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USP terá laboratório de dados para prever situações na saúde

Entre os trabalhos está o de avaliar a chance de diagnóstico de cada uma das doenças causadas pelo Aedes aegypti

Foto do author Fabiana Cambricoli
Por Fabiana Cambricoli
Atualização:

Esqueça a magia e a bola de cristal. O futuro pode, sim, ser previsto, mas com ciência, tecnologia e muitos dados. A Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) inaugura neste mês o Laboratório de Big Data e Análise Preditiva em Saúde (LABDAPS), justamente com o objetivo de, por meio da análise de grandes bancos de informações, identificar padrões no sistema de saúde que possam prever os mais possíveis desfechos para cada caso.

Para Chiavegatto Filho, o big data pode acabar com o 'achismo' na saúde Foto: FELIPE RAU | ESTADÃO

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Coordenado pelo professor Alexandre Porto Chiavegatto Filho e financiado com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e da Fundação Lemann, o laboratório terá a participação de mais de dez pesquisadores, entre docentes e estudantes de graduação, mestrado e doutorado, e contará com computadores capazes de analisar imensos bancos de dados.

Antes mesmo da inauguração de sua sede física, o laboratório já trabalha no desenvolvimento de quatro grandes projetos. O primeiro deles tem como objetivo estabelecer quais são as chances de diagnóstico de cada uma das três doenças transmitidas pelo Aedes aegypti – dengue, chikungunya e zika – em um paciente que procura o serviço de saúde com uma dessas suspeitas. Como os sintomas das três viroses são parecidos, o diagnóstico clínico fica prejudicado, e a detecção laboratorial é demorada, insuficiente ou nem sempre está disponível, como no caso do zika.

Para determinar a probabilidade de diagnóstico de cada uma das três patologias, os pesquisadores da USP analisarão as fichas de notificações de todos os casos suspeitos das três doenças no Estado de São Paulo entre 2015 e 2016 e cruzar com as informações de quais foram confirmados e quais foram descartados após a realização do exame.

“Vamos conduzir esse projeto em parceria com o Centro de Vigilância Epidemiológica da Secretaria Estadual da Saúde e ele poderá ajudar principalmente nos períodos de pico da doença, em que há um pânico na população e uma sobrecarga no sistema de saúde. Os algoritmos ajudarão a fazer uma triagem inicial dos pacientes, dar o risco de infecção por cada uma das três doenças e indicar qual deve ser priorizado”, explica Chiavegatto Filho.

O segundo projeto do laboratório quer estimar o risco de um idoso morrer em 5, 10 ou 15 anos de acordo com os hábitos, características e doenças de cada paciente. Para isso, os pesquisadores utilizarão um banco de dados de um grupo de mais de 2 mil idosos que vêm sendo acompanhados desde 2000 por outros cientistas da universidade que fazem estudos sobre envelhecimento.

“Sabemos que cerca de um terço desses idosos acompanhados já morreram nesse período de 16 anos, mas analisando as causas da morte e os indicadores de saúde dessa população, buscaremos padrões para estimar esse risco no restante da população com o mesmo perfil.”

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A terceira iniciativa do LABDAPS será analisar os dados das declarações de óbito do País para rever possíveis erros, principalmente no campo raça/cor, no qual, segundo Chiavegatto Filho, há muitos erros de preenchimento. “As declarações de óbito são importantes documentos para embasar políticas públicas de saúde, pois mostram as principais causas de mortalidade de acordo com o perfil de cada grupo populacional, mas elas não são tão bem preenchidas. O que percebemos numa pesquisa de 2014 é que a expectativa de vida de pardos no Brasil era maior do que a de brancos, apesar de os primeiros terem renda e escolaridade menor. Nossa hipótese é de haver um ‘embranquecimento’ por parte dos que preencheram as declarações, ou seja, pessoas que se consideram pardas em vida são colocadas como brancas no documento”, explicou. “A ideia é identificar esses padrões de erros acompanhando um grupo de pessoas durante a vida para ver qual é a cor/raça que elas declaram e qual é preenchida na declaração após a morte.”

Por fim, o quarto projeto buscará identificar, por meio da análise de resultados de saúde nos municípios que receberam profissionais do Mais Médicos, quais cidades se beneficiaram mais do projeto e, portanto, devem ser priorizadas no envio de médicos.

Chiavegatto Filho diz que, com a escassez de recursos na saúde, pesquisas como as que serão desenvolvidas pelo laboratório ajudarão a dar mais eficiência à gestão do sistema de saúde. “O potencial do machine learning e do melhor uso de dados é impressionante. Quanto mais a gente adotar uma abordagem rigorosa e científica, menos espaço a gente deixa para manipulações partidárias e ideológicas, garantindo, assim, políticas públicas de maior impacto e interesse para a sociedade.”