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'Um líder tem de se importar com as outras pessoas'

Americano William Boulding, que propõe formas mais arejadas de liderar, veio ao Brasil divulgar o MBA da Fuqua Business School, escola onde estudou Tim Cook

Por Diego Moura
Atualização:
WilliamBoulding: "A corrupção é inimiga do bom negócio" Foto: Divulgação

Não há mais espaço para líderes centralizadores, anticolaborativos e que não sabem ouvir. Na visão do reitor da Escola de Negócios de Fuqua, da Universidade de Duke, nos Estados Unidos, William Boulding, o líder que o mundo precisa tem de saber montar um time diverso, com pessoas dispostas a trabalhar de verdade por um objetivo comum e com uma liderança que não tenha medo de ouvir. "E isto é realmente desafiador: ter pessoas com ideias diferentes sobre como fazer as coisas", disse ao Estado. "Ele cita o ex-aluno da escola, e hoje presidente da Apple, Tim Cook. "Tim é um bom exemplo de como agregar diferentes pessoas em uma estratégia de criar inovação."

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Boulding também acredita que o tempo do empresário que só se preocupa com o lucro já passou. Seu trabalho é fazer os executivos perceberem, na sala de aula, o oposto. "As pessoas não querem trabalhar mais para um líder egoísta e ganancioso", adverte. "Temos a responsabilidade de produzir os líderes que o mundo precisa. Procuramos pessoas que não sejam apenas inteligentes, mas que consigam compreender o ambiente em que estão inseridas e tenham valores, caráter, enfim, um propósito claro, que gere valor para a liderança", explica. 

O reitor esteve no Brasil na semana passada para promover o MBA de Fuqua. A instituição está no topo do ranking elaborado pela revista de negócios Businessweek, nos EUA. Mas, diz ele, um dos objetivos principais é aprender sobre a sociedade brasileira. "Não tenho dúvidas de que o Brasil é uma das economias-chave no mundo. Já é hoje e será ainda mais no futuro." E completou: "Se nós não entendermos bem o Brasil, nós teremos problemas."

Confira abaixo trechos da entrevista e uma lista com as 5 principais ideias de Boulding:

Quais são as principais características das novas lideranças hoje? 

Nós, em Fuqua, temos a responsabilidade de produzir os líderes que o mundo precisa. Procuramos pessoas que não sejam apenas inteligentes, mas que consigam compreender o ambiente em que estão inseridas e tenham valores, caráter, enfim, um propósito claro, que gere valor para a liderança. Um líder hoje tem de, fundamentalmente, se importar com as outras pessoas. Eles têm de acreditar que "o seu sucesso, é o meu sucesso". Não devem ser egoístas, mas ao contrário: montar um grande time e ajudar as pessoas a alcançar um objetivo comum. 

Qual a chave para uma boa liderança?

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Ter caráter, mesmo ao lidar com uma situação difícil. Bons líderes fazem o que é correto e ético, sem se importar se tem alguém vendo ou não. E ele tem esses valores em que ele realmente acredita. Além disso, uma ideia forte é de que inovação vem com colaboração. E você precisa valorizar as pessoas que pensam diferente na sua equipe: ouvi-las e estar apto a motivá-las, trabalhando por um objetivo comum.

Em que medida a diversidade é incentivada? 

Nosso programa é muito, mas muito globalmente diverso. É importante termos estudantes do Brasil, da Índia, da China, de países africanos, europeus, dos EUA e assim por diante. Isso segue a ideia de que nós somos mais fortes juntos. Se conseguirmos trazer mais pessoas, diferentes entre si, nós aprenderemos mais, teremos mais experiências transformadoras. E isso não é simples. É muito mais confortável ter ao seu redor pessoas iguais a você, que falam como você, agem como você, pensam como você. Porque vai haver concordância sobre tudo, as mesmas conclusões. Quando você realmente concorda com tudo, você não melhora. 

E como se trabalha a diversidade de opiniões na hora de buscar um consenso? 

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Primeiro de tudo você tem de superar o medo de expor suas próprias ideias, aquilo em que você acredita e que é parte da sua experiência de vida. Pessoas têm medo de falar o que pensam, porque acham que tem de seguir um padrão. Com isso, você perde habilidades. "Por que você não faz do meu jeito?". É um sentimento comum que surge quando aparecem novas maneiras de pensar, com pessoas diferentes. E você tem de ter disciplina e paciência para entender e incentivar quem te incomoda, de modo que a pessoa se sinta confortável para dizer no que realmente acredita. Se você colocar pessoas diferentes em uma sala e não criar esse espírito, há apenas caos. Mas a partir do momento em que as pessoas expõem seu modo de pensar e elas percebem que têm objetivos em comum, há harmonia. 

