PUBLICIDADE

EXCLUSIVO PARA ASSINANTES
Foto do(a) coluna

Jornalista e comentarista de economia

Opinião|Trabalho para Hércules

Tempo de faxina não será tempo fácil; Não há como esperar por grande virada no crescimento econômico. Ao contrário, o aperto das contas públicas não deixará espaço para a disparada do consumo e da produção

Foto do author Celso Ming
Atualização:

Ninguém espere por grandes resultados em 2015. Se tudo der certo, será um ano de saneamento, equivalente ao da limpeza das estrebarias de Augias.

PUBLICIDADE

Das estrebarias de Augias, diz o mito, exalava imensa fedentina, porque nunca haviam sido limpas. Hércules assumiu a tarefa de fazer a faxina em um só dia, para ganhar em troca 10% do rebanho. A façanha foi realizada por meio do desvio do Rio Alfeu que, por algumas horas, passou pelas estrebarias e deixou tudo asseado.

A sujeira mais grossa da economia brasileira está hoje concentrada no desequilíbrio das contas públicas, onde atuou o Augias moderno, o secretário Augustin. A acreditar pelas novas atitudes da presidente Dilma, um rio saneador terá de passar por ali para evitar o rebaixamento da qualidade dos títulos de dívida do Brasil e criar condições para a retomada, mais à frente, do crescimento econômico sustentável. Além disso, sem esse saneamento, será impraticável evitar nova temporada de alta dos juros básicos.

 Foto: Estadão

Limpeza das estrebarias de Augias (Divulgação)

Tempo de faxina não será tempo fácil. Não há como esperar por grande virada no crescimento econômico. Ao contrário, o aperto das contas públicas não deixará espaço para a disparada do consumo e da produção. Não é à toa que as projeções dos economistas e das consultorias especializadas apontam para mais um avanço medíocre do PIB. A Pesquisa Focus, do Banco Central, que divulga a média das estimativas de cerca de 100 instituições, aponta para o crescimento em 2015 de apenas 0,8%.

Publicidade

Como será preciso corrigir os preços administrados (combustíveis, energia elétrica, transportes urbanos e, provavelmente, o câmbio), será inevitável nova estocada da inflação. A Focus aponta para 6,45%. O economista Nelson Barbosa, que deve ser nomeado ministro do Planejamento, há alguns meses afirmava esperar algo em torno dos 7,0%.

Não está claro ainda o que será feito para derrubar as despesas públicas que vêm crescendo a 13,2% ao ano. A indicação que chega é a de que, ao longo de 2015, o governo Dilma tentará estancar a atual sangria no seguro-desemprego e nas despesas com pensões.

Como não será suficiente, parece inevitável também algum aumento de impostos. O restabelecimento da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) nos preços dos combustíveis é uma possibilidade. Mas não pode ir muito longe, entre outras razões porque este não é um tributo arrecadatório. Sua função é regulatória e seu nível, mais alto ou mais baixo, deverá ser o mais adequado para os objetivos perseguidos pelo governo.

No entanto, o saneamento das contas públicas não será suficiente para virar o jogo. Se ele se confirmar vai ser apenas o quinto trabalho de Hércules. Será preciso, também, assegurar condições para o investimento. O restabelecimento do nível de confiança será um bom começo, principalmente, se vier acompanhado de proposta convincente de redução do atual déficit nominal das contas públicas (incluídas aí as despesas com juros). Mas será necessário criar regras atrativas e estáveis para as parcerias público-privadas, as PPPs, de modo a agilizar os leilões de concessão. O governo Dilma tem pouco tempo para formular e colocar em marcha seus projetos.

Em tempo: Augias não cumpriu o trato de pagar o trabalho de Hércules com o dízimo de seu rebanho.

Publicidade

CONFIRA:

 Foto: Estadão

O déficit das contas externas vai se alargando. Por enquanto, consegue ser compensado com entrada de dólares. Mas cada vez mais com recursos de curto prazo.

Rombo O Banco Central continua trabalhando com resultados excessivamente otimistas na balança comercial (exportações menos importações). Até a terceira semana de novembro, o déficit acumulado no ano já é de US$ 4,1 bilhões. A menos que sobrevenha um daqueles truques de última hora, ficou improvável escapar de um déficit inferior a US$ 5 bilhões.

Opinião por Celso Ming

Comentarista de Economia

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.