PUBLICIDADE

O que diz o guia de empregos mais vendido do mundo

Com dez milhões de exemplares vendidos, manual para quem quer buscar uma vaga ou trocar de emprego tem conselhos que continuam atuais após 42 anos

Por Phyllis Korkki
Atualização:
Mercado muda, mas receita para buscar emprego não Foto: Reprodução

Richard Bolles não é um homem de meias palavras.

PUBLICIDADE

Vamos explicar a questão de maneira simples e direta, escreve ele. Todo o processo de busca por emprego nesse país é digno dos neandertais.

Essa afirmação está em seu famoso livro de orientação para a carreira, What Color Is Your Parachute? (algo como  "Qual é a cor do seu paraquedas?"). Mas não consta na edição mais recente, e sim na primeira edição impressa para comercialização, publicada pela Ten Speed Press em 1972.

De acordo com Bolles, hoje com 87 anos, o processo de busca por emprego ainda tem algo dos neandertais. Mas nem tanto quanto antes, e o livro dele é certamente parte da razão por trás disso. O autor segue atualizando a obra todos os anos. O livro já vendeu um total de 10 milhões de exemplares e foi traduzido em 20 idiomas. Se somarmos todas as mais de 40 edições já publicadas, esta é a publicação mais vendida da editora Ten Speed Press (hoje divisão da Random House). E o título continua a ser bastante procurado.

Bolles fez a gentileza de me emprestar seu único exemplar daquela edição de 1972, para que eu pudesse compará-la com a versão de 2015, lançada esse mês. Assim como agora, o subtítulo é: Um manual prático para quem procura emprego ou quer mudar de carreira. Mas, fora isso, tive curiosidade de saber quais pontos do livro continuavam iguais.

Quando li o exemplar de 42 anos atrás, fiquei impressionada com o quanto a maioria daqueles conselhos ainda era pertinente. Sim, o texto está cheio de referências ao departamento de pessoal (até o nome mais recente desse departamento, recursos humanos, começa a soar datado) e a escolha de palavras pode parecer sexista para as sensibilidades modernas (“É preciso identificar o homem que tem o poder de contratá-lo e mostrar a ele como suas habilidades podem ajudar a solucionar os problemas dele.).

Mas três pontos principais do livro seguem válidos, como explicou Bolles num bilhete pessoal enviado com o livro:

Publicidade

*O sistema tradicional de busca de emprego é um jogo de números que tem tudo para prejudicar aquele que procura emprego.

*Uma minoria criativa desenvolveu métodos pouco tradicionais e muito bem sucedidos de busca de emprego, que envolvem a escolha do local de trabalho desejado e a subsequente abordagem das pessoas que podem contratá-lo para a empresa desejada.

* Antes de escolher, aqueles que buscam emprego devem olhar para dentro de si, descobrindo o que mais gostariam de fazer - e onde querem fazê-lo, do ponto de vista geográfico.

Esses três conceitos continuam tão relevantes em 2014 quanto eram em 1972, e o mesmo vale para o choque da rejeição, a perda da autoestima e a depressão que podem resultar de um longo período de busca por emprego, algo que Bolles também aborda em seu livro. Esses trechos do livro permanecem inalterados porque a natureza humana não muda, disse ele.

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

Mas muitos aspectos da edição mais recente de Parachute deixariam perplexos os leitores de 1972. O que é Google, e por que o autor fala tanto nisso? indagariam eles, depois de ler Bolles escrever que o Google é o seu novo currículo. E ele tempera seus comentários com referências ao LinkedIn, Facebook e Twitter.

A tecnologia trouxe a mais radical mudança na busca por empregos vista desde os anos 1970, é claro. Barbara Safani, presidente da Career Solvers, firma de gestão de carreiras em Nova York, disse por e-mail que Bolles se manteve relevante para novas gerações de leitores porque ele aceita e adota a internet e as mídias sociais como recursos importantes para aqueles em busca de emprego, ajudando-os a desmistificar os fóruns de vagas de emprego e os sites das mídias sociais.

Ao mesmo tempo, o livro continua popular porque Bolles se concentra não apenas no processo de procura de emprego, mas também no lado emocional e psicológico da busca por trabalho, disse ela. Não importa se a pessoa procurou emprego em 1984, em 1994 ou em 2014: é muito provável que os problemas enfrentados tenham sido parecidos.

