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Economia e políticas públicas

Opinião|Onde está o gasto que dá para cortar (e que faça diferença)?

Fabio Giambiagi sintetiza o desafio fiscal brasileiro à frente, e mapeia as despesas para mostrar que não há soluções fáceis para economizar.

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Atualização:

Desde pelo menos a década de 90 o Brasil se debate com a questão do ajuste fiscal das contas públicas. Nessas décadas, houve períodos relevantes de superávit primário do setor público consolidado, como houve também fases de irresponsabilidade fiscal ou simplesmente dificuldades políticas insuperáveis para fazer o que é necessário.

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O economista Fabio Giambiagi, do BNDES e do Ibre-FGV, está entre os especialistas que mais minuciosamente acompanharam essa longa trajetória de altos e baixos na gestão das contas públicas brasileiras.

Ele organiza os números do debate fiscal de forma a mostrar claramente a dificuldade da tarefa neste momento, e como muitas "saídas" preconizadas não chegam nem perto de resolver o problema.

Os gastos primários do governo central, incluindo transferências a Estados e municípios, saíram de cerca de 13,5% do PIB em 1991 para 22,9% em 2019, com um pico de 23,5% do PIB em 2016.

A despesa de pessoal ativo e inativo saiu de aproximadamente 3,8% em 1991 para 4,3% do PIB em 2019. Mas esse item já atingiu pontos bem mais altos que o atual nesse período, ultrapassando 5% do PIB em meados dos anos 90, e com novas altas no final da década passada e no início da retrasada.

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A mais recente elevação, a partir de 2015, é parcialmente explicada pela queda do PIB, o denominador, na recessão de 2014-16. Mais proximamente, em valores reais, a despesa de pessoal caiu de R$ 361 bilhões em 2019 para R$ 334 bilhões projetados para este ano.

Em outras palavras, um crescimento de 0,5 ponto porcentual do PIB do gasto com pessoal entre 1991 e 2019, considerando todo o crescimento dos serviços e programas do Estado brasileiro desde a Constituinte, não é nada extravagante.

O setor público brasileiro tem muito a melhorar no seu funcionamento, mas não é da folha salarial dos servidores que vai sair uma fatia substancial do ajuste estrutural das contas públicas requerido.

Quando se olha a despesa do INSS, que saiu de pouco acima de 3% do PIB em 1991 para 8,9% em 2020, encontra-se efetivamente a rubrica majoritariamente responsável pelo desequilíbrio fiscal estrutural do Brasil.

Mas o País acaba de sair de uma reforma previdenciária robusta, e Giambiagi recomenda uma nova rodada parcial apenas no médio prazo, por razões óbvias de realismo.

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O economista reúne os gastos federais fora do INSS e da folha de ativos e inativos no item "outras despesas". Essas subiram cerca de 4% em 1991 para um pico de 8,2% em 2014, e de lá até 2019 caíram para 6,3%.

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Giambiagi faz um "zoom" sobre as 'outras despesas', esmiuçando-as em detalhe, e a constatação é de que comprimir de forma fiscalmente relevante esse item dependeria de reduzir os investimentos da União para níveis ainda mais ridiculamente diminutos que o atual.

O pesquisador mostra que algumas bandeiras de corte de despesas públicas muito importantes do ponto de vista simbólico não são, infelizmente, significativas do ponto de vista fiscal.

As aposentadorias e pensões do Judiciário, por exemplo, aumentaram de 0,09% do PIB em 1995 para 0,16%, num avanço de 0,07 pp de PIB. É aí que estão as superaposentadorias de juízes, tão criticadas, mas não é daí que vai se extrair uma economia relevante para o esforço fiscal exigido.

Na sua lista de recomendações para viabilizar o ajuste fiscal estrutural do Brasil, Giambiagi cita uma nova regra de teto - ele quer mudar o dispositivo atual para, na verdade, preservar o mecanismo de limitação de despesas, que funciona bem, em sua visão -; a aprovação de subtetos (como para despesas correntes, que excluem investimentos); reestruturação do gasto social; e, inclusive, aumento do investimento.

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Ainda assim, seria preciso aumentar a receita, além de rever as práticas orçamentárias, que se deterioraram nos últimos anos, como no caso das emendas de relator.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast (fernando.dantas@estadao.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 6/10/2021, quarta-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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