PUBLICIDADE

EXCLUSIVO PARA ASSINANTES
Foto do(a) coluna

Bastidores do mundo dos negócios

Mesmo na pandemia, empresas reportam altas expressivas na remuneração de executivos

Por Juliana Estigarríbia
Atualização:
 Foto:

Em um ano marcado por inúmeros desafios impostos pela pandemia, as empresas que compõem o Ibovespa, principal índice da bolsa brasileira (B3), reportaram aumentos expressivos da remuneração de seus executivos. Conforme levantamento da Comdinheiro, obtido com exclusividade pelo Broadcast, na média a remuneração dos membros das diretorias das 77 empresas pesquisadas cresceu 9,85% em 2020 sobre o ano anterior, para R$ 879,6 milhões. O aumento ocorre mesmo diante da queda de 29,3% da lucratividade média das companhias analisadas.

PUBLICIDADE

O levantamento feito pela consultoria especializada em soluções financeiras reúne as remunerações mais elevadas -- em geral do CEO -- de empresas de capital aberto que formam o Ibovespa em 2019 e 2020. A amostra não inclui Natura, Hering, Locaweb e SulAmérica "por falta de dados em um dos períodos ou possíveis inconsistências". As informações são fornecidas pelas próprias companhias, conforme instrução CVM 480.

Ao todo, os principais executivos das diretorias das 77 companhias receberam R$ 879,6 milhões em 2020, uma remuneração média de R$ 11,42 milhões ao ano ou R$ 952 mil por mês para cada grupo de executivos. O Santander é a empresa com maior remuneração anual declarada em 2020 para sua diretoria, de R$ 46,95 milhões. A WEG teve a menor remuneração em 12 meses, de R$ 573,6 mil. Ambas reportaram lucro líquido bilionário no exercício de 2020.

 Foto: Estadão

Segundo o diretor financeiro da Comdinheiro, Filipe Ferreira, em 2020 houve um movimento de contenção generalizada de despesas por parte das companhias, mas o aumento da remuneração verificado em determinadas empresas, principalmente em contextos de prejuízo, chama a atenção. "O ano de 2020 foi emblemático, vimos empresas registrando prejuízos e cortes salariais. Em contrapartida, houve aumentos substanciais na remuneração dos principais executivos, como aconteceu no setor de turismo, por exemplo."

Em 2020, a remuneração total da diretoria da CVC -- composta por quatro a cinco executivos -- somou R$ 31,5 milhões, sobre R$ 29,3 milhões no ano anterior, segundo levantamento da Comdinheiro. A remuneração mais alta declarada de um executivo da companhia em 2020 cresceu 347% na mesma base de comparação, em um ano em que a CVC reportou prejuízo líquido de R$ 1,23 bilhão.

Publicidade

No ano passado, a operadora de turismo aderiu à Medida Provisória 936 (que previa redução de jornada e corte de salários) de abril a junho para grande parte dos funcionários, incluindo o alto escalão. Houve algumas demissões, conforme apurou o Broadcast com fontes próximas à empresa, mas seriam parte normal da "rotatividade" do negócio. Até o início da pandemia, o grupo empregava 3.150 pessoas no Brasil e 1.200 na Argentina.

Segundo a empresa, no ano passado, foi pago participação nos lucros e resultados (PLR) a todos os funcionários, que receberam em abril. Em 2018 e 2019, não houve pagamento de PLR.

"A política de remuneração está 100% atrelada à recuperação da empresa e, levando em consideração nosso patamar de valuation, não é justo comparar os valores com 2019, mas sim com a média histórica", afirma o presidente da CVC, Leonel Andrade. O executivo assumiu o posto em 1º de abril de 2020, quando a companhia estava com patrimônio negativo e com balanços atrasados na Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Na ocasião, a ação da empresa na B3 estava cotada a R$ 9,40 e encerrou o ano a R$ 20,58.

'Paradoxo'

O sócio da BR Rating e especialista em governança corporativa, Ronald Bozza, observa que, embora não seja usual reportar aumento de remuneração durante crises, incentivos de curto e longo prazo são importantes para a sobrevivência do negócio. "Se uma determinada empresa vive uma situação complexa, é preciso garantir que haja profissionais de alta performance para tirar a empresa do buraco", avalia.

Publicidade

No entanto, ele observa que pagar bônus em um cenário de crise e prejuízos bilionários é um "paradoxo". Segundo a Comdinheiro, em 2020 a diretoria da CVC recebeu R$ 10 milhões em bônus. "É papel do Conselho de Administração filtrar quem deve ser premiado. Mesmo sobrevivendo à maior crise da sua história, me parece um paradoxo que empresas do setor de turismo concedam bônus para seus executivos em meio a prejuízos, demissões e cortes temporários de salário", diz Bozza.

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

No ranking das empresas que mais elevaram a remuneração de seus executivos, a companhia aérea Azul figurou na 11ª posição, com um aumento de 95% sobre o ano anterior, mesmo diante de um prejuízo líquido de R$ 10 bilhões em 2020. Em nota, a empresa informou que no ano passado a diretoria estatutária "espontaneamente reduziu seus salários por vários meses e abriu mão do bônus a que teriam direito pelo atingimento de metas de 2019 a fim de contribuir com a preservação do caixa da Azul". A aérea salienta que a grande maioria dos funcionários também aderiu, em massa, ao plano de licença não remunerada voluntária.

"O efeito observado está relacionado ao incentivo de longo prazo da diretoria estatutária, e representa uma estimativa contábil e que depende do tipo de instrumento de incentivo concedido, quantidade e preço, mas também depende da volatilidade da ação da Azul", diz a empresa na nota, destacando cenário de alta volatilidade dos papéis. "Este valor não configura necessariamente pagamento ou saída de caixa no ano corrente, e pode demorar até dez anos para ser recebido pelos membros da diretoria".

Bozza destaca que a remuneração variável passa uma mensagem para toda a equipe e, com o movimento ESG -- melhores práticas ambientais, sociais e de governança -- crescendo cada vez mais, é preciso atenção para os "recados" passados para os funcionários e para os acionistas. "Em momentos de crise, é um contrassenso premiar o topo e não reconhecer os esforços da operação."

Esta reportagem foi publicada no Broadcast+ no dia 12/08/21 às 17h07.

Publicidade

O Broadcast+ é a plataforma líder no mercado financeiro com notícias e cotações em tempo real, além de análises e outras funcionalidades para auxiliar na tomada de decisão.

Para saber mais sobre o Broadcast+ e solicitar uma demonstração, acesse 

Contato: colunabroadcast@estadao.com

 

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.