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BTG Pactual enfrenta saída conturbada de algumas apostas de André Esteves

Estratégias arrojadas levaram o ex-analista de sistemas à fama internacional em 2006, quando, aos 38 anos, se tornou o mais jovem bilionário brasileiro 

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Por Redação
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  Foto: JONNE RORIZ|ESTADÃO

SÃO PAULO - Quando o BTG Pactual assumiu o controle da varejista Leader Participações há cerca de três anos, parecia que ocorreria um clássico caso de reestruturação: uma rede problemática que poderia ser modernizada para atender a florescente classe média do país.

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O tiro saiu pela culatra quando a clientela da Leader apertou os cintos conforme o Brasil entrou na pior recessão em 25 anos. A atuação do banco de investimentos em uma fusão da rival Seller ajudou, então, a azedar uma relação tensa com a família Gouvêa, fundadora da Leader.

O investimento, um das duas dezenas de compras que o fundador do BTG Pactual, André Esteves, realizou com recursos próprios e de clientes durante meia década de negócios frenéticos, agora está sob ameaça, com a sua prisão no mês passado em desdobramentos relacionados à operação Lava Jato.

O BTG Pactual, que Esteves transformou no maior banco de investimento independente da América Latina nesta década, está rapidamente vendendo ativos e recebendo financiamento emergencial, enquanto investidores se mostram assustados, temerosos de que ele seja afetado pelo escândalo.

Os problemas do banco significam que co-investimentos como a Leader, que emprega 6 mil funcionários, ou a Brasil Pharma, endividada rede de drogarias, podem não receber novos recursos. A empresa de sondas para exploração de petróleo Sete Brasil, que Esteves descreveu como "seu maior fiasco", está sob o risco de colapso, com US$ 4 bilhões em dívida antes de ter entregue seu primeiro navio.

Mais jovem bilionário. Esteves, que já foi analista de sistemas, comprometeu cerca de US$ 10 bilhões em recursos do banco e de clientes para projetos fundiários, participações acionárias, imobiliários e de infraestrutura ao longo dos últimos seis anos. Ele emergiu à fama internacional em 2006, quando, aos 38 anos, se tornou o mais jovem bilionário brasileiro com a venda do antecessor do BTG Pactual ao UBS.

Ao elevar a exposição à maior economia da América Latina, Esteves perseguiu uma filosofia de compartilhar o risco com clientes em um momento de confiança generalizada de que a economia brasileira estava finalmente amadurecendo. Contudo, a estratégia, encapsulada em sua definição do BTG Pactual como "um banco de investimento que investe", agora está sendo revertida, conforme o banco é forçado a vender ativos e a economia brasileira enfrenta uma recessão.

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"O humor era diferente antes, quando o BTG Pactual e muitos rivais assumiram apostas em um Brasil sempre em crescimento", disse Claudio Furtado, professor de finanças da Fundação Getúlio Vargas. "Mesmo Esteves, um banqueiro brilhante, não poderia prever que tudo ficaria ruim de uma vez."

Com a rápida reversão da onda de otimismo neste ano, algumas dessas apostas azedaram. Agora, os esforços do banco para sair desses investimentos podem afetar ainda mais a economia do Brasil.

"Isso agrava uma situação que já estava dura, e acaba motivando uma contração muito mais profunda", disse Jankiel Santos, economista-chefe da Haitong Securities do Brasil.

  Foto: WERTHER SANTANA|ESTADÃO

De olho em ativos. Em uma base anual, a economia brasileira encolheu 4,5% no terceiro trimestre, a contração mais profunda em quase duas décadas. O desemprego está na máxima em seis anos. A produção industrial e as vendas no varejo caem há mais de um ano.

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Uma autoridade sênior do governo, que pediu anonimato, disse que o encolhimento do BTG Pactual, embora não seja numericamente significativa para uma grande economia, ameaça afetar a confiança em um momento delicado.

O BTG Pactual deve demorar mais tempo para alienar alguns de seus investimentos problemáticos, mas potenciais interessados já estão rondando seus ativos mais valorizados, como a empresa de recuperação de crédito Recovery do Brasil, a operadora de estacionamentos Estapar Participações e a processadora de pagamentos com cartões Stone Pagamentos, disseram fontes.

