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Economia e políticas públicas

Opinião|Na produtividade, nem tudo é óbvio

Agenda da produtividade inclui recomendações surradas (porém nunca postas em prática), mas também contém elementos menos conhecidos e ainda não suficientemente esclarecidos. Goste-se ou não, tornou-se a agenda central do desenvolvimento brasileiro.

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Atualização:

Há praticamente um consenso entre os economistas de que o Brasil só irá retomar um ritmo de crescimento satisfatório, passada a atual crise cíclica, se houver uma recuperação do crescimento da produtividade - tanto do trabalho quanto da chamada produtividade total de fatores (PTF).

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O problema, porém, quando se analisa essa agenda da produtividade, é que ela parece uma lista de obviedades que vêm sendo recomendadas há décadas, mas que o País nunca consegue realizar, ou pelo menos não no ritmo necessário: melhorar a qualidade da educação; ampliar e aprimorar a infraestrutura; simplificar o sistema tributário; melhorar o ambiente de negócios, etc.

Ainda assim, não há como fugir dessas discussões. Com o fim do boom de commodities e da fase de crescimento movida a consumo e crédito, simplesmente não há mais rota alternativa. O economista Regis Bonelli é um dos diversos especialistas no tema dentro do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre/FGV) que estão tentando criar uma agenda de trabalho sistemático sobre a questão da produtividade. Bonelli alerta que não há como escapar do óbvio, como a lista mencionada acima, mas vem tentando desencavar outras peças menos evidentes do quebra-cabeça da produtividade.

Um aspecto menos notado do mau desempenho da PTF nos últimos anos é que este derivou não apenas do fraco crescimento da produtividade do trabalho, mas também de uma performance muito ruim da produtividade do capital, cuja contribuição para o crescimento da PTF saiu de 0,8 ponto porcentual positivo (pp) em 2007 para -0,8 pp em 2014.

Tanto no caso do trabalho como do capital, buscar as verdadeiras explicações é um exercício difícil. Há muitas hipóteses plausíveis, mas comprovar causalidade não é nada trivial.

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Frisando que fala de hipóteses, e não de certezas, Bonelli acha que os problemas recentes com a produtividade do trabalho (o histórico de décadas também não é nada animador, mas houve uma piora nos últimos anos) podem estar ligados ao avanço do setor de serviços (em relação à indústria), que saiu 67,8% do valor agregado em 2010 para 71% em 2014.

A explicação simples é que os serviços têm em média uma produtividade inferior à da indústria. Assim, por uma simples mudança de composição da economia, a produtividade piora. Na verdade, os serviços são muito heterogêneos, com alguns segmentos modernos com desempenho recente muito positivo da produtividade, como serviços financeiros; e outros com trajetória medíocre, como o comércio. A intuição diria que a desindustrialização que o Brasil vem sofrendo deve ter empurrado os trabalhadores e a economia em geral mais na direção dos serviços atrasados do que dos avançados, mas este é um ponto que precisa ser mais detalhadamente pesquisado.

Do lado da queda recente da produtividade do capital, entra obviamente na discussão até que ponto escolhas erradas de política econômica podem ter causado distorções na alocação de recursos e perda de eficiência. Bonelli não menciona diretamente a questão da "nova matriz", mas o Brasil tem um histórico problemático de investimento em infraestrutura, que pode ter sido ainda mais perturbado pela guinada intervencionista da política econômica entre o segundo mandato de Lula e o primeiro da presidente Dilma Rousseff.

Assim, atrasos e paralisações em hidrelétricas, estaleiros, refinarias e complexos petroquímicos, na esteira da mal sucedida tentativa de fazer o Estado puxar uma onda de investimentos em infraestrutura e indústrias de base - como no governo Geisel - podem ser uma das causas da queda recente da produtividade do capital. (fernando.dantas@estadao.com)

Esta coluna foi publicada pela AE-News/Broadcast em 16/11/15, segunda-feira.

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Opinião por Fernando Dantas
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