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Um país sobre rodovias concedidas

O investimento no setor precisa ser encarado com prioridade e urgência

Por César Borges
Atualização:

Na década de 50, o Brasil fez a opção de investir em estradas, apostando no transporte rodoviário como a melhor alternativa para pessoas e cargas, além de ser uma fórmula adequada para gerar empregos e investimentos na nascente indústria automobilística. Na época, a aposta era num país sobre rodas. A despeito dos resultados gerados no setor automotivo, 60 anos depois o Brasil vive um momento difícil quanto às alternativas logísticas de que dispõe.

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As ferrovias enferrujaram, os portos estagnaram e o transporte fluvial confirmou um potencial limitado por causa de rios pouco navegáveis. As honrosas exceções ficaram com os aeroportos, com um sinal animador dado pela popularização do transporte aéreo entre brasileiros com menor poder aquisitivo, e com as rodovias – nas quais o País experimenta há duas décadas uma bem-sucedida gestão de 10% da malha brasileira pela iniciativa privada.

O governo tentou equacionar a questão e apontou para ações que revigorem os modais ferroviário e portuário. São medidas importantíssimas, pois nosso desenvolvimento não pode mais prescindir de uma estratégia logística de longo prazo. Mas não temos tempo de aguardar essa solução, que levará no mínimo mais 20 anos para se tornar realidade.

O investimento em rodovias, assim, precisa ser encarado com prioridade e urgência. É por elas que trafegam hoje mais de 60% das cargas do País e mais de 90% dos passageiros, segundo levantamento da CNT. Por outro lado, faltam ao governo capacidade fiscal e recursos para investir.

A concessão das rodovias para a iniciativa privada é a única saída para novos aportes. Apenas as concessões de rodovias federais têm hoje potencial para investir imediatamente cerca de R$ 27 bilhões em ampliação e manutenção de cerca de 5 mil km de rodovias, caso todos os entraves atuais sejam equacionados corretamente.

O programa de concessões de rodovias de São Paulo tem sido um bom exemplo desse ganha-ganha. Segundo estudos da Bain Consultores, o governo paulista oferece hoje rodovias duplicadas, as chamadas autoestradas, com densidade maior do que a da França e do Estado da Califórnia, nos EUA. Defendo que se espalhe essa qualidade de rodovias, que oferecem segurança, conforto e melhor relação custo-benefício para todo o Brasil, gerando crescimento para as Regiões Centro-Oeste e Nordeste.

Há muitos desafios relevantes que precisamos enfrentar se quisermos atingir tais metas, com o apoio e entendimento dos governos, das classes políticas e produtoras e os usuários, além dos próprios investidores em projetos de infraestrutura.

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É preciso encontrar uma modelagem econômica realista e equilibrada, que dê condições sustentáveis para uma concessão de rodovia. Em nenhum lugar do mundo um empreendedor investe sozinho todo o seu recurso nesses projetos. A definição de financiamentos voltados para projetos logísticos de longo prazo, como são as autoestradas, torna-se imprescindível neste momento.

Essa mesma modelagem precisa também contemplar um equilíbrio que permita o acesso dos usuários com menor poder de compra e que trafegam em rodovias com menor fluxo de veículos e, pois, com menor retorno do investimento total.

Está na hora de esquecer as diferenças ideológicas e partidárias e desenvolver uma visão de Estado para o programa de concessões de rodovias de longo prazo para todo o Brasil. Vamos enfrentar essa questão urgente, eliminando barreiras que podem, sim, ser superadas, desde que haja vontade política e disposição entre todas as partes.

Enquanto não temos um Brasil com uma estratégia logística que integre todos os modais de maneira sustentável, vamos recuperar a máxima dos anos 50 e desenvolver um país sobre rodovias concedidas.

* EX-MINISTRO DOS TRANSPORTES, É PRESIDENTE EXECUTIVO ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CONCESSIONÁRIAS DE RODOVIAS (ABCR)

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