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Jornalista e comentarista de economia

Opinião|Mais consistência

As contas públicas do mês de março surpreenderam favoravelmente. Esta é uma indicação de que o governo está levando a sério sua disposição de produzir neste ano um bom ajuste fiscal que obtenha um superávit primário de R$ 117,9 bilhões ou, aproximadamente, 2,9% do PIB.

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Atualização:

Primeiramente, um conceito. Superávit primário é a sobra de arrecadação destinada a pagamento da dívida pública. A obtenção dele não significa ainda que as receitas sejam superiores às despesas, porque nessa conta não estão incluídos os juros da dívida. Isso acontece apenas no chamado saldo nominal. E nesse conceito há déficit. Em março foi de R$ 6,9 bilhões.

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Já o conceito de superávit primário é uma jabuticaba: é aplicado somente no Brasil. Em qualquer outro país, quando se fala em déficit orçamentário, aí também estão incluídos os juros da dívida. Portanto, vale o conceito de déficit (ou superávit) nominal.

Mas, voltando às contas de março, dá para dizer que, desta vez, o superávit primário de R$ 13,6 bilhões aponta para um resultado acumulado em 12 meses (terminados em março) de 3,2% do PIB, acima dos 2,9% previstos.

Outra observação, este ajuste, sem dúvida robusto, não foi obtido apenas com aumento de receita, mas também com alguma compressão de despesa. Essa é uma boa indicação da disposição do governo de cumprir seus compromissos na área fiscal.

Mas há algumas incertezas à frente. Uma delas é a de que os primeiros meses de governo, especialmente na esfera federal e nos Estados, se caracterizam por um ritmo naturalmente mais lento de produção de despesas. Daqui para frente, elas tendem a se acelerar e, portanto, a afetar também o superávit primário. De todo modo, o que se espera agora é que, de um mês para o outro, não avancem mais do que 4%, cerca de metade do que aceleraram nos últimos meses do governo Lula.

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Além disso, a atual política tem por objetivo obter certa redução de ritmo do econômico. Isso significa que, à medida que a economia for desaquecida, algum impacto será sentido na arrecadação e, nessas condições, tende a reduzir os resultados hoje positivos.

Outra fonte de incertezas, também na área das despesas correntes, deve corroer as finanças públicas especialmente no ano que vem. O governo federal já consagrou em lei o reajuste do salário mínimo de 2012. O número final ainda depende do que vier a ser a inflação deste ano, mas muito dificilmente deixará de ser inferior a 13,9%, a ser pago a partir de janeiro. Por conta desse fator, as finanças da Previdência Social já têm contratado um aumento de R$ 10 bilhões em seu rombo que, para este ano, está previsto em R$ 41,6 bilhões e que para 2012 seria mais alto, independentemente do fator salário mínimo.

Convém relembrar que nada menos que 66% dos aposentados pelo INSS recebem salário mínimo e já têm direito a esse reajuste no ano que vem. Além disso, a maioria dos Estados e municípios do Brasil tem sua folha de pagamentos fortemente concentrada em funcionários que recebem o mínimo. Isso significa que, dentro de mais alguns meses, as finanças públicas dos três níveis de governo voltarão a ser pressionadas.

CONFIRA

Troca de incertezas. No início do governo Dilma, acumulavam-se incertezas a respeito do ajuste das contas públicas. O governo Lula ajeitou as finanças de sua administração com criatividade suspeita e, por ocasião do anúncio dos cortes orçamentários, ficou a impressão de que os R$ 50 bilhões suprimidos do orçamento eram apenas o bode que havia sido deixado previamente na sala para depois ser retirado dali.

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Esquisitices. No entanto, as incertezas cresceram num campo em que não se esperava inventividade: no monetário. A condução da política dos juros pelo Banco Central mostrou esquisitices: negação da força da inflação; valorização excessiva das chamadas medidas macroprudenciais, apenas para evitar a alta dos juros; e deterioração da capacidade de condução das expectativas.

Controlar a inflação. Agora que se vê mais consistência na condução das contas públicas, falta saber se o Banco Central conseguirá voltar a controlar a inflação.

Opinião por Celso Ming

Comentarista de Economia

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