Publicidade

A primeira edição da Ten Speed tinha pouco mais de 200 páginas. Hoje, o livro passa da marca das 350 páginas, conforme o autor continua a pesquisar o assunto e atualizar a obra, elaborando melhor tanto os conceitos universais quanto os técnicos. Pouco depois da primeira edição, ele acrescentou um autoinventário para ajudar as pessoas a identificar suas habilidades, características e preferências.

Bolles diz que, a cada ano, presta atenção naquilo que provoca mais ansiedade nas pessoas, algo que pode mudar com o tempo. No momento, o grande foco da ansiedade está numa escassez de postos de trabalho, algo que simplesmente não é verdadeiro, diz ele: em vez disso, foram as melhores maneiras de encontrar emprego que mudaram. Ele mencionou uma rede social chamada Jobs With Friends (conectada ao Facebook e ao LinkedIn) e um site de retorno pessoal e consulta chamado Checkster como duas formas possíveis para a busca de emprego.

Em altaEconomia
Loading...Loading...
Loading...Loading...
Loading...Loading...

A edição da Ten Speed de 1972 não é a primeira. Bolles começou publicando o livro de maneira independente, imprimindo os primeiros 500 exemplares de What Color Is Your Parachute? no Copy Copia, de San Francisco. Ele os ilustrou com litografias que obteve de graça. Encadernados numa frágil pasta plástica, os exemplares começaram como guias para membros do clero que estavam perdendo seus empregos conforme a economia mudava.

O próprio Bolles fazia parte desse grupo. Ordenado ministro episcopal, ele tinha pouco mais de 40 quando perdeu o emprego de pastor da Catedral da Graça em San Francisco. Então ele conseguiu um emprego de ministro dos sacerdotes que serviam nos campi universitários dos nove estados o Oeste.

Muitos dos empregos de pastor e as ocupações nas igrejas em geral estavam sendo cortados. Os pastores perguntavam a ele: Você foi demitido: diga-nos o que fazer, lembra-se Bolles. O caminho tradicional era voltar a estudar e treinar novamente para o trabalho em outra área, mas isso não era possível para a maioria deles - especialmente aqueles com famílias para sustentar.

Bolles não sabia o que dizer aos pastores, mas ele tinha um amplo orçamento para viagens. Assim, ele viajou pelo país pesquisando a realidade da busca por emprego, escrevendo os resultados. Então ele passou a se dedicar ao livro em tempo integral. E esse tem sido o emprego dele desde então.

(Quanto ao título chamativo e enigmático: quando reunia informações para o livro, ele ouvia as pessoas dizerem que estavam prontas para pular" de seus empregos. A certa altura, ele perguntou, brincalhão: E qual é a cor do seu paraquedas?)

Publicidade

De alguma maneira (ele diz não saber como) o manual mal acabado foi parar nas mãos de funcionários do Pentágono, da General Electric e outras organizações, e ele começou a receber pedidos de não-pastores. E Phil Wood, fundador da Ten Speed Press, entrou em contato com ele pensando em ampliar seu manual de 128 páginas para o público geral. A partir de então, o título entrou para as listas de mais vendidos.

Bolles seguiu os próprios conselhos, pois foi atrás do que gosta de fazer. Depois de uma grande guinada na carreira durante a meia idade, ele seguiu trabalhando muito além da idade na qual a maioria das pessoas já se aposentou. Diz que o trabalho não é repetitivo, pois sempre há algo a aprender. Às vezes ele altera a estrutura do livro de uma edição para a outra para manter a leitura interessante, disse Bolles.

Atualmente no quarto casamento, com quatro filhos e 10 netos, ele mora em Danville, Califórnia, perto de onde trabalhava como pastor. Bolles admite que o lucro de Paraquedas? permitiu que ele vivesse com conforto.

Mas não é esse o motivo que o leva a revisitar constantemente o livro e dar palestras a seu respeito, ano após ano. Como dizia o bilhete que ele me escreveu com a edição de 1972: Este trabalho - revisar, reescrever, atualizar e ensinar o livro a cada ano - é agora minha vida, e minha razão para estar vivo.

Tradução de Augusto Calil

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.