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Economia e políticas públicas

Opinião|E se o emprego ficar aquecido até as eleições?

O mercado de trabalho, talvez a variável mais crucial para a campanha eleitoral da presidente Dilma Rousseff, continua emitindo sinais confusos e desorientando os analistas.

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Atualização:

Desde o ano passado, formou-se um certo consenso em torno de um complexo diagnóstico para o comportamento aparentemente contraditório do emprego. Por esta visão, a desaceleração econômica desde 2011 só não se transformou em desemprego por causa de questões demográficas, como a queda forte no crescimento das pessoas em idade de trabalhar (PIA), e também por outros problemas mais intricados que estão contendo a população economicamente ativa (PEA), isto é, empregados e desempregados (estes últimos, por definição, têm de buscar emprego).

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Ainda assim, a aposta de parte expressiva dos analistas é que o mercado de trabalho desaqueceria num ritmo muito gradual, possivelmente afetando o desemprego em algum momento à frente, mas com chances de produzir efeitos sobre a renda que já não seriam tão favoráveis à popularidade presidencial.

Porém, os últimos dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) e da renda na Pesquisa Mensal de Emprego (PME) apontam a possibilidade de que mesmo este desaquecimento gradual possa ter sido interrompido. Ainda que seja retomado em algum momento, qualquer fôlego adicional do mercado de trabalho pode ser decisivo para as eleições em outubro.

Os dados do Caged de fevereiro, com a criação de 261 mil vagas formais, foram mais que o dobro da expectativa mediana do mercado. Como relatório do Itaú Unibanco expõe de forma sucinta, "o número do Caged é inconsistente com a taxa de crescimento (corrente e esperada) da economia".

Uma possível explicação é o fato de o Carnaval ter caído em março. Normalmente, com os feriados em fevereiro, o mês, que já é curto, fica com ainda menos dias úteis, o que pode adiar decisões de contratação para março. Este ano, porém, pode ter havido antecipação para fevereiro.

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Mas há também sinais de vitalidade na renda. Como observa Fernando Rocha, sócio e economista-chefe da gestora JGP, no Rio, apesar de a renda média real acumulada em 12 meses ter desacelerado de 4,1% para 1,9% entre dezembro de 2012 e 2013, o indicador tem mostrado um comportamento mais forte desde outubro.

Quando se toma a comparação interanual (mês contra mesmo mês do ano anterior), a renda média real aumentou abaixo do acumulado em 12 meses de dezembro de 2012 até outubro de 2013. A partir de novembro, porém, a comparação interanual não só está acelerando, como está bem mais elevada do que o acumulado em 12 meses. Assim, houve crescimento da renda em novembro, dezembro e janeiro, ante os mesmos meses dos anos anteriores, de respectivamente 3%, 3,2% e 3,6%.

Uma consequência natural deste ritmo mais forte na ponta é que o acumulado em 12 meses parou de cair, permanecendo em 1,8%/1,9% no último trimestre até janeiro. Isso não é de forma alguma um sinal de que o movimento de desaceleração da renda estacionou de forma mais duradoura ou reverteu-se, mas pelo menos abre estas possibilidades. Apesar de não se comparar com ritmo quase eufórico de alta real de 4% de 2012, uma elevação média dos rendimentos de 2% ao ano acima da inflação não é de se desprezar.

Quando se olha a população ocupada (PO), porém, a interpretação de um mercado de trabalho em desaquecimento volta a ganhar força. Na comparação interanual, a PO caiu nos últimos quatro meses até janeiro. Como, neste período recente, a cada mês a PEA caiu ainda mais que a PO, o desemprego continuou em território de recordes de baixa.

A recente queda da PEA, por sua vez, é outro evento de causas nebulosas. Há interpretações diversas, como a de que jovens pararam de trabalhar para se dedicar aos estudos ou que a alta da renda poderia levar pessoas do domicílio que não são a fonte principal de ganhos a sair do mercado de trabalho. Não existe, porém, nada parecido com um consenso sobre o tema.

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Para Rocha, da JGP, "o que está ocorrendo no mercado de trabalho é um debate em aberto, mas de fato há dados recentes mais fortes do que supúnhamos lá atrás".

O economista Fernando de Holanda Barbosa Filho, especialista do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre/FGV), no Rio, mantém a sua projeção de desaquecimento gradual do mercado de trabalho e de que ainda haverá um aumento suave do desemprego.

Os dois analistas, por outro lado, enfatizam que os próximos dados do mercado de trabalho serão extremamente importantes para sinalizar se os recentes sinais de reaquecimento (ou pelo menos de interrupção do resfriamento) são um ponto fora da curva ou apontam uma nova tendência.

Fernando Dantas é jornalista da Broadcast (fernando.dantas@estadao.com)

Esta coluna foi publicada pela AE-News/Broadcast na terça-feira, 19/3/14.

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Opinião por Fernando Dantas
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