PUBLICIDADE

Foto do(a) blog

Práticas empresariais sustentáveis

Recomeço: investir em capacitação profissional de detentos pode diminuir reincidência criminal no país

Por Amcham Brasil
Atualização:

Os massacres ocorridos em prisões brasileiras nos primeiros dias do ano, como em Manaus, Rio Grande do Norte e Roraima, chocaram o país e trouxeram à tona problemas há tempos conhecidos: a superlotação e a precariedade do sistema carcerário.

PUBLICIDADE

Ainda que divida opiniões, discutir a situação é uma atitude urgente. A falta de investimento e o descontrole do cenário prisional aumentam a violência atrás das grades. Isso tudo se dá, principalmente, pelas condições degradantes em que homens e mulheres estão expostos. Segundo o último estudo divulgado pelo Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen) de dezembro de 2014, o Brasil tem a quarta maior população carcerária do mundo. Levando em consideração o total de cidadãos brasileiros, que corresponde a cerca de 207 milhões, desse montante, mais de 622 mil estão reclusos. A taxa é de 300 detentos para cada 100 mil habitantes. Em relação às vagas nos presídios, há um déficit de mais de 250 mil. Ou seja, existem mais pessoas presas do que a capacidade real do sistema.

Analisando o perfil dessa população, é possível identificar que a maioria são jovens (55%) e negros (62%), resultado de um problema histórico no país atrelado, sobretudo, a iniquidade social. Em relação aos gêneros, os homens ainda representam grande parte da população carcerária (94,2%). Já a presença das mulheres, ainda que menor (5,8%), tem crescido de forma mais acelerada nos últimos tempos. Os crimes de roubo e tráfico de drogas correspondem a 50% das condenações e são apontados como os principais responsáveis pela superlotação do sistema.

Outro dado relevante do Infopen é que 75% dos presos possuem baixa escolaridade, o que engloba analfabetos, alfabetizados informalmente ou que tenham cursado até o nono ano do ensino fundamental. A ausência de projetos de capacitação no ambiente prisional, tanto em relação à educação quanto ao trabalho, são os maiores desafios para a ressocialização de detentos e egressos (pessoas que deixaram as prisões recentemente). Além disso, quando em liberdade, as oportunidades de emprego se mostram reduzidas por conta dos antecedentes criminais, o que faz com que muitos voltem a cometer delitos.

 

Publicidade

Solução: reinserção e capacitação De acordo Evaldo Barreto, diretor Grupo de Capacitação, Aperfeiçoamento e Empregabilidade da Coordenadoria de Reintegração Social e Cidadania de São Paulo, o preconceito é um entrave para a reinserção de ex-presos no mercado de trabalho. A atuação da Coordenadoria, vinculada à Secretaria da Administração Penitenciária, é justamente auxiliar o egresso a se reintegrar à sociedade. Uma das ações do grupo é oferecer cursos de capacitação a presos no regime semiaberto: apenas no ano passado, foram 10 mil pessoas que fizeram as atividades oferecidas pela Coordenadoria.

Ele aponta que a capacitação é a melhor alternativa para atuar em uma profissão, seja formal ou informalmente porque "pessoas não querem funcionários que passaram pelo sistema prisional. Dificilmente vão querer inserir em suas empresas. Diante disso, procuramos capacitar na demanda do mercado. Se ela não conseguir se inserir no mercado formal, na sua comunidade ela pode se manter como cabeleireira, pintor, pedreiro, eletricista, encanador".

O governo federal anunciou, após a crise de segurança pública deste ano, que vai elaborar um plano para investir cerca de R$ 30 milhões em cursos de capacitação para detentos, segundo noticiado pela reportagem da Folha de S.Paulo do dia 18/01. Além disso, desde 1984, a Constituição Federal brasileira estabelece a chamada Lei de Execução Penal (7.210/84), que garante o trabalho como um "dever social e condição de dignidade humana" para o condenado que cumpre sua pena.

