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Jornalista e comentarista de economia

Opinião|Inflação como salvação

Crescem nos Estados Unidos e na Europa as pressões para que seus respectivos bancos centrais desvalorizem rapidamente suas moedas com o objetivo de recuperar a economia.

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Atualização:

Quarta-feira, o Fundo Monetário Internacional se sentiu obrigado a advertir em relatório oficial que a elevação da meta de inflação nos Estados Unidos para 4% ao ano, como pleiteia certo número de economistas, teria tudo para ser um tiro no pé.

 Foto: Estadão

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Também na quarta-feira, o professor da Universidade Harvard, Martin Feldstein, sugeriu em artigo no Financial Times, de Londres, que uma rápida desvalorização do euro poderia não só salvar a Espanha, mas seria manobra importante para tirar a área do euro do atual sufoco.

A proposta de criar inflação controlada tanto nos Estados Unidos como na Europa é como combater incêndio com fogo propagado na direção contrária. Leva em conta dois objetivos. Um é a desvalorização das dívidas tanto em dólares como em euros. Dívidas desvalorizadas seriam mais facilmente pagas, por países soberanos e agentes econômicos. O outro é o barateamento em moeda estrangeira de mercadorias e serviços, proporcionado pela desvalorização cambial, de modo a elevar exportações e contribuir para a retomada da atividade econômica.

O maior problema dessa proposta não é o estrago a ser provocado no valor intrínseco das principais moedas de reserva nem o risco de hiperinflação. Mas o de que, provavelmente, não funcionaria.

O valor de uma moeda é sempre medido em outra. Se o dólar se desvalorizasse, digamos, seria em relação ao euro; e se o euro se desvalorizasse, seria em relação ao dólar. Ou seja, inflações provocadas por emissões simultâneas de moeda tenderiam a anular reciprocamente o efeito pretendido. Com isso, não dá para contar com o aumento das exportações nas duas maiores economias do mundo. Nem haveria desvalorização do dólar em relação ao euro nem vice-versa. E, no caso europeu, como é alto o comércio exterior intrabloco, a desvalorização do euro não ajudaria a expandir essa fatia das exportações.

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Além disso, se tanto o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) como o Banco Central Europeu emitissem moeda para provocar inflação, estariam, aí sim, colocando em marcha uma guerra cambial de vastas proporções. Como o yuan (moeda da China) está atrelado ao dólar, seria desvalorizado com ele. Ou seja, também a terceira economia global estaria imune às flutuações das principais moedas. Isso empurraria a conta do ajuste sobre o resto do mundo. Assim, os demais países, sobretudo Japão, Brasil e Índia, teriam de se defender para neutralizar o impacto das desvalorizações sobre seu comércio exterior.

Finalmente, se, ao contrário do que está dito acima, a desvalorização do dólar fosse eficaz, os preços das commodities, a começar pelos do petróleo, saltariam. E estaríamos diante de um surto global de inflação de consequências imprevisíveis.

Há ainda falta de lógica nessa proposta. Se a desvalorização fosse capaz de tirar o euro da atual enrascada e essa manobra fosse feita com a credibilidade esperada, o resultado imediato não seria a desvalorização, mas a alta do euro nos mercados internacionais de câmbio.

CONFIRA

O fato econômico mais importante da semana passada foram as declarações, em Londres, do presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi, de que fará tudo o que for necessário para evitar o colapso da área do euro. Entendeu-se que a direção do BCE se dispõe a recomprar títulos de Espanha e Itália, hoje largados.

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Alinhados. Sexta-feira, os principais chefes de Estado do euro, a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, e o presidente da França, François Hollande, deram pleno apoio a Draghi. Em declaração conjunta, garantiram fazer "tudo o que for necessário para respaldar o euro". A conferir nos próximos dias.

Opinião por Celso Ming

Comentarista de Economia

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