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Jornalista e comentarista de economia

Opinião|Vem aí o superajuste

A novidade está em que a economia mundial se recupera com força e isso traz consequências

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Atualização:

A economia mundial terá de passar por um grande ajuste, o que pode produzir solavancos. A derrubada das bolsas globais na segunda-feira não pode ser avaliada apenas como susto. Mostra que os mercados não estão preparados para o que tem de vir.

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Necessidade de ajuste pressupõe existência de desajuste. Os atuais desajustes foram produzidos pelos grandes bancos centrais, desde 2008, em resposta a outro desajuste. A crise que começara então caracterizou-se por forte rejeição de ativos (títulos, ações, imóveis e commodities). As razões dessa rejeição são capítulo à parte. O que importa aí foi a reação dos bancos centrais.

Para criar demanda ao megaencalhe de títulos, os bancos centrais passaram a comprar ativos, a chamada operação afrouxamento quantitativo (quantitative easing: QE). Essas compras corresponderam a despejo enorme de dinheiro nos mercados. Apenas o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) emitiu US$ 4,4 trilhões. Operações equivalentes foram feitas pelo Banco Central Europeu, Banco da Inglaterra e Banco do Japão.

Essa dinheirama supervalorizou os ativos, principalmente ações nas bolsas globais, mas não produziu disparada no custo de vida, fenômeno ainda à procura de explicação. O sumiço da inflação foi a principal razão pela qual os bancos centrais foram adiando o ajuste, que consiste em reverter o QE: devolver, com a suavidade possível, os títulos aos mercados e, em contrapartida, enxugar o volume de moeda. (Menos moeda, pela lei da oferta e da procura, aumenta o preço do dinheiro, os juros.)

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A novidade está em que a economia mundial se recupera com força. Nos Estados Unidos, além de avanço do PIB de 1,5% e de 2,3% nos dois últimos anos, houve grande aumento da procura por mão de obra. O desemprego caiu a 4% da força de trabalho, apontando para situação próxima do pleno-emprego. Mais procura por mão de obra implica aumento dos custos de produção e maior demanda por mercadorias e serviços. A volta da inflação parece contratada e o Fed terá de retirar dinheiro (aumentar os juros) para combater a alta.

Apenas a perspectiva de aumento dos juros produz, por si, só brutal transferência de recursos: rejeição de aplicações de risco e procura por renda fixa e segurança. As bolsas despencaram por isso e por um fator adicional: ampla automação nas mudanças de posição. Os computadores estão programados a emitir ordens instantâneas de venda desde que se configurem determinadas condições medidas por algoritmos.

Para evitar grandes deslocamentos que podem botar o navio a pique, os bancos centrais têm de operar com muito cuidado. Mas, por mais suaves que sejam na condução de sua política monetária (política de juros), têm de contra-atacar sempre que a inflação prevalecer. Esse mega-ajuste e a dosagem a ser empregada é questão em debate.

A economia brasileira que se beneficiou até agora da impressionante abundância de recursos (bonanza) poderá ter de enfrentar vagalhões. E aí conta o equilíbrio do navio. Os enormes rombos fiscais e, mais ainda, a baixa disposição política para levar adiante as reformas deixam a economia brasileira especialmente vulnerável.

CONFIRA:

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» Mais um corte

O Copom decidiu cortar os juros básicos (Selic) em mais 0,25 ponto porcentual, para 6,75% ao ano. É o nível mais baixo desde 1999. Esse movimento já fora sinalizado pelo Banco Central. Por isso, foi objeto das apostas majoritárias do mercado financeiro e de quem põe dinheiro no mercado futuro de juros. O comunicado avisou que a disposição é manter os juros por aí mesmo, a menos que algo novo altere a atual conjuntura favorável para a recuperação da economia. O risco maior é a paralisação das reformas.

Opinião por Celso Ming

Comentarista de Economia

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