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‘Perspectivas para as empresas ficaram mais sombrias’, diz Loyola

Ex-presidente do BC e sócio da Tendências Consultoria acredita que rebaixamento da nota de crédito dos EUA vai comprometer o lucro de algumas companhias brasileiras, especialmente as focadas em commodities

Por Leticia Bragaglia
Atualização:

O ex-presidente do Banco Central Gustavo Loyola afirmou em entrevista ao programa Economia & Negócios, transmitido pela Rádio Estadão ESPN, que a tendência natural, diante de uma perspectiva de baixo crescimento da economia global, é de que o BC adote uma política de redução de juros. Mas, segundo ele, essa decisão não deve ser tomada já na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), marcada para os dias 30 e 31 de agosto. De acordo com Loyola, a taxa Selic será mantida em 12,50% ao ano no fim do mês porque ainda não está configurada uma situação de crise mundial, e sim um "processo de perspectiva de baixo crescimento".

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Segundo o economista, o Brasil tem um "grande arsenal" para lidar com uma crise externa, principalmente a política monetária, com redução de juros e novas regras para depósitos compulsórios dos bancos. Loyola recomenda cautela à equipe econômica do governo em relação a eventuais medidas de política fiscal adotadas daqui para a frente. Para ele, a situação econômica tanto da União Europeia e quanto dos Estados Unidos chamou a atenção do mundo para o risco fiscal das nações. "Não vale a pena o Brasil cutucar essa onça com vara curta", disse, reconhecendo que a situação das contas do País hoje não é "ameaçadora".

No entanto, ele pediu atenção em relação aos gastos do governo. "Se a gente olhar para 2012, que terá aumento do salário mínimo e de outros compromissos com o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e obras da Copa do Mundo e da Olimpíada, vemos que está encomendado um volume muito grande de gastos", afirmou.

Como o rebaixamento da nota de crédito norte-americana afeta a economia mundial?

O rebaixamento evidencia as dificuldades fiscais da maior potência econômica do planeta, que não está sozinha nessa situação, existem problemas até mais graves na Europa. A grande dúvida do mercado é se teremos apenas uma recessão nos próximos anos ou se será uma depressão econômica. Eu acredito que os papéis da dívida dos Estados Unidos continuam sendo um risco muito baixo. É paradoxal, mas houve um aumento na procura pelos títulos americanos após a notícia do rebaixamento da nota de crédito do país. Isso mostra que os Estados Unidos continuam sendo o grande refúgio em momentos de tormenta. O que me preocupa bastante é a falta de crescimento do país, os indicadores continuam muito ruins por lá. E também o risco fiscal na Europa, ou seja a propagação da crise que atinge mais fortemente Grécia, Portugal e Irlanda, para países maiores, como Itália e Espanha.

O Índice Bovespa fechou em baixa de 8,08% nessa segunda-feira. Qual é a expectativa do senhor em relação ao mercado de ações nos próximos dias?

Nesta segunda-feira a queda foi muito intensa e chegamos perto de um circuit breaker, que é a interrupção do pregão em momentos de forte baixa. Para os próximos dias, aposto em uma correção dessas perdas, caso não haja novas notícias negativas. Mas quero dizer uma correção de exageros, não acho que a Bolsa vá engatar uma recuperação. E não podemos descartar que realmente ocorra um circuit breaker. Com essa perspectiva de baixo crescimento da economia norte-americana, e consequentemente, da economia mundial, a primeira coisa a ser atingida são as bolsas. O mercado de ações já vinha sentindo o clima pesado e é natural que nesta segunda-feira a reação de aversão ao risco por parte dos investidores tenha sido mais intensa. O rebaixamento da nota de crédito americana anunciado pela Standard and Poor´s deve comprometer o lucro das empresas. As perspectivas para o mundo corporativo nos próximos meses ficaram mais sombrias. Aqui no Brasil isso se reflete de forma clara no mercado de ações porque as empresas de commodities, as que mais sofrem em um momento como esse, tem grande peso na composição do Índice Bovespa. Estou falando de papéis como Petrobrás e Vale.

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A crise vai afetar a exportação de commodities?

Sem dúvida. A demanda global deve cair, os mercados ficarão menores e os preços também devem recuar.

O Brasil foi uma das maiores apostas do mercado após a quebra do banco Lheman Brothers, no fim de 2008. O senhor acha que os investidores agora vão tirar recursos do Brasil para cobrir perdas em outros mercados?

Eu acho que o Brasil acaba sofrendo com a crise mundial. Mas a nossa economia tem condições de se sair muito bem agora, assim como se saiu em 2008. Nós temos reservas internacionais, uma situação fiscal razoável e há instrumentos monetários que podem ser usados no Brasil para compensar uma eventual queda da atividade econômica. Então eu acho que o Brasil pode se sair muito bem, mas é uma ilusão achar que estamos fora do contexto global. Nós vamos ser atingidos por uma certa redução da liquidez global. A economia brasileira vai sofrer uma redução de crescimento, mas não vai entrar em crise.

O senhor acha que os bancos vão reduzir o dinheiro disponível para empréstimos aqui no Brasil?

Acredito que podemos ter um novo período de contração de crédito no Brasil, mas não como aconteceu no fim de 2008 e começo de 2009. Será uma contração mais moderada, que vai favorecer a política monetária brasileira ao ajudar a segurar a inflação.

Em momentos de crise as pessoas buscam proteção em ativos palpáveis. O senhor acha que irá aumentar a procura por investimentos como ouro, imóveis e terras agrícolas?

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Eu acho que a renda variável sofre mais em momentos como esse, quando se espera menos crescimento. Mas não acho que haverá rali dos chamados investimentos reais. As pessoas provavelmente vão migrar para a renda fixa, de alta liquidez e segurança.

Como o senhor acha que o governo deve lidar com essa perspectiva de desaceleração da economia global?

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O governo deve usar mais o instrumento monetário do que o instrumento fiscal, ou seja, deve mudar a receita do bolo. O Banco Central pode ser mais ousado na redução do juros.

A decisão da agência de classificação de risco Standard and Poor´s foi correta?

Eu acho que não. Não existe uma deterioração tão forte nas condições políticas dos Estados Unidos. Eu acho que, apesar dos problemas que enfrenta, o país ainda é uma democracia funcional, em fase de transição pré-eleitoral. Acredito que a partir do ano que vem haverá um consenso em relação ao ajuste fiscal. A decisão foi de certa forma precipitada. Colocou os Estados Unidos no mesmo nível de classificação de risco outros países que têm problemas políticos mais graves, como a Bélgica.

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