Fernando Dantas
13 de abril de 2021 | 19h27
A maior parte das análises sobre o atual imbróglio orçamentário e fiscal é extremamente pessimista, analisando-o como a antessala da derrocada da emenda constitucional 95, do teto de gastos.
Uma exceção é Alexandre Manoel, sócio e economista-chefe da gestora MZK Investimentos.
Em artigo publicado no LinkedIn e em conversa com a coluna, Manoel explica como o atual conflito em torno do Orçamento faz, a seu ver, parte de uma mudança institucional trazida pelo teto (e consolidada pela emenda da emergência fiscal) que ele considera revolucionária e benéfica para o País: a alocação de recursos pelo setor público “sob a tutela de uma restrição orçamentária”.
Dessa forma, o Orçamento aprovado recentemente pelo Legislativo, considerado inexequível por muitos, para ele “testa o limite do Executivo”, impondo o funcionamento da máquina administrativa com o mínimo de custeio.
“Em termos econômicos, isso significa que o Legislativo está incentivando o Executivo a operar sob a curva de eficiência”, escreveu o economista.
Manoel cita, no artigo, algumas possibilidades de resolução do conflito. mas uma delas, que ele considerou remota, chama a atenção. E, na verdade, ele a considera a única verdadeiramente negativa para o País.
Essa alternativa seria a de “não se chegar a um consenso e o Executivo ter de propor, por emenda constitucional, o furo do teto”.
Qualquer semelhança com a emenda fura-teto que vem sendo ventilada não é mera coincidência.
“Eu veria isso de uma maneira muito ruim, seria o governo voltar atrás em menos de 60 dias depois de todo o esforço do Executivo e do Parlamento para reforçarem o teto [com a emenda da emergência fiscal]”, ele diz.
Manoel faz questão de esclarecer que gastos extrateto relacionados à pandemia, como equipamento, vacinas, UTIs etc. não significam furar o teto. Mas permitir que emendas parlamentares fiquem fora do limite da EC95, aí sim, seria um ato de furar o teto.
“Eu acho, que, se de fato houver essa intenção, a equipe econômica vai acabar pensando melhor e voltando atrás, ao perceber a grande perda de credibilidade que isso significaria”, acrescenta o analista.
Manoel considera que se formou um falso dilema entre romper o teto ou vetar integralmente o Orçamento para recompor as despesas obrigatórias.
Ele vê saídas intermediárias, notando que as consultorias legislativas da Câmara e do Senado e o TCU também vão nessa direção.
Segundo o economista, grande parte do conflito encontra-se no interior do Executivo. Os gastos dos ministérios militares, da Infraestrutura (Tarcísio Gomes de Freitas) e do Desenvolvimento Regional (Rogério Marinho) não cabem no Orçamento junto com as emendas parlamentares que a equipe econômica negociou com o Congresso.
Se a equipe econômica e aqueles ministros conseguissem se acertar, uma veto parcial poderia se direcionar a emendas referentes a investimentos do Executivo para ampliar o custeio e evitar o shutdown.
E ficaria acertado com o Congresso que as emendas diretamente vinculadas a objetivos regionais dos parlamentares seriam posteriormente cortadas – na gradação necessária – quando e se fosse verificado que as despesas obrigatórias iriam estourar os limites orçados.
No seu artigo, Manoel menciona ainda a possibilidade de os dois Poderes se acertarem para aprovar medidas que desafoguem a gestão fiscal sob o teto, como desvinculação de receitas e flexibilização da carga horária do servidor público.
Seriam, a seu ver, formas de gerenciar o conflito necessário trazido pelo teto sem jogar fora o bebê junto com a água do banho – que seria o caso de se aprovar a PEC fura-teto.
Fernando Dantas é colunista do Broadcast (fernando.dantas@estadao.com)
Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 13/4/2021, terça-feira.