Lembro-me daqueles últimos dias de 1968, como se fosse hoje. Felizmente, terminava aquele ano com uma boa notícia: a Apollo 8 contornando a Lua em pleno Natal. Eu tinha pouco mais de um ano de trabalho no Estadão e iniciava a cobertura sistemática do Projeto Apollo. A conquista do espaço era um tema empolgante. Mas o ano de 1968 havia sido, até então, dos mais duros para todos nós, brasileiros que lutávamos contra a ditadura.
O dia 13 de dezembro seria um dos mais tristes para nossa geração. Os militares baixavam o ato institucional nº 5, censuravam a imprensa, fechavam o Congresso e cassavam mais de uma centena de mandatos. Era a ditadura explícita, em toda a sua dureza.
Desde o começo do ano, passeatas de protesto se repetiam no Rio e em São Paulo. A polícia prende 720 jovens que participavam do Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE) em Ibiúna (SP). A Universidade de São Paulo (USP) estava totalmente tomada pelos estudantes, em greve, durante mais de três meses, a partir de maio.
No mundo, coisas tão dramáticas quanto o assassinato de Martin Luther King em abril, em Memphis. Dois meses depois, o eliminado é Bobby Kennedy. A guerra do Vietnã alcançava seu auge. As manifestações contra o conflito se multiplicavam em todo o mundo, inclusive nos Estados Unidos. Os estudantes franceses tomam Paris e hasteiam a bandeira negra dos anarquistas no alto da Torre Eiffel. De maio a agosto, a capital francesa se transforma no retrato do caos.
Nossa alegria naquele final de ano era olhar para a Lua. A Apollo 8 era a primeira missão tripulada para a Lua. Entrou em órbita lunar no dia 24 de dezembro de 1968, na noite de Natal. Três astronautas - o comandante Frank Borman, e os pilotos Jim Lovell e William Anders - descreviam tudo pelo rádio, tiravam fotos e as enviavam para Terra. Eram as primeiras fotos da Terra vista da Lua.
Em 2008, nas comemorações dos 40 anos da Apollo 8, Borman relembrava: "Fomos advertidos de que em pleno Natal nós teríamos a maior audiência que a voz humana já poderia ter tido. E as únicas instruções que recebemos da NASA foi fazer algo apropriado."
Uma das expressões cunhadas pela equipe da Apollo 8 foi o "nascer da Terra" - ou Earthrise - quando viam nosso planeta nascendo no horizonte da Lua, durante as 10 voltas que deram em nosso satélite natural. (Foto da NASA, de Frank Borman).
Um dos momentos emocionantes da missão foi o início da volta do módulo lunar, com seu próprio foguete. Quando o motor é acionado, os três comemoram. E Lovell diz ao seu interlocutor em Houston: "Roger, saiba por favor que Papai Noel existe." A viagem de volta foi tranquila e a nave pousou no Pacífico no dia 27 de dezembro.
Numa das transmissões de rádio, a tripulação lia versos bíblicos e terminavam com as seguintes palavras: "Boa noite, boa sorte, um Feliz Natal e que Deus os abençoe a todos e a cada um de vocês em nossa boa Terra".