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Economia e políticas públicas

Opinião|O Pronatec e a eficiência

Como um estudo sobre o programa de treinamento do governo brasileiro é um sinal de que o setor público brasileiro pode fazer mais com menos.

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Foto do author Fernando Dantas
Atualização:

É uma ideia meio intuitiva que um programa de treinamento de mão de obra será mais bem sucedido se for voltado a criar habilidades demandadas pelo mercado em vez de ensinar capacitações escolhidas por burocratas do governo. Como muitos temas de economia, entretanto, é necessário investigar se o que parece intuitivo em teoria ocorre de fato na prática.

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O Pronatec do Brasil acabou sendo o objeto de um recente estudo acadêmico (http://www.stephenoconnell.org/academic/files/OConnell_JMP2018_WorkerTraining.pdf) que tem exatamente essa finalidade, elaborado pelos economistas Stephen O'Connel, do MIT; Lucas Ferreira Mation, do Ipea; e João Bevilaqua Basto e Mark Dutz, do Banco Mundial.

O pulo do gato do trabalho foi prestar atenção ao Pronatec-MDIC, um braço do programa de treinamento criado em 2013 e administrado pelo Ministério da Indústria e Comércio. O Pronated-MDIC, ao contrário do restante do Pronatec, tinha uma natureza "direcionada pela demanda" ("demand driven"), como escrevem os autores. Assim, as capacitações que o curso buscava criar nos seus participantes derivavam de requisições específicas de empresas consultadas.

Dessa forma, os economistas foram capazes de comparar a empregabilidade de quem cursou o Pronatec normal com a de quem cursou o Pronatec-MDIC. Utilizando uma metodologia sofisticada, os autores mostram que o Pronatec-MDIC, que é direcionado pela demanda, aumentou de forma significativa a empregabilidade dos seus formandos logo depois de concluído o curso, num efeito que persistiu por pelo menos um ano. Eles também mostraram que a empregabilidade de quem cursou o Pronatec-MDIC cresceu substancialmente maisdo que a dos que cursaram o Pronatec normal, em que as capacitações ensinadas não derivaram de demandas das empresas.

Esse estudo é mais um exemplo de um tema que por vezes passa despercebido com a dramática necessidade de o Brasil cortar gastos públicos a qualquer custo. Para além da questão de gerar resultados primários que coloquem a dívida pública numa trajetória sustentável, e que assim garanta o equilíbrio macroeconômico do País, a questão da qualidade do gasto público é fundamental.

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Na verdade, aumentar a eficiência do gasto público ajuda a matar dois coelhos com uma só cajadada. Por um lado, contribui para o fundamental esforço fiscal e, por outro, impacta diretamente a produtividade e o bem-estar da população (o fim último de toda a política econômica que se preza).

Em recém-lançado relatório sobre o Brasil (http://www.oecd.org/eco/surveys/Brazil-2018-OECD-economic-survey-overview-Portuguese.pdf), a OCDE apresenta uma tabela com estimativas do Banco Mundial de que o setor público poderia fazer uma economia de 7,9% do PIB com uma série de medidas de aumento da eficiência do gasto público. É verdade que, nessa enorme economia, está incluída uma reforma da Previdência, o que normalmente não é visto como uma questão de eficiência de gasto público (mas talvez devesse sê-lo), e a eliminação gradual do Abono Salarial e do Salário Família.

Mas é relevante notar que o Banco Mundial vê ganhos de eficiência levando a economias de 0,3% do PIB na saúde; de 1,5% no ensino público fundamental, médio e superior; 0,9% com o alinhamento entre a remuneração dos servidores públicos e trabalhadores de nível equivalente no setor privado; 1,2% reformando o regime fiscal de pequenas e médias empresas; e 0,8% do PIB reduzindo deduções fiscais e subsídios à indústria.

Não se trata, nesse caso, de o Estado fazer menos, mas sim de fazer o mesmo com menos ou deixar de fazer aquilo que é desnecessário e exageradamente oneroso. Talvez uma agenda de ajuste fiscal que seja vendida como uma forma de melhorar o funcionamento do Estado tenha maior apoio público num País que testemunhou imensas manifestações populares em 2013 em prol de serviços públicos melhores e mais baratos. (fernando.dantas@estadao.com)

Fernando Dantas é colunista do Broadcast

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Esta coluna foi publicada em 2/3/18 pelo Broadcast.

Opinião por Fernando Dantas
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