PUBLICIDADE

EXCLUSIVO PARA ASSINANTES
Foto do(a) coluna

Bastidores do mundo dos negócios

Mercado adota conservadorismo e fonte de captação para fintechs seca

Foto do author Matheus Piovesana
Foto do author Altamiro Silva Junior
Por Matheus Piovesana (Broadcast) e Altamiro Silva Junior (Broadcast)
Atualização:
Nubank revelou ter alcançado a marca de 5 milhões de investidores.  REUTERS/Brendan McDermid Foto: Estadão

Faz apenas seis meses, mas o mercado de capitais que avaliou o Nubank como a mais valiosa instituição financeira da América Latina em sua estreia na Bolsa de Nova York é parte de um passado distante. O banco digital vale agora menos da metade do que foi avaliado na época, e para outros, a fonte secou. Com os bancos centrais globais elevando juros, os investidores estão preferindo manter dinheiro em caixa, em ritmo só visto no pós 11 de setembro de 2001, de acordo com o Bank of America. Isso significa uma longa estiagem para captações por fintechs.

PUBLICIDADE

Nesse novo ambiente, o Nubank e outros neobancos brasileiros, como PicPay, C6 e Neon, contam com os atuais sócios para manter o crescimento, enquanto fintechs menos endinheiradas podem ter problemas, na percepção de analistas. Crescer rápido custa caro, especialmente quando os bancos centrais fecham a torneira. Nos EUA, o Federal Reserve está acelerando o ritmo de alta de juros, enquanto o Banco Central Europeu anunciou que começa o movimento no mês que vem, na primeira elevação das taxas em 11 anos.

No Nubank, a avaliação é de que o IPO veio na hora certa. Em dezembro, mesmo após ter de reduzir a faixa de preço da oferta, a fintech captou o equivalente a R$ 14,4 bilhões, no câmbio da época. A janela que possibilitou a oferta estelar se fechou pouco depois.

"Se não tivéssemos feito o IPO, estaríamos com preocupação, tentando levantar esse capital no mercado privado", disse David Vélez, CEO e cofundador da fintech, ao Broadcast. Com dinheiro em caixa, ele avalia que o neobanco tem uma "oportunidade gigantesca", pode partir para aquisições e manter o apetite no crédito. "Tem um pessoal que pergunta se deveríamos ter ficado privados mais tempo. De jeito nenhum."

A diferença, agora, é o destino dos recursos. O analista sênior de instituições financeiras da Fitch, Pedro Carvalho, comenta que as expectativas do mercado para os neobancos mudaram junto com o ciclo monetário global. "O pensamento na última década foi de crescimento de base. Agora a preocupação talvez não seja de crescer tanto, mas crescer dentro da própria base", diz.

Publicidade

Segundo dados da consultoria Sensor Tower compilados pelo BofA, o Nubank é o maior banco digital do País em usuários ativos. O segundo colocado é o PicPay, controlado pela J&F, e que tentou um IPO no ano passado, mas postergou os planos.

"O PicPay tem o Grupo J&F como controlador. Ano passado, os acionistas controladores decidiram injetar mais capital próprio na empresa", afirmou a plataforma por e-mail. "A empresa tem concentrado seus esforços na diversificação de produtos, na venda cruzada, e mais eficiência, focando em crescimento com rentabilidade."

Sócios gigantes

Rentabilidade é palavra de ordem no C6, que tem cerca de 16 milhões de clientes. Luiz Marcelo Calicchio, um dos sócios-fundadores, diz que o foco é reforçado pela presença do JPMorgan, o maior banco americano em ativos, e que no início do ano, entrou na sociedade com 40% do capital. "O JPMorgan traz uma segurança que o mercado de capitais não traz, uma segurança que a gente sempre quis buscar."

Calicchio afirma que a estratégia diverge de alguns pares, que buscaram recursos no Vale do Silício para depois irem à Bolsa. O C6 nasceu com maior capital inicial dos sócios, fez operações de dívida no mercado e depois, recebeu o aporte do JP. "Isso muda toda a dinâmica. A agenda diária não é focada no que tenho que fazer para me capitalizar, mas no que fazer para construir um banco que vai dar conforto para as pessoas migrarem dos incumbentes", destaca.

Publicidade

O Neon, que tem foco em clientes de classes mais baixas, também recebeu aporte de um grande banco: em fevereiro, o espanhol BBVA pagou US$ 300 milhões (R$ 1,6 bilhão) por 21,7% da fintech, que ganhou status de unicórnio (startup com avaliação de mercado superior a US$ 1 bilhão). Os espanhóis detêm 29,7% do Neon.

PUBLICIDADE

Jean Sigrist, presidente do conselho e um dos cofundadores, diz que o Neon sabia que após esse aporte não precisaria mais fazer captações e que teria recursos para seguir até atingir a lucratividade. "Não acreditamos muito no spend to grow, que é muito da indústria de startups do mundo", diz ele.

Segundo Sigrist, o Neon continua buscando crescimento, mas a rentabilidade ganhou peso. "Às vezes privilegiávamos o crescimento, outras vezes a rentabilidade, e agora obviamente a balança pende mais para a rentabilidade."

Carvalho, da Fitch, afirma que aumentar a rentabilidade é importante para todas as fintechs neste momento, mas que é crítico para as que não captaram recursos e queimam caixa para crescer. "Com menos capital, para aquelas que não estão tão capitalizadas, talvez a necessidade de aumentar o cross sell (venda cruzada de produtos) seja maior", observa.

Cautela

Publicidade

O caixa forrado, porém, não é um aval para gastar. "Há oportunidade de sermos mais eficientes e, nas margens, há excessos que até nós cometemos. Crescemos muito nos últimos dois anos. Contratamos 4.000 pessoas, temos projetos que provavelmente não fazem muito sentido", disse Vélez, do Nubank, que reiterou que a fintech não pretende demitir.

O CEO para Brasil do banco digital alemão N26, Eduardo Prota, afirma que a filial tem recursos garantidos pela matriz, mas revisou projetos. "Tínhamos uma estratégia de contratação mais acelerada, e seguramos um pouco", comenta. O N26 opera atualmente um piloto com 2 mil clientes, e a partir desta semana, outros 10 mil foram incluídos. O lançamento definitivo deve ocorrer neste ano.

No Neon, as contratações continuam e não houve demissões. Entretanto, há mais cautela com projetos de longo prazo e na concessão de crédito. "Estamos freando a carteira com cuidado e parcimônia. Nós, enquanto banco do trabalhador brasileiro, precisamos estar do lado do nosso cliente", diz Sigrist. "Não é uma decisão simplesmente de crédito, mas obviamente que também é uma decisão de crédito."

Este texto foi publicado no Broadcast no dia 15/06/22, às 09h10

O Broadcast+ é uma plataforma líder no mercado financeiro com notícias e cotações em tempo real, além de análises e outras funcionalidades para auxiliar na tomada de decisão.

Publicidade

Para saber mais sobre o Broadcast+ e solicitar uma demonstração, acesse.

 

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.