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Economia e políticas públicas

Opinião|Alckmin ajuda Lula "com o mercado"?

Ricardo Ribeiro, sócio da Ponteio Política, empresa de consultoria política, considera que ex-tucano na chapa sinaliza moderação de Lula, mas é apenas um primeiro passo.

Foto do author Fernando Dantas
Atualização:

O roteiro de diversas eleições brasileiras desde a redemocratização é bem conhecido e se repete de forma cada vez mais melancólica e enfadonha (ainda que possa ser assustador).

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Várias vezes, quando um candidato de esquerda ficava mais forte nas pesquisas, o mercado entrava em pânico, e os ativos brasileiros apanhavam feio, com consequências negativas também para a economia em geral, o emprego e a vida do cidadão comum.

Durante a longa fase do PT no poder, esse padrão retrocedeu. Afinal, a esquerda estava no comando e, por um longo período (2004-2010), em termos da economia que chega na vida das pessoas e empresas, as coisas estavam indo bastante bem. Parecia até que o medo que o mercado nutria pela esquerda era coisa do passado.

No entanto, o descarrilamento da economia brasileira no governo Dilma, culminando no impeachment, festejado pelo mercado, fez o Brasil retroceder à velha ordem. Na eleição de 2018, o mercado voltou a reagir mal aos avanços de Fernando Haddad nas pesquisas.

Agora, para a eleição de 2022, o franco favorito pela fotografia atual é Lula. O mercado brasileiro anda mal, com o câmbio num nível que até os desenvolvimentistas começam a achar exagerado.

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Mas não dá para atribuir por enquanto qualquer culpa a Lula. Primeiro porque a eleição ainda está muito longe, tem água para correr debaixo da ponte, e a experiência pregressa indica que os episódios de pânico do mercado com candidatos de esquerda costumam ocorrer mais próximos do pleito.

Em segundo lugar porque, ao contrário das experiências passadas de pânico eleitoral, o próprio governo incumbente está liderando a investida populista contra o arcabouço macroeconômico vigente.

O mercado tem razões de sobra para se assustar com o que ocorre agora, como a desmoralização do teto de gastos e todas as gambiarras institucionais de que Bolsonaro está se valendo para gastar o máximo possível em 2022 e distribuir "presentes" para as mais variadas clientelas - desde as historicamente ligadas ao presidente, como militares e policiais, até aquelas que ele resolveu agradar apenas agora, como estudantes endividados do Fies.

Mas fica a dúvida: será que, mais adiante, o favoritismo de Lula, se mantido, tornará 2022 ainda mais turbulento em termos dos ativos brasileiros?

É aqui que entra a articulação para fazer do ex-tucano Geraldo Alckmin vice-presidente de Lula. Como alguns já dizem, Alckmin seria a "Carta ao Povo Brasileiro" em forma humana. Mas será que é mesmo?

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Para Ricardo Ribeiro, sócio da Ponteio Política, empresa de consultoria política voltada ao mercado financeiro e meio empresarial, a entrada de Alckmin na chapa, se concretizada, de fato ajuda a amenizar o medo que o mercado sente de Lula.

"Será uma decisão importante do Lula em termos de sinalização de um governo mais moderado", ele diz.

Segundo Ribeiro, Alckmin tem uma imagem conservadora e moderada consolidada e não é crível que ele faça um acordo com Lula que não garanta um respeito mínimo às suas posições (do ex-tucano).

O analista nota também que no mercado financeiro já há um grupo, provavelmente ainda minoritário, que projeta que um eventual governo Lula será pragmático. Para esses, o embarque de Alckmin é uma notícia nova que reforça uma posição precedente.

Evidentemente, apenas Alckmin na chapa não é suficiente para apaziguar o mercado em 2022 se um Lula favorito não controlar o discurso.

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Um tema atual bastante sensível, segundo Ribeiro, é o controle de preços da Petrobrás (uma questão em que Lula já andou dizendo que vai interferir).

Já ataques ao teto de gasto deixaram de ser considerados tão sacrílegos pelo mercado depois que o próprio governo de Bolsonaro esculhambou o dispositivo. Na visão do sócio da Ponteio, já há uma aceitação de que o teto seja repactuado a partir de 2023, e a grande questão aí será a de se o próximo presidente vai aceitar um mecanismo sério de limite de despesas.

Um ponto sensível em que Lula nunca tocou, mas Ciro Gomes, sim, é o de reverter privatizações, acrescenta Ribeiro.

É claro que a eventual consolidação de um clima tranquilo no mercado ante a possibilidade de vitória de Lula em 2022 depende da definição do futuro ministro da Economia, mas o analista acha que esse passo ainda deve demorar - inclusive porque o ex-presidente ainda não tem esse nome articulado.

Há uma visão pessimista de alguns de que, como nos velhos tempos, talvez seja do interesse de Lula que haja turbulência econômica em 2022, para enfraquecer ainda mais Bolsonaro caso o atual presidente vá para o segunda turno contra o petista.

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Mas Ribeiro nota que pode haver também um movimento até contrário que seria do interesse eleitoral de Lula. Se a vitória em primeiro turno se mostrar possível, talvez o ex-presidente queira reforçar a moderação e a abertura ao centro para amealhar os votos a mais que evitariam o segundo turno.

O analista considera que uma eleição em dois turnos é o cenário mais provável, mas não descarta totalmente a possibilidade de vitória de Lula no primeiro turno.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast (fernando.dantas@estadao.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 16/12/2021, quinta-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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