Os mercados precificavam no final da manhã da sexta-feira (13/11/15) uma probabilidade de 66% de que o Federal Reserve (Fed, BC norte-americano) aumente a taxa básica, ou taxa dos fed funds, do atual intervalo entre 0 e 0,25% para 0,25% a 0,5% na sua reunião de 15 e 16 de dezembro. Se confirmado, será o início da normalização da política monetária dos Estados Unidos, precisamente sete anos depois de a taxa básica ter sido levada ao atual nível, de praticamente zero.
Mas as apreensões que muitos participantes do mercado nutriram desde 2013 em relação à chegada desse momento não parecem até agora se justificar. Desde meados de outubro, os juros referenciais de dez anos dos títulos do Tesouro americano subiram de cerca de 2% para 2,3%, enquanto o câmbio aqui oscilou em torno de US$ 3,8, e os juros futuros mantiveram-se comportados.
Uma das causas da reação tranquila dos ativos brasileiros (e de outros emergentes) aos sinais do eminente início de um ciclo de alta da taxa básica nos Estados Unidos é a elaborada e cuidadosa comunicação do Fed sobre este fato. Essa postura contrasta com o ocorrido em meados de 2013, quando a primeira menção do então chairman do Fed, Ben Bernanke, à possibilidade de iniciar a redução do programa de compra de títulos do mercado (afrouxamento quantitativo) causou turbulência global, e o Brasil foi duramente afetado.
Como rememora José Júlio Senna, diretor do Centro de Estudos Monetários do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre/FGV), o fator surpresa teve um papel importante naquele episódio, que ficou conhecido como "taper tantrum" (expressão difícil de traduzir, mas que indica que o mercado teve um 'ataque' diante da perspectiva de redução do afrouxamento quantitativo).
Em 1º de maio de 2013, no comunicado do Fed sobre sua reunião de 30/4 e 1/5 daquele ano, a autoridade monetária americana escreveu que "estava preparada para aumentar ou diminuir o ritmo" do programa de compra de títulos. Já em testemunho ao Congresso em 22/5, Bernanke sinalizou que se cogitava diminuir o ritmo.
"Foi de fato uma mudança de comunicação, e o mercado foi pego de surpresa, o que é muito diferente do que está acontecendo agora", diz Senna. O susto pode ser observado no comportamento do treasury de dez anos, cuja rentabilidade saltou de cerca de 2% no final de maio de 2013 para acima de 2,7% no início de julho do mesmo ano.
Tomás Brisola, economista-chefe da gestora BBM Investimentos, observa que a própria reação atual bem mais moderada (até agora) do título do Tesouro de dez anos, comparada ao "taper tantrum" de 2013, é um indício de como a mudança na política monetária americana está sendo bem absorvida pelos mercados, o que reduz os impactos em emergentes como o Brasil.
As projeções do mercado, como mostra recente relatório do Itaú-Unibanco, são de que a taxa dos fed funds ainda estará abaixo de 1,4% no final de 2017. Os membros do FOMC, por sua vez, projetam em média que, naquela data, a taxa básica já estará em 2,5% ou ligeiramente acima. Mas, evidentemente, as condições de liquidez são mais ditadas pelas crenças do próprio mercado.
E deve ser somada à visão benigna sobre o ciclo de alta do Fed a perspectiva de relaxamento monetário adicional na zona do euro, Japão e China, e também ao fato de que a economia chinesa parece estar conseguindo o seu "pouso suave" - um dos maiores riscos para emergentes exportadores de commodities, como o Brasil, seria um freada brusca na China.
A reação relativamente tranquila dos mercados à iminência de elevação do juro básico nos Estados Unidos não pode, evidentemente, ser creditada apenas à comunicação do Fed. Há por trás um fenômeno real, mais importante do que qualquer comunicação, e para o qual Brisola e Senna chamam a atenção - a baixa inflação nos Estados Unidos e no mundo.
Como nota o diretor do Centro de Estudos Monetários, recente artigo da economista Carmen Reinhart chama a atenção para o fato de que a mediana de inflação em 2015 de 189 países está um pouco abaixo de 2% e ligeiramente menor do que em 2014. A se manter este cenário, não há muita justificativa para alta de juros e redução de liquidez no mercado internacional, o que representa uma ajuda externa ao Brasil, num momento de aguda crise econômica e fiscal. (fernando.dantas@estadao.com)
Fernando Dantas é jornalista da Broadcast
Esta coluna foi publicada pela AE-News/Broadcast em 13/11/15, sexta-feira.