A forte volatilidade nos preços dos ativos brasileiros, em particular o câmbio, dá a sensação de que a economia brasileira está à deriva, com o mercado vulnerável às reviravoltas da crise política.
Qual a âncora que ainda poderia estar segurando a economia brasileira para uma situação de derretimento?
A celebrada analista americana Joyce Chang, diretora de pesquisa global do banco J.P. Morgan, enviou a seus clientes um relatório intitulado "Brasil: em busca de uma âncora de política econômica após o rebaixamento do rating", no qual diz que os principais catalisadores de instabilidade no País são as contas fiscais e a turbulência política.
Não somente os economistas e estrategistas do J.P. Morgan, como também outros analistas estrangeiros e brasileiros, prefeririam que o País tivesse uma sólida âncora fiscal como a melhor maneira para reverter boa parte do movimento forte de venda ("sell-off") dos ativos brasileiros nos últimos meses e permitir alguma estabilidade do mercado local para abrir caminho da recuperação econômica.
Há quem defenda, inclusive, a opção por uma âncora monetária neste momento, ou seja, que o Banco Central eleve ainda mais a taxa Selic, atualmente em 14,25%, para conter a deterioração das projeções de inflação para 2016 e também para limitar uma desvalorização mais aguda do real frente ao dólar.
A dúvida, contudo, é se elevações adicionais dos juros básicos seriam suficientes para conter a piora nas expectativas inflacionárias e segurar o câmbio. Ou seja, se a âncora monetária seria, neste momento de tamanha instabilidade política e incerteza econômica, a mais eficiente para o País.
Então, o que está segurando neste momento uma piora acelerada das projeções do IPCA para 2016 e contribuindo com uma melhora no déficit de conta corrente?
A recessão da economia brasileira.
No ano passado, o Brasil registrou um déficit em transações correntes de US$ 103,59 bilhões, ou 4,42% do Produto Interno Bruto (PIB).
Se, de um lado, um real mais depreciado vem contribuindo para reduzir o déficit acima, de outro pressiona as projeções de inflação, o que lhe retira o mérito de âncora.
Na mais recente pesquisa Focus, do BC, os analistas estimam um déficit de conta corrente de US$ 68 bilhões em 2015.
Por outro lado, a disparada recente do dólar frente ao real levou muitos analistas a elevarem suas projeções para o IPCA em 2016, quando o BC quer que a inflação ceda para a sua meta de 4,5%. Na última pesquisa Focus, os analistas estimam um IPCA de 5,94% em 2016. Há quatro semanas, essa projeção era de 5,58%.
O câmbio mais depreciado é simplesmente um sintoma da crise política e fiscal que o Brasil vem vivendo desde o início do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff e não uma escolha planejada como âncora da política econômica, se todas as outras variáveis estivessem estabilizadas e o País sem uma turbulência.
Assim, restou a recessão como a âncora que vem impedindo uma deterioração mais pronunciada das projeções de inflação em 2016, além de também permitir a redução esperada para o déficit de conta corrente neste ano.
É, portanto, um atestado de fracasso na condução da economia brasileira ter a recessão como um dos principais fatores que vem impedindo que as variáveis econômicas entrem num círculo vicioso mais acelerado.
A questão é o efeito colateral de se ter essa âncora neste momento, entre eles a queda acentuada da arrecadação tributária, o que somente agrava a situação das contas fiscais e da dívida pública, já que o governo é incapaz de realizar os cortes de gastos necessários.
"O Brasil não tem um problema nas contas externas e, desde o início dessa crise, o problema nunca foi o das contas externas", responde um renomado economista carioca quando indagado sobre se o câmbio não seria hoje a âncora da economia brasileira. "O que temos é um problema fiscal, de dívida pública, combinado com uma total disfuncionalidade política."
Diante da fraqueza política do governo Dilma, a probabilidade é muito baixa de o Brasil conseguir fazer o ajuste fiscal necessário para estabilizar a trajetória da dívida pública e, assim, acalmar investidores e empresários.
O que o Brasil precisa, de fato, é de uma âncora fiscal, mas essa é a menos provável no curto e médio prazo.