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Economia e políticas públicas

Opinião|Europa e EUA reagem, mas Brasil é dúvida

Melhora externa é positiva para economia brasileira, e indicadores estão vindo um pouco "menos piores" que o previsto. Mas Brasil tem fragilidades específicas que podem atrapalhar o engate na retomada global.

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Atualização:

Os dados do varejo em abril vieram dentro do intervalo das Projeções Broadcast - piores que as medianas, no conceito restrito, mas melhores que as medianas, no conceito ampliado (que inclui material de construção e veículos).

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De maneira geral, os indicadores de atividade no Brasil vão pintando um quadro em que abril deve ser o pior momento da pancada econômica da pandemia, como observa Flávio Serrano, economista-chefe do Haitong Bank.

Ele acrescenta que indicadores antecedentes de fluxo pedagiado nas rodovias, expedição de papel ondulado e consumo de energia apontam melhora em maio, em relação a abril.

Serrano também nota que, em relação a junho, apesar de se estar no escuro ainda quando a indicadores de atividade, antecedentes ou não, a prévia dos índices de confiança divulgada hoje pela FGV veio positiva. A confiança empresarial aparece 14,5 pontos acima do indicador em maio, e a do consumidor, na mesma base de comparação, 8,9 pontos acima.

Adicionalmente, a flexibilização do distanciamento social em São Paulo pesa. O Estado representa quase 1/3 do PIB brasileiro, e a capital, onde o processo de relaxamento está mais adiantado, é responsável por aproximadamente a metade do PIB do Estado.

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Solange Srour, economista-chefe da gestora ARX, vê os números do varejo  no Brasil divulgados hoje, referentes a abril, como "não tão ruins como a gente esperava".

Por outro lado, ela nota que os números do varejo nos Estados Unidos divulgados hoje também, e referentes a maio (alta de 18%), foram uma surpresa positiva "enorme". Que se soma à recente surpresa positiva no mercado de trabalho norte-americano.

Solange acrescenta que há maior animação com a recuperação nos Estados Unidos e na Europa, como sinalizado pelas filas na reabertura do varejo no Reino Unido, por exemplo.

O Morgan Stanley já prevê que a produção global vai voltar ao nível anterior à crise do coronavírus no quarto trimestre deste ano, redobrando a confiança de que a recuperação econômica do mundo seja em "V".

Esse maior otimismo global é positivo para o Brasil, compondo o quadro em que a aversão internacional a risco se atenuou, o câmbio recuou, e o risco e os juros futuros se acalmaram.

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Daí a achar que também no Brasil haverá uma retomada em V, entretanto, vai uma boa distância, como ressalva Solange.

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Segundo a economista, com exceção do auxílio emergencial voltado para os trabalhadores informais, as outras medidas de apoio a famílias e empresas e de suporte ao emprego no Brasil estão tendo dificuldade de chegar aos públicos-alvo.

Isso, na sua visão, é especialmente verdade no caso do crédito para pequenas e médias empresas, que são grande empregadoras. Assim, comparado com Estados Unidos e Europa, o Brasil pode mancar de uma perna na tentativa de se recuperar em V, justamente a perna do mercado de trabalho e da renda.

Outros fatores contribuem para dificultar a recuperação no Brasil, como a dificuldade de crescer antes da pandemia, a dramática piora da situação fiscal em função dos gastos relacionados à Covid-19 e seus impactos econômicos e a incessante instabilidade política associada ao governo de Jair Bolsonaro.

Serrano e Solange projetam queda de 0,75 ponto porcentual da Selic (para 2,25%) amanhã ao final da reunião do Copom, e ambos também veem o BC possivelmente deixando a porta entreaberta, mas com cautela, para eventuais novos cortes.

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Por um lado, a acalmada do cenário internacional (com o recuo do câmbio) facilita o corte, assim como a baixa inflação no Brasil. Em tese alguma melhora na expectativa de retomada no Brasil poderia, por outro lado, reduzir o impulso monetário adicional que se necessita fazer.

Mas tanto no mundo quanto no Brasil há o temor de eventuais novas ondas da pandemia, que forcem novas rodadas de isolamento social, além dos problemas econômicos específicos do Brasil mencionados por Solange. O Copom continuará a tatear num quarto escuro.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast (fernando.dantas@estadao.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 16/6/2020, segunda-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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