o recolheram em juízo, outras não descontaram, e até agora há total incerteza a respeito. Mas é certo que, se isso for cobrado retroativamente, haverá grande quebradeira no campo.

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Quebradeira também virá se passar o projeto de lei do Senado que revoga a Lei Kandir, promulgada em 1996, que isenta de ICMS as exportações de produtos primários e semielaborados. Eis um absurdo: querem que o campo seja competitivo exportando impostos! A legislação perturba a indústria de transformação, como a de farelos vegetais que continuaram tributados na exportação. Mas não é voltando a taxar a matéria prima que se resolve essa disfunção. Se a Lei Kandir for revogada, milhares de produtores perderão competitividade.

A inovadora legislação trabalhista aprovada pelo Congresso Nacional, uma das mais importantes reformas para a força laboral brasileira, corre o risco de não ser aplicada: já existe manifestação de alguns juízes do Trabalho de que não seguirão a lei. Se isso realmente acontecer, haverá outro retrocesso.

Uma campanha contra os defensivos agrícolas trouxe informações inverídicas aos consumidores brasileiros, estabelecendo desconfiança quanto à qualidade dos alimentos aqui produzidos. O Brasil é o sétimo maior consumidor de agroquímicos, e não o primeiro, como se “desinformou”. Ficamos atrás de países como Japão, Alemanha, França e Reino Unido quanto ao uso de defensivos por hectare cultivado, que é a maneira lógica para fazer comparação, e não pela área total...

Há ainda outros temas indefinidos, como uma portaria da Anvisa colocando em dúvida a qualidade dos alimentos industrializados, criando desconfiança sem razão. Há também a indefinição sobre compra de terra por estrangeiros, a reformulação da defesa sanitária e um sem número de pontos ligados à renda no campo, no que trabalha o Ministério da Agricultura, em favor dos avanços indispensáveis à melhor competitividade das cadeias produtivas.

Enfim, chegamos ao fim de um bom ano, mas talvez na ceia de réveillon tenhamos que enfrentar uma salada um tanto amarga. EX-MINISTRO DA AGRICULTURA E COORDENADOR DO CENTRO DE AGRONEGÓCIOS DA FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS

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Opinião por Roberto Rodrigues
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