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Economia e políticas públicas

Opinião|"BNDES da China" quer entrar no Brasil

O Banco de Desenvolvimento da China (CDB, na sigla em inglês usada internacionalmente), o equivalente chinês do BNDES, quer firmar parceria no Brasil para apoiar e financiar a implantação no País de empresas chinesas. A informação é de Orlando Merluzzi, vice-presidente executivo da Foton Aumark do Brasil, o grupo brasileiro que planeja construir em Guaíba, no Rio Grande do Sul, uma fábrica de caminhões da marca chinesa pertencente à Beiqi Foton Motor Co Ltd.

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Foto do author Fernando Dantas
Atualização:

Merluzzi chegou há pouco mais de uma semana (duas quando esta matéria foi postada no blog)de uma viagem à China, na companhia de Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-presidente do BNDES, e presidente da Foton Aumark do Brasil. Eles foram tratar de detalhes do projeto da fábrica de Guaíba.

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"O CDB está interessado em vir para o Brasil, com uma associação com um banco local, para viabilizar a vinda de novas empresas chinesas para o Brasil; como nós fizemos uma parceria com o Banrisul, isto pode ser uma porta de entrada para o CDB no Brasil", diz Merluzzi.

A Foton Aumark do Brasil é um projeto de R$ 250 milhões, com vistas a implantar uma fábrica com capacidade instalada de 21 mil unidades por ano de caminhões de 3,5 a 24 toneladas, com início de produção em 2016. A empresa é 100% de Mendonça de Barros, Merluzzi e outros sócios brasileiros, e a Beiqi Foton vai transferir tecnologia, apoiar o desenvolvimento de produtos e autorizar o uso da marca.

O projeto tem financiamento do BNDES e do Banrisul, e o suporte estadual do Rio Grande do Sul, e municipal de Guaíba, que fica na Grande Porto Alegre.

Há um acordo que dá preferência à empresa chinesa de adquirir a Foton Aumark do Brasil depois de 12 anos. Merluzzi, porém, diz que o mais provável é que o projeto se expanda e o grupo brasileiro e a multinacional chinesa continuem a desenvolver a parceria depois de 12 anos.

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O executivo acrescenta que há planos de trazer, no futuro, fornecedores de autopeças chineses para o terreno de Guaíba. Este seria, aliás, exatamente um exemplo de situação em que o apoio do CDB poderia se fazer presente.

O grupo brasileiro vem negociando com a Beiqi Foton desde 2010, e um acordo foi assinado em dezembro do ano passado. Segundo Merluzzi, o grupo brasileiro já vendeu cerca de 100 caminhões importados da China, de um total de aproximadamente 300 trazidos para o Brasil desde o início de 2013. "Estamos construindo uma rede de concessionárias, mas de uma forma ainda meio tímida", ele explica.

O grande passo na associação entre o grupo brasileiro e o fabricante chinês veio na conjunção da decisão da Beiqi Foton de se internacionalizar e da imposição de forte proteção no Brasil aos fabricantes nacionais de veículos, com o IPI adicional de 30% para produtos importados (ou montados no Brasil, mas com menos de 65% de conteúdo nacional).

A empresa chinesa, de acordo com Merluzzi, é a maior produtora de caminhões do mundo, com mais de 600 mil unidades por ano, 95% vendidas dentro da China. O grupo quer se expandir fora do país de origem, e já está montando fábricas na Rússia e na Índia.

O plano inicial da Beiqi Foton, diz Merluzzi, era fabricar caminhões no Brasil a partir de 2018. Mas o grupo brasileiro alertou que esta data não seria adequada ao timing do programa Inovar-Auto, cujo prazo final de aplicação foi fixado em 31 de dezembro de 2017. O Inovar-Auto autoriza uma cota-crédito de IPI para importação às montadoras que se comprometerem a produzir no Brasil, cumprindo exigências como nacionalização de etapas fabris e pesquisa.

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Merluzzi estima que a Foton Aumark do Brasil terá uma cota para importar 5 mil caminhões nos dois primeiros anos. Ele prevê iniciar a produção em Guaíba em 2016 com cerca de 2.000 unidades, e, a partir daí, a produção irá aumentando e substituindo a importação. Para chegar à capacidade de 21 mil unidades por ano, ele projeta de oito a nove anos.

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Luiz Carlos Mendonça de Barros observa que a Foton é controlada pelo Partido Comunista de Pequim. "É uma típica estatal chinesa, que agora tem esta missão de ir para fora do país".

O ex-presidente do BNDES explica que ele e seus sócios mostraram aos chineses como funciona o mercado de caminhões no Brasil, com, por exemplo, 80% dos veículos financiados pela linha Finame do BNDES.

Mendonça de Barros nota ainda que os caminhões da Foton são montados com partes de grandes marcas internacionais. No caso dos motores, por exemplo, há tanto os da Cummins quanto da Mercedes. As caixas de câmbio e outros componentes relevantes também são fabricados por marcas mundiais. Isto, por sua vez, facilita não só a fabricação no Brasil, mas também a manutenção.

Visão da China

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Mendonça de Barros diz que seu envolvimento com a Foton da China lhe deu uma noção da economia real do país asiático que falta aos analistas do mercado financeiro.

"Não dá para usar os instrumentos analíticos tradicionais para compreender o país, e eu aconselho a não apostar contra a China", ele conclui.

Essa matéria foi publicada originalmente em 3/9/13 na AE-News/Broadcast

Opinião por Fernando Dantas
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