Esteves arquitetou compras como a do private bank suíço BSI e de mesas de negociação de commodities para proteger o banco contra a desaceleração econômica do Brasil. Uma maior ênfase em receitas baseadas em tarifas buscou reduzir a fatia de investimentos proprietários no faturamento do BTG Pactual.

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A aquisição do BSI, contudo, praticamente dobrou o tamanho do BTG e sua necessidade de financiamento sem garantias. Agora, o BSI também está à venda.

Desde a prisão de Esteves, o BTG levantou cerca de R$ 15 bilhões para fortalecer sua posição financeira e contrabalançar as retiradas de clientes e o acesso mais restrito a financiamento.

A operação mais notável foi a venda da fatia de 12% na rede de hospitais Rede D'Or São Luiz ao fundo soberano de Cingapura GIC, o que trará à instituição financeira cerca de R$ 2,4 bilhões. A Rede D'Or deu retorno de quase 11 vezes a quantia originalmente investida - de longe, o negócio mais rentável do BTG Pactual.

Nesta quinta-feira, o BTG Pactual levantou ao menos R$ 530 milhões ao deixar parcialmente sua participação na empresa de imóveis comerciais BR Properties, disseram as fontes.

Na última sexta-feira, o BTG Pactual disse em um comunicado que diversas companhias expressaram interesse na BR Properties, na Recovery e na rede de academias BodyTech, assim como em co-investimentos como a Leader.

Impasse. Fontes próximas da situação disseram que a família Gouvêa quer obter o controle da Leader de volta do BTG Pactual e clientes, embora a um grande desconto em relação ao R$ 1 bilhão pagos por sua fatia de 70%. A família se recusou a comentar o assunto. O impasse entre os Gouvêa e o banco se agravou. A família alega que a administração apoiada pelo BTG na Leader demitiu membros importantes da equipe e adiou planos de fortalecer o capital, o que acelerou suas perdas, segundo uma das fontes.

A Leader, com R$ 1 bilhão em dívida e lucro operacional quase nulo, precisa de R$ 800 milhões em capital para voltar à lucratividade, de acordo com outra fonte.

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Uma outra pessoa disse que uma injeção de capital na Brasil Pharma também parece menos provável no momento.

As ações da Brasil Pharma foram as que mais recuaram entre as empresas com participação do BTG Pactual desde a prisão de Esteves, com investidores questionando a viabilidade do plano de injeção de capital, cuja metade seria subscrita pelo BTG Pactual e sócios.

A Leader não tinha um comentário de imediato. A Brasil Pharma não comentou, citando período de silêncio relacionado à oferta.

Sete Brasil. Mas de todos os investimentos do BTG Pactual, o mais doloroso é a Sete Brasil.

Aclamada pela presidente Dilma Rousseff como o pilar de suas políticas industriais, a Sete Brasil se tornou a aposta mais volumosa de Esteves: um projeto novo para fornecer até 28 sondas para a Petrobrás, em uma transação que já foi avaliada em US$ 80 bilhões.

O colapso da Sete seria devastador não apenas para bancos e fundos de pensão que apoiaram o projeto, mas também para dezenas de fabricantes de embarcações e outros fornecedores da empresa. Mais de 800 mil postos de trabalho podem ser perdidos, segundo uma fonte envolvida no plano de reestruturação da empresa.

Executivos da Petrobrás se opõem aos termos do contrato da Sete Brasil e permanecem em desavenças com o BTG Pactual e credores sobre o tema há meses. A Sete Brasil, contudo, não pode esperar mais.

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Tanto a Petrobrás quanto o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) abandonaram o projeto com os desdobramentos da operação Lava Jato. O BNDES rejeitou compromissos anteriores de refinanciar 3,8 bilhões de dólares em dívida, forçando o BTG Pactual a fazer uma baixa contábil do valor do investimento, acrescentou uma fonte. A Sete Brasil e a Petrobrás se recusaram a comentar o assunto.

Justificando as falhas envolvendo a Sete Brasil, Esteves disse em abril que em investimentos em ativos "você ganha e perde toda hora. Nos saímos bem muitas vezes, mas fizemos coisas estúpidas também".

(Por Tatiana Bautzer e Guillermo Parra-Bernal; reportagem adicional de Luciana Bruno, Flavia Bohone e Patrícia Duarte, da Reuters)

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