
Alguns clientes se emocionam ao ver o cenário. Pilhas de filmes clássicos em oferta na derradeira liquidação de uma das últimas locadoras da cidade. A Home Vídeo, que funciona há 27 anos na praça Vilaboim, no bairro de Higienópolis, em São Paulo, vai fechar as portas. Na entrada, uma faixa avisa: 'Passa-se o ponto'.
"O mercado acabou", afirma Hermínio Paschoal Filho, um dos sócios da casa. Na verdade, explica ele, a decadência começou com a chegada ao País da gigante americana Blockbuster, há dez anos, quando o mercado americano já começava a entrar em crise por causa da competição da internet e dos serviços de vídeo por demanda na TV a cabo. "Eles exploraram o que puderam no Brasil e depois foram embora", diz Hermínio, referindo-se à gigante americana que também não suportou a disputa de mercado e fechou no ano passado as últimas lojas da rede que chegou a ter 9 mil filiais nos EUA.
Mas o golpe mortal nas locadoras brasileiras não vem na internet e nem da TV paga, que estão mudando os hábitos e o mercado no mundo inteiro. "Aqui não dá mais para trabalhar, com os vendedores ambulantes vendendo discos piratas a R$ 5 ou R$ 2 em qualquer feira livre antes mesmo do lançamento nos cinemas", lamenta o empresário, que cobrava R$ 10 por filme alugado por dois dias.
A Home Vídeo foi criada em 1987, quando começou alugando fitas de videocassete. O mercado cresceu e Hermínio e seu sócio, o arquiteto Marco Maysinger, abriram mais três lojas. Chegaram a ter 27 mil títulos, a grande maioria de clássicos do cinema e especialmente filmes de arte e do cinema europeu. A qualidade da coleção garantiu alguns anos extras de sobrevivência.

Segundo os empresários, a transformação do mercado representa uma catástrofe para a cultura. "A internet e a TV paga oferecem muita coisa, mas é um mundo guiado pela audiência", diz Hermínio. "Estamos perdendo um acervo de inestimável riqueza cultural." Na opinião dele, a tecnologia e a pirataria transformaram a mídia gravada em discos em um produto descartável, sem valor.
Segundo o sindicato paulista de videolocadoras, o Estado já teve cerca de 3 mil locadoras em 2006, mas o número caiu pela metade em 2011 e continua encolhendo. O público, que trocou as fitas de vídeo pelo DVD e mais recentemente pelo Blu-Ray, sempre em busca de melhor qualidade, agora prefere a comodidade de alugar pela TV ou pela internet sem precisar sair de casa.
Entre janeiro e julho deste ano, as vendas de aparelhos DVD Player e Blu Ray caíram 11% e 27%, respectivamente, em comparação com o mesmo período de 2013, segundo a consultoria de varejo GVK. Já os aparelhos de Home Theater cresceram cerca de 5%, pois ainda servem para os novos tempos de filmes piratas, baixados na internet ou via TV paga.
O movimento na loja, que chegava a mais de 2,5 mil locações por semana, caiu mais de 80% nos últimos 12 meses. O número de funcionários caiu de 15 para 4 no período. Faz alguns meses, os dois sócios perceberam que estavam perdendo dinheiro, e o prejuízo era cada vez maior. "Não dá mais para trabalhar", diz o empresário, que decidiu se aposentar e passar uns tempos na Europa. "Lá também não existem mais locadoras, isso agora é coisa do passado."