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Economia e políticas públicas

Opinião|2022 e o mercado

Eleições do ano que vem ainda não entraram para valer no radar do mercado, mas sinais da política fiscal deste governo e do discurso econômico dos favoritos não augura bem para os ativos brasileiros em 2022.

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Atualização:

As eleições de 2022 ainda não entraram com tudo no radar de eventos que de fato mexem com o preço dos ativos brasileiros, mas gradativamente se farão presentes. Como movimento inicial, as preocupações se voltam para os danos potenciais no arcabouço e política fiscais de um governo que vai adentrar o ano de reeleição com a popularidade minguando. E tendo como arma restante a caneta presidencial.

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Neste momento, a "solução" de reduzir o pagamento de precatórios a R$ 40 bilhões em 2022 do relatório da PEC do deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), que libera R$ 50 bilhões para o Auxílio Brasil e outros gastos eleitorais, é uma iniciativa que parcela e acumula para o futuro dívidas da União.

É um improviso com as digitais de gambiarra eleitoral, e não há boa vontade no mundo para considerar que, de alguma forma, essa mudança possa ser considerada um avanço no arcabouço fiscal relativamente ao problema dos precatórios.

A equipe econômica liderada por Paulo Guedes aparentemente endossa essa solução, mas esse assentimento parece não ser suficiente para aplacar o desconforto do Centrão com técnicos que podem fazer cara feia para os planos eleitoreiros em relação ao orçamento.

Como observou o analista político Ricardo Ribeiro, da Consultoria MCM, em relatório divulgado hoje, "o Centrão colocou Paulo Guedes para fritar na Câmara dos Deputados".

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Na intepretação de Ribeiro, os 310 votos de deputados pela convocação de Guedes - desconsiderando a hipótese mais amena do convite - para prestar esclarecimentos sobre sua conta offshore é um claro sinal de que o ministro é alvo dos parlamentares, com beneplácito de Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, e do Centrão.

Estes, por sua vez, segundo o analista da MCM, não parecem ter a intenção de derrubar Guedes, mas sim de fazer com que o ministro "seja mais cordato, por assim, dizer, com as variadas demandas do grupo, por cargos, pela liberação de recursos para emendas parlamentares e por mais gastos de caráter eleitoral em 2022".

Para Ribeiro, "se o ministro eventualmente cair, a turma do Centrão não lamentará".

Esses riscos, entretanto, talvez sejam apenas a ponta do iceberg da potencial turbulência que aguarda os mercados no ano que vem.

Para além do horizonte curto do que acontecerá com as contas públicas em 2022, à medida que avançar o ano eleitoral as atenções se voltarão para o que o próximo presidente fará na economia.

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Quando se analisam as pesquisas eleitorais hoje, vê-se que os destaques vão para três nomes. Dois deles, Lula, o campeão disparado das intenções de voto no momento, e Ciro fazem questão de manifestar, sempre que podem, sua hostilidade à política econômica mais ortodoxa e liberal que em tese prevalece desde o governo de Michel Temer, iniciado em 2016.

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O terceiro nome é o do próprio Bolsonaro, cuja adesão ao liberalismo aparenta ser cada vez mais tênue à medida que se deterioram o prestígio e o poder de Guedes.

Tanto Lula quanto Ciro têm nos seus respectivos currículos períodos em relação aos quais podem reivindicar a certificação de responsabilidade fiscal. O ex-presidente no seu primeiro mandato, e o político cearense como governador do Ceará.

O problema é que nem um nem outro parecem particularmente interessados nisso na atual fase de suas vidas políticas, e atiçar a turbulência econômica num ano eleitoral para derrotar o incumbente é uma estratégia que já entregou resultados no Brasil.

Dessa forma, num ano eleitoral em que a fragilidade macroeconômica do Brasil, combinada a um cenário internacional incerto, já pode por si só piorar o risco, não se deve esperar que os protagonistas eleitorais atuem como bombeiros.

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Antes que 2022 entre para valer no radar do mercado, é prudente apertar o cinto de segurança.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast (fernando.dantas@estadao.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 8/10/2021, sexta-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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