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Economia e políticas públicas

Opinião|Momento difícil para os bancos centrais

No Brasil e no mundo, inflação parece correr na frente das ações dos BCs para contê-la. Mas enquanto BC do Brasil já subiu muito o juro, os do mundo desenvolvido ainda estão na largada ou nem isso.

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Atualização:

A ata do Copom da reunião de 15-16 de março, divulgada hoje (22/3, terça-feira) reiterou que o plano A do Banco Central (BC) é a de encerrar o ciclo de elevação da Selic com mais uma alta de 1 ponto porcentual (pp) na reunião de maio, para 12,75%. A ressalva é que o Copom está pronto a estender o ciclo caso os choques se provem mais persistentes ou maiores que o antecipado.

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Aparentemente, muitos analistas já antecipam choques maiores que os projetados pelo BC, tanto que há um número considerável de previsões de pico da Selic neste ciclo superior a 12,75%, com alguns ajustes para cima sendo feitos neste momento.

O fato é que a sucessão de choques inflacionários oriundos da pandemia e, agora, da guerra da Ucrânia, está deixando as autoridades monetárias no mundo inteiro em posição muito difícil. A inflação parece estar correndo sempre à frente das mais pessimistas projeções de apenas pouco meses antes. E os BCs parecem permanentemente aquém do que seria necessário para contê-la.

O BC do Brasil promoveu um dos mais intensos e rápidos apertos monetários do mundo desde o ano passado, levando a Selic de 2% a 11,75% em um ano. Ainda assim, o diagnóstico revelado pelas trajetórias da inflação corrente, dos núcleos e das expectativas inflacionárias permanece preocupante - talvez até crescentemente preocupante.

O economista e consultor Alexandre Schwartsman, ex-diretor do BC, em relatório sobre a ata comenta que o documento "reforça minha percepção sobre a falta de vontade do BCB de fazer 'tudo o que for necessário' para levar a inflação para meta em 2023".

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Ele nota que isso se dá num horizonte de sete trimestres (até o final de 2023), que é quando a política monetária costuma atingir seu máximo impacto.

Schwartsman observa que, no cenário de referência do BC, apesar de forte apreciação do câmbio e elevação da trajetória projetada da Selic (comparado com o anterior), o IPCA de 2022 dá um grande salto de 1,7 ponto porcentual (pp), para 7,1%; e o de 2023 avança 0,2pp, para 3,4%.

A soma de câmbio mais valorizado e da Selic mais alta reduz, segundo os cálculos do economista, 0,75-0,9pp da inflação de 2023. O que significa que outros fatores, incluindo expectativas inflacionárias, mais do que compensaram aqueles ventos favoráveis.

Segundo o economista, a alta da Selic no cenário de referência - até um máximo de 12,75% por alguns meses - é insuficiente para levar a inflação de volta para a trajetória das metas. Mas é aí que o BC entra com o cenário "alternativo" e "mais provável", em que a trajetória do preço de petróleo é mais baixa do que no de referência. E com isso a inflação vai para a meta em 2023 com Selic máxima de 12,75% neste ciclo.

O analista considera que o BC "terceirizou parte dos esforços desinflacionários para uma suposta trajetória dos preços de petróleo, que pode ou não se materializar".

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Óbvio que o Copom fez as ressalvas habituais sobre a possibilidade de os choques surpreenderem para cima e o levarem a esticar o ciclo de alta. Ainda assim, o fato de o plano A ser aquele de parar em 12,75% passa a sensação da relutância em fazer "tudo o que for necessário" mencionada pelo consultor.

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Nos países ricos, os BCs estão em estado muito mais prematuro em termos do ciclo de aperto monetário, que por enquanto se restringe às intenções no Banco Central Europeu (BCE) e a um único movimento que elevou a taxa básica (Fed Funds) 0,25pp acima do nível de praticamente zero nos Estados Unidos.

O Goldman Sachs já prevê aceleração da alta dos Fed Funds por reunião para 0,5pp nos encontros do FOMC, comitê de política monetária norte-americano, de maio e junho, e uma taxa terminal de 3-3,25% a ser atingida em 2023.

Na verdade, há forte incerteza se mesmo isso - que para o padrão da política monetária americana nas últimas décadas é bastante forte - será suficiente para conter a atual disparada dos preços, que levou a inflação em 12 meses a quase 8%.

Economistas de grande reputação global, como Lawrence Summers, ex-secretário do Tesouro dos EUA, e Olivier Blanchard, ex-economista-chefe do FMI, têm se mostrado quase alarmados pela alta da inflação americana. Se os piores temores se materializarem, os BCs do mundo rico na quadra atual poderão ser vistos a posteriori como muito lenientes com a inflação e tendo se deixado ficar extremamente "atrás da curva".

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Não é um bom momento para ser dirigente de banco central.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast (fernando.dantas@estadao.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 22/3/2022, terça-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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