Os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) de dezembro, e do ano de 2018 fechado, reforçam a percepção de que o mercado de trabalho, assim como a economia, continua a trilhar a lenta e penosa recuperação de uma das maiores recessões da história brasileira.
O fechamento líquido de 334.462 vagas formais em dezembro está de acordo com a sazonalidade do mês, e veio abaixo da mediana das expectativas do Projeções Broadcast, de perda líquida de 430 mil. O principal é que o ano teve um saldo positivo de 529.554 vagas com carteira assinada, depois de o Brasil amargar perdas de 1,534 milhão, 1,326 milhão e 11.964 vagas formais em, respectivamente, 2015, 2016 e 2017, como mostra a reportagem ontem sobre o resultado do Caged de Eduardo Rodrigues, da Agência Estado.
O economista José Márcio Camargo, especialista em trabalho, vê o mercado em recuperação e projeta um período à frente de criação consistente de postos com carteira assinada, a reboque da retomada da economia em 2019, especialmente a partir do segundo trimestre deste ano.
Camargo, atualmente na Genial Investimentos, do grupo Brasil Plural, frisa que seu cenário é dependente da aprovação da reforma da Previdência.
"A economia está retomando, ainda que lentamente, e o desemprego (da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, PnadC) tem caído 0,6 ponto porcentual quando se compara com os mesmos trimestres do ano anterior", ele diz.
O economista também considera que a reforma trabalhista já pode estar tendo algum efeito em termos de estímulo à criação de empregos formais.
Mas Camargo chama a atenção para uma "coisa curiosa" - a que outros analistas se referem como "puzzle" (quebra-cabeça) -, que é o fato de a PnadC mostrar em 2018 uma criação de emprego formal bem mais tépida do que o Caged.
De novembro de 2018 ao mesmo mês de 2019 (último dado divulgado da PnadC, que sempre se refere aos trimestres terminados em cada mês), registrou-se criação líquida de empregos formais de apenas 35 mil postos. Quando sair o número de 2018 fechado, este deve contrastar fortemente com a criação líquida de quase 530 mil vagas registrada pelo Caged.
Bruno Ottoni, economista da IDados, explica que a medida dos empregos formais da PnadC de novembro a novembro contém alguma imprecisão, porque não é feita a partir dos microdados, ainda não disponíveis. Por exemplo, todos os empregos do setor público são considerados formais, o que não é uma regra absoluta, e a soma exclui os empregados domésticos, parte dos quais tem carteira assinada.
De qualquer forma, a aproximação é razoável e o "puzzle" permanece - nem Camargo nem Ottoni têm uma explicação definitiva e completa para o fenômeno. Por um lado, é fato que as duas medidas são completamente distintas em termos de metodologia. O Caged é um registro administrativo feito pelas empresas e a PnadC é uma pesquisa amostral de domicílios. Ottoni acrescenta que o Caged não inclui a totalidade dos empregos formais. Ainda assim, são duas medidas bem-feitas de um universo igual ou muito parecido, e a grande divergência entre elas é difícil de entender.
Os dados da PnadC, em particular, apontam uma retomada do mercado de trabalho em 2018 muito dependente do emprego informal e da modalidade por conta própria, o que para alguns põe em xeque o fôlego da recuperação da economia brasileira.
Camargo tem uma visão mais otimista, e considera que, depois da monumental recessão de 2015 e 2016, é natural que empresas endividadas e escaldadas recomecem as contratações com um viés de informalidade. Ele acrescenta que muitos "conta própria" seriam mais adequadamente classificados como "pequenos empresários", em vez de detentores de emprego informal - e vê inclusive a recente liberalização das regras de terceirização como uma das possíveis causas da ampliação desta categoria de trabalho.
Ottoni, que também é pesquisador associado do Ibre/FGV, está, como Camargo, relativamente otimista quanto à criação de empregos formais em 2019, em linha com a retomada da economia.
"A composição do mercado de trabalho deve melhorar em 2019, com um avanço proporcional dos empregos formais", ele diz.
Fernando Dantas é colunista do Broadcast
Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 23/1/19, terça-feira.