PUBLICIDADE

Os bastidores do 'choque de gestão' no Masp

Com doação individual média de R$ 100 mil, grupo de empresários e altos executivos angariou R$ 15 milhões, em uma das maiores captações já feitas por um museu privado

Por Monica Scaramuzzo e Catia Luz
Atualização:
Masp, um dos cartões-postais de São Paulo, passa por resstruturação Foto: Rafael Arbex/Estadão

Tem de tudo um pouco. O grupo de empresários e executivos de alto escalão que nos últimos meses engendrou uma operação para salvar o Museu de Arte de São Paulo (Masp) reúne de grandes gestores de fundos a usineiros, de banqueiros a varejistas. Amantes da arte ou não, desde junho eles levantaram, juntos, R$ 15 milhões para resgatar o museu privado, em uma das maiores captações da história do País feitas a partir de doações na pessoa física para preservar um patrimônio cultural.

PUBLICIDADE

Na lista de 83 pessoas capitaneada por Heitor Martins, sócio da consultoria McKinsey e ex-presidente da Bienal São Paulo, e Alexandre Bertoldi, sócio do Pinheiro Neto Advogados, responsáveis por estruturar a operação, há nomes como Alfredo Setúbal, herdeiro e vice-presidente do Banco Itaú, Flávio Rocha, presidente da rede de moda Riachuelo, e Alain Belda, sócio-presidente para a América Latina do fundo Warburg Pincus.

Ao lado deles aparecem também o investidor Luis Stuhlberger, Fersen Lambranho e Antonio Bonchristiano, sócios da gestora GP Investments, e Marcelo Martins, vice-presidente de finanças e relações com o mercado do grupo Cosan. "Tinha ideia de que o museu enfrentava problemas financeiros, mas não sabia o tamanho do problema. Senti-me motivado a ajudar", afirmou o executivo ao Estado.

Patrice Etlin, presidente do fundo de investimento americano Advent na América Latina, explica que sua motivação foi além do seu gosto por artes plásticas. "O Masp é mais do que um patrimônio de São Paulo e, quando fui procurado para colaborar, percebi que havia uma diretoria engajada, com um plano sério de gestão, levando um conceito de empresa para dentro do contexto cultural", explica.

Com um rombo de cerca de R$ 12 milhões, o Masp - dono de um acervo estimado entre US$ 2 bilhões e US$ 3 bilhões, considerado a maior coleção de arte do Hemisfério Sul - enfrentava nos últimos anos problemas financeiros e de gestão. Os recursos ajudaram a sanar passivos e a dar fôlego para enfrentar os desafios nos próximos meses. Do total da dívida, um quarto era trabalhista, outra igual parte tributária e o restante dividido entre bancos e fornecedores. "A arrecadação, em média, foi de R$ 100 mil por pessoa, entre novos conselheiros, patronos, associados e diretores", diz Heitor Martins, no comando do museu desde setembro.

Transparência.

As doações, contudo, foram condicionadas à transparência corporativa da nova gestão. "Mesmo uma organização sem fins lucrativos não prescinde de boa gestão", diz Antonio Quintella, presidente da gestora de investimentos Península, que também está entre os doadores. Admirador de música, arquitetura e artes plásticas, Quintella faz a afirmação com conhecimento de causa: o investidor faz parte de vários conselhos de instituições culturais, entre elas a Filarmônica de Nova York e a Orquestra Sinfônica de São Paulo.

Publicidade

Todos os doadores são membros agora do novo conselho deliberativo do museu, hoje composto por 83 nomes, 90% dos quais convidados a integrar a equipe nesses últimos meses por Martins, atual presidente, e pelos diretores estatutários - Alberto Fernandes (Itaú BBA), Flavia Velloso (Benchmark Investimentos), Jackson Schneider (Embraer), Nilo Cecco (Valuation Consultoria) e Miguel Chaia (professor da PUC-SP), além de Alexandre Bertoldi.

O banqueiro José Olympio Pereira, presidente do Credit Suisse no Brasil e um dos maiores investidores de artes plásticas do País, está também entre os "novatos" do conselho. Ele diz, porém, que não participa ativamente da gestão porque já está envolvido com várias iniciativas ligadas à arte - ele preside o conselho de administração da Pinacoteca de São Paulo.

"Minha relação com o Masp é emotiva", diz João Carlos Figueiredo Ferraz, ex-usineiro que hoje administra o Instituto Figueiredo Ferraz, em Ribeirão Preto (SP), que reúne obras de seu acervo particular de arte. "Lembro de visitar as obras na avenida Paulista ainda adolescente entre 1966 e 1967 com meu pai (José Carlos Figueiredo Ferraz, engenheiro responsável por tocar o projeto de Lina Bo Bardi, e prefeito de São Paulo de 1971 a 1973)." Ferraz foi à inauguração do Masp, em 1968. O evento teve a presença da rainha Elizabeth, da Inglaterra.

Mas o prédio suspenso da Avenida Paulista, que virou cartão-postal da capital, suscita mais do que memórias. "Assim como a Riachuelo populariza a moda, o Masp tem de cumprir seu papel popularizar a arte", diz Flavio Rocha, da Riachuelo. Para Maurílio Biagi Filho, que tem participação em usinas e empresas, a doação foi feita por amor a São Paulo. "Particularmente, não entendo de arte."

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

Tirar o Masp da crise
1. Acervo. Com o mais importante coleção de arte ocidental clássica e moderna fora da Europa e América do Norte, o Museu de Arte de São Paulo tem um acervo estimado entre US$ 2 bilhões e US$ 3 bilhões, com cerca de 8 mil peças. Suas obras são consideradas valiosas e raras.
2. Público. O museu é o maior do Brasil em número de visitantes - são cerca de 845 mil por ano, acima da Pinacoteca, que atrai 500 mil pessoas por ano (dados de 2012). É o maior em importância do Brasil e América Latina e o 51º mais visitado do mundo. A expectativa, com as mudanças que estão em andamento, é que o número de visitantes possa crescer. Há uma demanda reprimida, segundo os novos organizadores, uma vez que a região metropolitana de São Paulo tem 20 milhões de habitantes, fora a demanda de turistas.
3. Expansão. A proposta da nova gestão do museu é promover uma série de eventos no Masp, além de exposições, concertos musicais e novas atividades culturais. Foi contratado o renomado diretor artístico, Adriano Pedrosa, que já começou a planejar novas programações. O projeto prevê a retomada do uso dos cavaletes idealizados pela arquiteta Lina Bo Bardi, desativados nos anos 90.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.