O senhor faz referências a Tim Cook, que foi aluno de Fuqua, como um bom modelo de liderança. O que podemos aprender com ele?

Eu não conheci Steve Jobs, mas conheço Tim Cook. E sei que são muito diferentes. Tim é um bom exemplo de como agregar diferentes pessoas em uma estratégia de criar inovação. Tim direciona todas as suas estratégias para que a Apple cresça e tenha sucesso como uma equipe, que pode trazer ideias e soluções. Por exemplo, havia uma dúvida sobre a Apple ser uma empresa de hardware ou software. Tim disse que a Apple seria uma empresa de serviços de hardware e software, com uma grande habilidade de integração. E a Microsoft e a Google tentam copiar esse modelo, mas é difícil quando o que está por trás desse modelo é inovação baseada fundamentalmente em colaboração. Tanto faz ser nos EUA ou no Brasil, em uma empresa de tecnologia ou de saúde. A pergunta é: como você vai pensar a colaboração para liberar todo o potencial humano? E há tanto potencial. No Brasil, a cada ano surgem mais e mais pessoas que têm a oportunidade de contribuir com a melhora da sociedade, e isso é fantástico, ter líderes que abraçam isso, vindos de diferentes experiências. Isso vai ser muito importante para a economia brasileira.

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O senhor veio dos EUA até o Brasil para apresentar o MBA. Qual a importância que o senhor dá ao Brasil como ator global no processo econômico? 

Eu vim ao Brasil especialmente para aprender sobre esse País e estreitar relações com pessoas que sabem muito sobre a sociedade brasileira, sobre a economia. Uma de nossas regiões de enfoque é a América Latina, que não é uma região homogênea. E o Brasil é muito, muito importante. 

Recentemente, Barack Obama disse considerar o Brasil um importante ator global…

Não tenho dúvidas de que o Brasil é uma das economias-chave no mundo. É hoje e será ainda mais no futuro. Tem havido uma enorme transformação no País. Enormes desafios, hoje, claro, mas uma grande oportunidade de se tornar ainda mais significativo, tirando pessoas da miséria, trazendo-as para a classe média, e se tornando ainda mais significativo na América Latina e na economia mundial como um todo. Essa é uma das razões pelas quais estamos aqui. Nós acreditamos no Brasil como parte do nosso futuro. Se nós não entendermos bem o Brasil, nós teremos problemas. 

O senhor disse que as empresas, especialmente nos EUA depois da crise de 2008, perderam a confiança pública. Aqui no Brasil, vivemos um cenário de grandes operações da Polícia Federal. Vários dirigentes de grandes companhias, como Petrobrás e Odebrecht, estão na cadeia, o que também poderia indicar um clima de perda de confiança pública. Como é possível se recuperar disso? Como unir a capacidade de lucrar, mas, ao mesmo tempo, criar valor e ser confiável?

É importante lembrar que as empresas têm de ganhar dinheiro. Uma empresa tem objetivos e tem de ser sustentável financeiramente. E isso requer que haja geração de lucro. Então, as empresas estão constantemente tentando fazer melhor, criando uma empresa mais lucrativa. Mas, ao mesmo tempo, ela tem a obrigação de conseguir coisas boas também: criar empregos, tirar pessoas da pobreza, criar inovação para consumidores, melhorar vidas, dar algo em troca às comunidades onde estão instaladas, ser uma boa cidadã ambiental, deixar um legado positivo. A questão é que o lucro representa apenas uma dimensão de uma grande empresa. Se a empresa quiser ser lucrativa no longo prazo, ela precisa ter bastante sólido o compromisso de descobrir como fazer melhor coisas boas. Quando você começa a fazer coisas "nas sombras", isso é inimigo das boas práticas. É muito importante estar em um ambiente que não tolera corrupção, porque a corrupção é inimiga do bom negócio. É importante fazer as pessoas entenderem certas regras e sublinhar que os líderes vão seguir essas regras, e farão ainda melhor. É importante deixar claro que só se permitirão fazer coisas eticamente aceitáveis. Eu sou otimista. Há uma fase muito desafiadora no Brasil, mas eu sou otimista de que o futuro será melhor e o País, mais forte.

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