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Economia e políticas públicas

Opinião|Hartung e a grande oportunidade para o Brasil

Ex-governador do Espírito Santo, que se aproximou de Luciano Huck (cotado para a disputa presidencial de 2022), diz que há uma grande janela aberta para reformas econômicas no Brasil, sem precedentes desde a redemocratização.

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Foto do author Fernando Dantas
Atualização:

Paulo Hartung, ex-governador do Espírito Santo, diz que, como testemunha participante da vida política nacional desde a redemocratização, nunca viu "a janela tão aberta para reformas econômicas e reformulação do Estado quanto em 2019".

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Para ele, há uma "autorização social para reformas" sem precedentes, o que ficou claro na tramitação da reforma da Previdência. Mas esse fenômeno já vem de algum tempo, e se manifestou também na aprovação da reforma trabalhista e do teto de gastos, entre outras medidas.

Em todos esses casos, Hartung - que já foi deputado estadual, deputado federal, senador, prefeito de Vitória e governador do Espírito Santo -, ficou surpreso com a pouca resistência organizada às mudanças e com o apoio ou no mínimo a aceitação tácita da sociedade.

Mas ele teme que a janela de oportunidade seja aproveitada de forma somente muito parcial.

O problema, para Hartung, são as falhas de articulação política do governo Bolsonaro, que resolveu governar sem formar uma maioria parlamentar, e a pequena disposição do presidente de encabeçar com firmeza a agenda de reformas.

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O ex-governador atribui essa inédita "autorização social para as reformas" à reação da sociedade à enorme recessão de 2014-2016, seguida de lentíssima recuperação.

A sua hipótese é de que as famílias brasileiras tiveram o gosto de avanços econômicos concretos no seu dia a dia, como a grande ampliação do acesso ao consumo, com a estabilização da moeda nos anos 90 e posterior boom de commodities na década passada.

Com a crise, esses ganhos foram perdidos de forma muito rápida, e agora a sociedade quer voltar a desfrutar daquela melhora, e está disposta a pagar o preço para isso - como, por exemplo, o de aceitar reformas que podem trazer perdas individuais, como a da Previdência, mas que ajudam a reorganizar a economia.

A grande questão é por que os brasileiros desta vez não estariam agindo como na tradição populista típica do Brasil e de outros países latino-americanos. Ou seja, elegendo políticos que prometam atalhos imediatos e insustentáveis para a melhora da sensação econômica, como aumentos de salário mínimo e de benesses públicas em geral.

Para explicar essa mudança, Hartung diz que a sociedade de fato não mira especificamente em detalhes tecnocráticos de agenda econômica. Na verdade, o foco foi muito mais na questão da corrupção, mas de forma geral a população associou um período de desmando do Executivo como sendo a causa principal da crise que roubou os ganhos econômicos obtidos anteriormente.

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Dessa forma, "a autorização social" para as reformas seria um voto de confiança para uma reorganização geral da casa. Essa agenda, para o eleitor mediano, deve ter o combate à corrupção como um dos focos principais, mas também pode se estender a medidas econômicas que o governo e os formadores de opinião consigam convencer a sociedade de que são indispensáveis.

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Hartung, que considera positivo o saldo da gestão de Paulo Guedes no Ministério da Economia, critica, entretanto, o envio recente das três PECs - cujo conteúdo ele apoia - ao Senado.

Ele considera que, além de não estabelecer uma prioridade entre as três PECs, o envio ao Senado - que foge do ritual mais tradicional de encaminhar reformas primeiro à Câmara - atiça uma disputa de protagonismo entre as duas Casas Legislativas, o que não ajuda aprovar as medidas.

Na sua visão, para melhor aproveitar a janela de oportunidade, o governo deveria ter enviado a PEC emergencial, que ele reputa a mais importante a curto prazo, já durante a tramitação da reforma da Previdência no Senado.

Mesmo com essas ressalvas, Hartung prevê que "alguma coisa vai andar" das PECs enviadas, mas o governo terá uma negociação mais difícil com o Senado e a Câmara. Ao contrário de diversos analistas, o ex-governador não acha que o fato de 2020 ser um ano de eleições municipais vai necessariamente paralisar a pauta legislativa e de reformas.

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Hartung aproximou-se desde o ano passado, via Arminio Fraga, de Luciano Huck, que é tido como um potencial candidato à presidência em 2022.

O ex-governador, porém, diz que não vê Huck como um pré-candidato, mas sim como alguém que está "militando pelo Brasil", dedicando-se a movimentos de formação de novas lideranças políticas e de formulação de políticas públicas.

Segundo Hartung, 2022 está muito distante e articular candidaturas presidenciais agora é "jogar energia boa numa coisa inútil". Mas ele se diz engajado em reorganizar o que chama de seu "campo político", que resiste a chamar de centro:

"Se chamar de centro não ganha eleição", ele observa, em tom de brincadeira.

Esse campo, que Hartung diz ter sido reduzido à irrelevância em 2018, mas para o qual ele vê chances concretas de reconstrução agora, seria a combinação de uma agenda econômica racional, de bom funcionamento da economia de mercado, com um programa intenso de combate à desigualdade e de promoção da mobilidade social, dentro de uma visão socialdemocrata.

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Fernando Dantas é colunista do Broadcast

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 16/12/19, segunda-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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