PUBLICIDADE

EXCLUSIVO PARA ASSINANTES
Foto do(a) coluna

Jornalista e comentarista de economia

Opinião|Festa para poucos

Há seis anos, o BNDES emprestava R$ 60 bilhões no mercado e já provocava distorções. Hoje, os ativos são de mais de três vezes esse valor e as mesmas distorções se multiplicam.

Foto do author Celso Ming
Atualização:

No início do mês, até mesmo o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, advertia que a concessão de créditos subsidiados ao Banco Central "poderia ser um dos fatores pelos quais os juros básicos tinham de ser tão altos". Esse "poderia", assim no condicional, foi entendido como um eufemismo para evitar afirmações mais categóricas e não aprofundar as críticas a uma das políticas do governo Lula. Na prática, os financiamentos do BNDES a juros inferiores até mesmo aos juros básicos (Selic) obrigam o Banco Central a "compensar" com juros mais altos a expansão de moeda produzida pelo BNDES.

PUBLICIDADE

COUTINHO - Distorções no BNDES (Foto: Wilton Junior / AE - 13/7/2009)

Dia 20 esta Coluna avançou outras críticas à atuação do BNDES na medida em que este passou a tomar recursos do Tesouro e, com eles, a espichar seu crédito subsidiado mais ou menos como fazia o governo militar, que financiou a expansão da economia com dívida externa.

Nesse final de semana, o Estadão apontou uma estranha preferência do BNDES por frigoríficos. Como mostrou a reportagem de Raquel Landim e David Friedlander, nada menos que um quarto dos R$ 40 bilhões subscritos por um dos braços do banco, o BNDESPar, nos últimos anos, destinou-se a apenas quatro frigoríficos: JBS, Marfrig, Independência e Brasil Foods.

Embora o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, repita que tudo se faz com transparência, ninguém sabe por que outros frigoríficos não conseguem ser convidados para a festa. E isso já demonstra uma distorção, que é a eleição arbitrária de beneficiários, o que prejudica a concorrência. Ninguém sabe tampouco como a eficácia dessas operações é medida. Alguns desses frigoríficos tiveram suas exportações recusadas na Europa por falhas de processamento da produção.

Publicidade

Há dias, dois frigoríficos, o JBS e o Marfrig, captaram R$ 6 bilhões por meio do lançamento de debêntures. Os dirigentes do BNDES afirmam que essa operação se fez "a preços de mercado". No entanto, o banco subscreveu nada menos que 83,3% do total (R$ 5 bilhões). Os recursos repassados ao Marfrig destinaram-se à compra de frigoríficos no exterior, que não criam emprego no Brasil.

A maioria das empresas favorecidas pelo BNDES possui previamente boa parte dos recursos para sua expansão. No entanto, diante da oferta irrecusável de financiamentos de longo prazo a custos subsidiados, usa o dinheiro em caixa para outros fins e trabalha alegremente com o presente do BNDES. E essa é outra distorção.

Não dá para sustentar também que os empréstimos do BNDES são realizados com garantia real e que, assim, dão destino seguro para os recursos do contribuinte que tem captado no Tesouro. A Oi, por exemplo, recebeu muito crédito de longo prazo para incorporar a Brasil Telecom e, no entanto, está atolada em dívidas de R$ 30 bilhões. Até que ponto conseguirá sustentar seu negócio é um mistério. E o BNDES sustenta ainda que, para cada real de passivo levantado no Tesouro, há um real sólido em ativos no setor privado.

Uma política industrial dessa qualidade é puro casuísmo. Não é como a chuva que cai mais ou menos por igual. É o exercício constante da escolha de apaniguados em detrimento do resto da economia.

Confira

Publicidade

O gráfico a mostra a evolução do rombo das Contas Correntes (com o exterior). Esse déficit está sendo financiado por entradas de capital, especialmente pela entrada de investimentos estrangeiros, um dinheiro que desembarca para ficar por aqui.

Muda a cobertura. O risco é o de que, em vez de investimentos externos, a principal cobertura para esse déficit passe a ser de capitais destinados a aplicações em renda fixa, um dinheiro mais nervoso e mais instável. Se alguma coisa der errado na economia, será o primeiro a bater asas.

Opinião por Celso Ming

Comentarista de Economia

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.