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O Futuro dos Negócios

Opinião|O Big Brother do bem

Sensores e câmeras espalhados pelas cidades permitem maior eficiência, transparência e segurança - mas também trazem novos riscos

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Atualização:

Em pouco mais de duzentos anos - entre 1800 e 2011 - a população mundial saiu de 1 bilhão para 7 bilhões de habitantes. De acordo com o United Nations Fund for Population Activities, uma entidade que faz parte da Organização das Nações Unidas, em 2025 seremos 8 bilhões e em 2053, 10 bilhões.

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Há cerca de dez anos atrás atingimos, pela primeira vez na História da Humanidade, uma proporção maior de pessoas vivendo nas cidades do que em zonas rurais - uma tendência que não deve mais ser revertida. De acordo com relatório de 2014 publicado pelo Departamento de AssuntosEconômicos e Sociais da ONU, em 2050 dois terços da população mundial estará em cidades. E a concentração populacional em determinadas cidades também aumentou de forma significativa: em 1950, cerca de 80 cidades ao redor do mundo tinham população superior a 1 milhão de habitantes, e em apenas sessenta anos esse número mais que quintuplicou, atingindo 441 cidades. Em 2016, 38 cidades ao redor do mundo já apresentavam população superior a 10 milhões de habitantes.

Para fazer frente ao crescimento e à maior densidade populacional - algumas das maiores cidades do mundo possuem mais de dez mil pessoas por quilômetro quadrado - torna-se necessário aumentar a eficiência e alcance dos serviços oferecidos ao público: transportes, energia, saúde, segurança, moradia, infraestrutura e educação, por exemplo. Conforme vimos na semana passada, a Internet das Coisas desempenha papel fundamental nesse processo, coletando e transmitindo dados para sistemas integrados de análise e decisão.

Algumas cidades já se destacam no cenário mundial através da implementação de soluções tecnológicas para levar “inteligência” à gestão urbana. Singapura, escolhida ano passado pela Juniper Research como a cidade mais inteligente do mundo (tecnicamente, trata-se de uma cidade-Estado) lançou no final de 2014 um programa chamado de Smart Nation (algo como Nação Inteligente). As medidas incluem a instalação de sensores e câmeras pela cidade, que irão alimentar a plataforma batizada de Singapura Virtual.

Apesar dos benefícios da plataforma, existe uma preocupação relevante com a privacidade e segurança das informações. É possível fazer comparações com o “Big Brother”, figura criada por George Orwell em seu clássico “1984” no qual o governo monitora seus habitantes de forma ostensiva. Além disso, como em qualquer ambiente conectado, os dados coletados podem ser alvo de hackers, trazendo riscos para população em geral - como um ataque ao sistema de trânsito ou de abastecimento de água, gás ou eletricidade.

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Mas sensores e câmeras são peças fundamentais para a plataforma, que também permite a visualização da forma como uma multidão iria evacuar determinada região em caso de emergência. Isso é possível uma vez que softwares de simulação de multidões já possuem elevado grau de confiabilidade, aliando aspectos físicos (como cada elemento da multidão deve se comportar) com aspectos cognitivos (como cada elemento irá reagir aos estímulos recebidos). Esses sistemas são utilizados tanto para simulações urbanas quanto em filmes, seriados ou jogos, onde é necessário apresentar cenas com centenas ou milhares de pessoas de forma realista.

A diferença fundamental entre o programa que está em processo de implementação em Singapura e outros programas - como aqueles encontrados em Amsterdam, Londres, Nova Iorque ou Barcelona - é o elevado grau de centralização. Será a primeira vez que um governo poderá reunir um conjunto tão completo de informações a respeito de seus cidadãos - desde o movimento dos veículos até o uso de cigarros em zonas proibidas. Outro aspecto interessante é que diversas cidades disponibilizam os dados coletados - sempre respeitando o anonimato - para auxiliar no processo de tomada de decisão e engajar a comunidade. Quanto mais pessoas puderem acompanhar métricas de consumo, segurança e poluição, por exemplo, mais rapidamente decisões poderão ser tomadas. Os dados obtidos pela plataforma de sensores utilizada em Barcelona (chamada Sentilo), por exemplo, estão disponíveis para governos interessados em estudá-los e aplicá-los em suas cidades inteligentes. Os sensores coletam informações sobre trânsito, energia, chuvas, qualidade do ar e níveis de ruído, entre outros elementos.

Mas não são apenas as cidades que irão se beneficiar da expansão da Internet das Coisas em diversos domínios - mais do que nunca, com o crescimento populacional global e a redução do número de habitantes nas áreas rurais, será necessário elevar de forma significativa a produtividade e reduzir o desperdício em atividades agropecuárias. Semana que vem iremos discutir o impacto da IoT no meio rural. Até lá.

*Fundador da GRIDS Capital, é Engenheiro de Computação e Mestre em Inteligência Artificial

Opinião por Guy Perelmuter
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