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Economia e políticas públicas

Opinião|Abrir o comércio, proteger o trabalhador

Trabalho da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República traz plano detalhado de nova abertura comercial combinada com reformulação dos programas de retreinamento dos trabalhadores, justamente para aliviar os custos de transição no mercado de trabalho.

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Foto do author Fernando Dantas
Atualização:

A Secretaria-Geral da Presidência da República, do ministro Moreira Franco, tem pronto um trabalho que consiste numa agenda relativamente detalhada para uma nova etapa de abertura comercial da economia brasileira, combinada com uma reformulação dos programas de requalificação profissional - justamente para dar conta dos custos de transição no mercado de trabalho da abertura comercial.

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O documento está sendo lançado hoje, no Insper, em São Paulo, em um grande seminário sobre a quarta Revolução Industrial, ao qual estava previsto o comparecimento de Moreira Franco e Hussein Kalout, secretário especial de Assuntos Estratégicos da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República.

O trabalho parte da constatação que o Brasil é um dos países mais fechados do mundo, com comércio internacional de apenas 25% do PIB, o que reduz a eficiência da economia nacional e o bem-estar da população.

Após um período de abertura comercial em que as tarifas de importação tiveram expressiva queda, entre 1990 e 1995 (o que deu um impulso à produtividade), elas se mantiveram estáveis, mas o Brasil ainda tem barreiras tarifárias e não-tarifárias para bens manufaturados bastante altas em comparação à média mundial.

Uma parte relevante do estudo é uma simulação dos efeitos de uma abertura total da economia brasileira (para testar os impactos máximos de políticas nesta direção), por meio de um modelo de equilíbrio geral que agrega informações sobre produção, emprego, salários, preços, importações e exportações de 57 setores diferentes da economia brasileira e do resto do mundo.

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O resultado indica uma redução média do nível de preços de 5%, que chega a algo entre 6% e 16% em setores mais protegidos, como automóveis, maquinários, couro, têxteis e vestuários. O nível total de emprego se mantém praticamente inalterado (na verdade, há uma elevação muito ligeira), e há expansão de postos de trabalho em 75% dos setores. Ao fim de 20 anos, só três setores teriam queda no emprego superior a 0,5%. Em dois terços das 558 microrregiões brasileiras há efeito positivo sobre o emprego no longo prazo, e em 85% o impacto se concentra no intervalo entre -0,25% e +0,25%.

Outra parte do documento é uma pauta específica de liberalização comercial, com diversos e detalhados itens, como eliminar até 2021 tarifas de importação sobre bens de capital e de informática e telecomunicações, além de extinguir os ex-tarifários; propor a redução da TEC do Mercosul; eliminação total de tarifas entre o Mercosul e a Aliança do Pacífico; etc. O objetivo da liberalização, naturalmente, é o de ajudar a relançar o processo de aumento da eficiência, isto é, de crescimento da produtividade da economia brasileira. Sem o qual o País não sairá do nível medíocre de crescimento médio das últimas décadas.

Os autores do estudo, entretanto, deixam claro que, embora os efeitos líquidos sobre o emprego sejam de neutros a positivos, há um custo de transição, já que 3 milhões de trabalhadores devem mudar de setor por causa da liberalização comercial. O documento deixa claro também que recentemente os estudos acadêmicos indicaram que essa transição pode ser mais lenta do que se julgava, particularmente num país de regras trabalhistas rígidas como as brasileiras (o que pode melhorar um pouco com a reforma trabalhista), caso o processo seja deixado apenas ao mercado.

Assim, a novidade na abordagem do estudo é uma proposta muito detalhada de relançar também, em grande estilo, a política de requalificação profissional do governo federal, a partir da estrutura já existente do Pronatec. A ideia, claro, é acelerar e facilitar a transição no mercado de trabalho em função da abertura comercial.

Como reportado recentemente nesta coluna, um estudo elaborado por economistas americanos e brasileiros mostrou que o Pronatec-MDIC, braço do programa cujas capacitações ensinadas derivam de requisições de empresas, tem não só um resultado bastante significativo de aumento de empregabilidade, como bem superior ao restante do Pronatec, cujos efeitos são perto do imperceptível. Este é um dos muitos fatores levados em conta na proposta de reformulação da política federal de requalificação profissional que acompanha a proposta de uma nova rodada de abertura comercial.

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O trabalho foi elaborado por Hussein Kalout, Marcos Degaut, Carlos Pio, Carlos Góes, Eduardo Leoni e Luis Gustavo Montes, da Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. (fernando.dantas@estadao.com)

Fernando Dantas é colunista do Broadcast

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 7/3/18, quarta-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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