A relação de contratação pode ser vantajosa para empresas e pessoas em cárcere: a organização reduz custos, uma vez o empresário fica isento de encargos como férias e 13º, porque esse tipo de contrato não está sujeito ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Por outro lado, para os presos, o trabalho significa remição de penas tanto no regime fechado quanto no semiaberto - na proporção de um dia de pena para cada três dias de trabalho - e a garantia de uma renda para ele ou sua família. Mesmo assim, apenas 20% das pessoas dentro do sistema prisional brasileiro realizam algum tipo de trabalho. Sobre isso, Barreto  ressalta que o engajamento da iniciativa privada é fundamental, pois é nas empresas que essas pessoas vão buscar um recomeço, garantindo o não retorno a criminalidade.

 

Publicidade

Leão BebidasNo Espírito Santo, a Leão Alimentos e Bebidas, do Grupo Coca-Cola, embarcou em dois projetos relacionados a inclusão da população carcerária no mercado de trabalho: o Semeando a Liberdade, destinado aos presos em regime fechado, e o Reeducando, voltado a aqueles que cumprem a pena em regime semiaberto. As iniciativas foram desenvolvidas em parceria com a Secretaria de Estado da Justiça (Sejus). O estado ocupa 8º lugar no país em números absolutos de pessoas encarceradas - eram mais de 18 mil em 2015. Sua taxa de encarceramento de é de 468 para cada 100 mil habitantes, acima da média nacional, segundo o relatório "Informações Penitenciárias Do Espírito Santo".

PUBLICIDADE

No projeto apoiado pela empresa, os presos da Penitenciária de São Mateus são capacitados para depois trabalhar no cultivo de frutas em uma Fazenda Experimental próxima a unidade prisional. Além da remuneração, é disponibilizado acompanhamento psicológico aos detentos e à família para que, após o cumprimento da pena, haja uma boa integração ao convívio social. A empresa concorreu ao Prêmio Eco em 2014 com a ação.

Os projetos, iniciados em 2013, tem uma previsão de continuidade mínima de dez anos. De acordo com dados divulgados pela empresa, um ano após o lançamento do Reeducando, 38 funcionários trabalhavam em fábricas da Leão. Seis pessoas que já tinham cumprido a pena também foram contratadas pela companhia e por empresas prestadoras de serviço em 2015. Atualmente, a organização busca estender o programa às demais unidades de negócio.

 

Costurando a reinserção Em São Paulo, o Projeto Ponto Firme, do artesão e estilista Gustavo Silvestre, também incentiva a capacitação como fonte de novas oportunidades de vida. Toda quarta-feira o artista oferece oficinas de crochê para detentos de uma penitenciária de Guarulhos. O objetivo é que a confecção de roupas e artigos de decoração se torne uma alternativa de sustento no momento de retorno à vida social.

Silvestre diz que ficou impressionado com o interesse e o potencial dos alunos. Desde que o projeto começou, no final de 2015, cerca de 100 pessoas já se tornaram artesãos, produzindo diferentes tipos de peça. O interessante da iniciativa é que, ao contrário de outros trabalhos manuais que dependem de estruturas, como marcenaria oupintura, o crochê só precisa de linha e agulha, o que facilita muito a confecção. Outro aspecto positivo, segundo o artista, é que os pontos desenvolvem a criatividade, a disciplina e a concentração.

Publicidade

No final do ano passado, quando o Ponto Firme completou um ano, as peças produzidas durante as aulas ganharam uma exposição em um café na Vila Madalena. "Tivemos a presença de muitos artistas. Todos ficaram muito impressionados com a qualidade do trabalho", conta o idealizador do projeto. Para esse ano, a expectativa é de ampliação. Mais detentos demonstraram interesse e as turmas aumentaram. "A gente duplicou a carga horária de três horas semanais para seis horas." Além disso, outra mostra já está sendo planejada e convites de expansão das oficinas para outros presídios foram feitos.

 

Para mais informações sobre a reinserção de detentos no mercado de trabalho:

Espírito Santo: Subgerência de Trabalho do Preso, da Gerência de Educação e Trabalho da Sejus Telefones: (27) 3636-5737 e (27) 3636-5852 E-mail: nucleodetrabalho@sejus.es.gov.br

São Paulo: Portal Emprega São Paulowww.empregasaopaulo.sp.gov.br

Grupo de Capacitação Aperfeiçoamento e Empregabilidade da Coordenadoria de Reintegração Social e Cidadaniawww.reintegracaosocial.sp.gov.br

Publicidade

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.