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Economia e políticas públicas

Opinião|A "velha" normalidade de volta?

Sinais de inflação nos EUA agitam os mercados e sinalizam que o anúncio da morte das leis da economia pode ter sido precoce. Para o Brasil, é mais uma preocupação.

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Atualização:

Recentemente, vários sinais nos mercados internacionais enfraqueceram a narrativa da "estagnação secular".

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Há diversas variantes dessa história pelo lado da demanda e da oferta, mas um bom resumo talvez fosse o de que o cenário de lento crescimento e inflação e juros excepcionalmente baixos no mundo desenvolvido pós-crise global é mais estrutural - uma espécie de "nova normalidade" - do que cíclico.

Uma narrativa adicional retira o baixo crescimento, já que as economias avançadas estão em expansão sincronizada, mas aponta que, por razões variadas (algumas ligadas à tecnologia), as leis da economia já não se aplicam tão bem à nova realidade global e a inflação não vai subir como no passado diante do aquecimento dos mercados de trabalho.

Seja lá como se monte a história, diante da teia de ideias e teorias que circulam, a implicação é a mesma, e bastante favorável a economias emergentes como o Brasil. Os juros internacionais subirão pouco, a liquidez global abundante permanecerá - e, junto com ela, a complacência com os fundamentos frágeis de países que oferecem retornos maiores do que os das economias centrais.

Acontece que, desde setembro do ano passado, a rentabilidade dos títulos de dez anos do Tesouro norte-americano saltou quase um ponto porcentual, de ligeiramente mais que 2% para quase 3% nas negociações de hoje (23/4, segunda-feira, quando a coluna foi escrita; hoje, quarta, a taxa estava em 3,01% quando esta coluna foi postada no blog). Nesta segunda-feira (23/4), o mercado futuro dos Fed Funds precificou uma chance de quase 50% de que haja quatro elevações da taxa básica de juros dos Estados Unidos em 2018. Boa parte do mercado apostava em apenas três há até pouco tempo.

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No Boletim Macro Ibre de abril, recém-divulgado, o economista Samuel Pessôa escreve que "na margem, se confiamos nos parâmetros de sazonalidade, o núcleo da inflação (dos EUA) tem rodado no primeiro trimestre de 2018 a 3% anualizado, acelerando de 2,1% no segundo semestre (de 2017)". O pesquisador associado do Ibre/FGV acrescenta no texto que "ou seja, começam a aparecer alguns sinais de inflação".

A política fiscal expansionistas de Donald Trump, principalmente pela redução de impostos, joga mais lenha na possível fogueira inflacionária, é claro.

Na Europa, por sua vez, hoje (23/4) foi divulgado o PMI da IHS Markit, um índice de confiança empresarial, que se mostrou estável depois de quedas no início do ano - num sinal que foi interpretado como de continuação da retomada europeia, embora possivelmente com alguma perda de ritmo.

De qualquer forma, Pessôa considera que a continuidade da recuperação da Europa pode vir a produzir os mesmos efeitos que nos Estados Unidos - com o progressivo aquecimento do mercado de trabalho, em algum momento a inflação ressurgirá, levando o Banco Central Europeu (BCE) a um ciclo de aperto monetário.

No Brasil, finalmente, o dólar está cotado hoje a R$ 3,44 (23/4; na quarta era cotado a R$ 3,49 quando esta coluna foi postada no blog), o que não foi antevisto pelo mercado. Há a explicação da queda do diferencial de juros, tanto pela redução doméstica quanto pela normalização em curso nos Estados Unidos, assim como o fato de que a campanha eleitoral "entrou nos preços" finalmente, e há preocupação com a debilidade do principal candidato centrista, Geraldo Alckmin, do PSDB.

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Por enquanto, os movimentos no mercado doméstico estão ordeiros. Em termos de juros, por exemplo, não há sinais de estresse, embora nos prazos muito longos o juro real já bem elevado tenha ficado ainda mais salgado recentemente.

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A história econômica, porém, indica que processos de elevação dos juros para combater a inflação nem sempre são tão pacíficos, já que surpresas podem ocorrer, levando os BCs a movimentos mais drásticos, que geram turbulências e azedam o apetite por risco. O Brasil segue em berço esplêndido contando com a bonomia internacional, como de hábito, mas há a possibilidade (não a certeza) de que a situação externa possa estar se complicando - e o câmbio seja o primeiro sinal de alarme. (fernando.dantas@estadao.com)

Fernando Dantas é colunista do Broadcast

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 23/4/18, segunda-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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