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Jornalista e comentarista de economia

Opinião|Você vai morrer depois

Mais tempo de vida é ótima notícia, de acordo com a percepção geral; Mas aliado ao declínio da fecundidade (famílias com cada vez menos filhos) intensifica o envelhecimento de toda a população, o que exige reformulações das políticas públicas

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"No dia seguinte ninguém morreu", escreveu o português José Saramago na abertura de seu romance As Intermitências da Morte, que reflete sobre como seria viver num lugar onde as pessoas não morressem mais. Asilos e hospitais ficariam superlotados, os serviços funerários se afundariam em crise e as companhias de seguro entrariam em colapso.

Considerações à parte, no dia 1.º de dezembro, o IBGE divulgou novos levantamentos que apontam vida mais longa para os brasileiros: expectativa de 74,9 anos, o equivalente a 3 meses e 25 dias a mais do que a do ano anterior.

 Foto: Estadão

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Mais tempo de vida é ótima notícia, de acordo com a percepção geral. Mas aliado ao declínio da fecundidade (famílias com cada vez menos filhos) intensifica o envelhecimento de toda a população, o que exige reformulações das políticas públicas.

Apenas para comparar, a expectativa de vida no Japão é de 83 anos; nos Estados Unidos, de 78 anos; e na França, de 81, como aponta o relatório World Population Prospects de 2012, da ONU.

Além de aumentar o número de idosos que necessitam de atendimento de saúde, a maior expectativa de vida impacta também o tipo de tratamento, alerta o médico sanitarista e professor de saúde coletiva da UNB Antônio José Costa Cardoso. "Nossos serviços de saúde ainda seguem a lógica das assistências pontuais. Essa população (mais idosa) enfrenta doenças crônicas, como diabetes, artrites e hipertensão, que exigem acompanhamento permanente. Nem o SUS nem a rede privada do Brasil estão suficientemente preparados para esse quadro. São doenças que exigem procedimentos mais complexos e cada vez mais caros", observa Cardoso.

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Outro impacto dessa esticada de vida é descarregado sobre as finanças da Previdência Social. Fácil entender por quê. Se vivem mais, recebem aposentadoria por mais tempo e a conta do sistema não fecha. Cada vez que o IBGE divulga uma atualização na expectativa de sobrevida, o fator previdenciário, usado para calcular o valor das aposentadorias por tempo de contribuição, precisa ser alterado. Isso aconteceu há dias. Um segurado com 55 anos de idade e 35 anos de contribuição que requereu a aposentadoria no dia 1.º de dezembro, terá de contribuir por mais 79 dias para receber o mesmo valor de benefício daquele que deu entrada no requerimento três dias antes.

Apesar de compensar de alguma maneira o impacto do aumento da expectativa de vida nas contas da Previdência Social, o fator previdenciário não é instrumento suficiente para reequilibrar as contas. Em 2014, o déficit da Previdência Social deve fechar por volta dos R$ 50 bilhões, como admitido na última semana de novembro pelo secretário do Tesouro, Arno Augustin.

"O número de indivíduos em idade ativa no Brasil vai continuar crescendo até 2020, mas, já no fim da década, tende a se estabilizar. Enquanto isso, o segmento de indivíduos em idade de se aposentarem deverá crescer cerca de 3,5% ao ano. Ou seja, de 2010 para 2040 o Brasil terá triplicado o número de idosos e mantido a mesma população ativa", alerta Paulo Tafner, pesquisador do Ipea e professor da Universidade Candido Mendes.

Para Tafner, uma das saídas para reequilibrar as finanças da Previdência Social é fixar a idade mínima de aposentadoria em 65 anos, tanto para homens quanto para mulheres, exigência a ser implantada aos poucos. Hoje, a concessão de aposentadoria leva em conta o tempo de contribuição: mínimo de 35 anos para homens e 30 para mulheres. "Quanto mais demorarmos para fazer essa reforma, mais severa ela terá de ser no futuro, além de descarregar essa conta sobre apenas uma geração".

Como mostra o gráfico acima, em 2010, os maiores de 65 anos eram 7,4% da população brasileira. Em 2060, serão 26,8%. São mais que frias estatísticas, esses números têm consequências. /COLABOROU LAURA MAIA

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Opinião por Celso Ming

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