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Economia e políticas públicas

Opinião|Os serviços e a folia eleitoral

Resultado da Pesquisa Mensal de Serviços (PMS) de maio surpreende para cima, mas turbinada fiscal da atividade pelo governo pode deixar conta amarga para 2023 e 2024.

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Foto do author Fernando Dantas
Atualização:

A Pesquisa Mensal de Serviços (PMS) de maio, divulgada hoje, é mais uma surpresa positiva em termos de atividade econômica. Nos últimos meses e semanas, vai ficando claro que o pessimismo com o PIB de 2022 no início do ano estava equivocado. Tanto a atividade quanto o mercado de trabalho estão se revelando mais aquecidos do que se previu.

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Em maio, o volume de serviços prestados aumentou 0,9% ante abril (com ajuste sazonal, como todos os números relativos a essa base de comparação na coluna), bem acima da mediana das expectativas do Projeções Broadcast, de 0,2%, e próximo ao topo das projeções, de 1%.

Luana Miranda, economista da Gap Asset, no Rio, destaca o crescimento de 1,9% dos serviços prestados às famílias em maio, em relação a abril. Segundo a economista, essa categoria é importante na composição do PIB, e ainda tem espaço para crescer, situando-se, em maio, 7% abaixo do nível pré-pandemia.

Mas ela acrescenta que o bom resultado dos serviços foi disseminado entre as categorias, com altas de 0,9%, 1%, 0,9% e 3,1% ante abril em, respectivamente, serviços de informação e comunicação, serviços profissionais e administrativos, 'transportes, armazenagem e correio', e outros serviços.

Com a surpresa positiva na PMS de maio, Miranda elevou sua projeção de crescimento do PIB no segundo trimestre (ante o primeiro, com ajuste sazonal) de 0,6/0,7% para 1%.

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Já em relação ao ano fechado de 2022, a analista diz que "caminhamos para um PIB acima de 2%".

Ela nota que, se sua projeção de 1% para o segundo trimestre estiver correta, o carrego estatístico para o terceiro e quarto trimestres será de 2,4%. Isso significa que, se a economia ficar parada no nível do final do primeiro semestre até o fim do ano, o crescimento em 2022 será de 2,4%.

Miranda chegou anteriormente a prever queda no terceiro trimestre, mas revisou para crescimento de 0,4% (ante o tri anterior).

Ela justifica a mudança dizendo que "a atividade se mostrou mais resiliente do que o esperado ao longo do segundo trimestre, o que também aumenta o carrego, e há ainda a PEC dos novos benefícios [auxílio Brasil de R$ 600 e outros] que vai injetar R$ 41 bilhões na economia no segundo trimestre".

Com uma projeção de leve queda do PIB no quarto trimestre, sua projeção para o ano, que está sendo revisada, deve ficar próxima do carrego para o segundo semestre (+2,4%).

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Está tudo muito bem, mas a economista pondera que a PMS de maio, para o Banco Central, "não foi uma boa notícia". E, não sendo uma boa notícia para o BC, isso significa que tampouco é uma boa notícia para todo mundo num horizonte mais largo.

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O raciocínio é simples. O BC, para tentar controlar a disparada da inflação, vem praticando fortíssimo aperto da política monetária desde março do ano passado, levando a Selic, a taxa básica de juros, de 2% para 13,25%.

Só que Bolsonaro, na tentativa desesperada de sair da condição de segundo lugar nas pesquisas eleitorais, bem atrás de Lula, faz um grande esforço no sentido contrário - com a dócil anuência da equipe econômica de Paulo Guedes -, quase todo com as ferramentais fiscais.

Dessa forma, já houve antecipação de 13º de funcionários e liberação de FGTS, e de agosto em diante devem entrar com força os R$ 41 bilhões da PEC dos benefícios.

Miranda nota que, como a maior parte da PEC vai para brasileiros pobres, com baixa propensão a poupar, será dinheiro injetado na veia do consumo, com destaque para alimentos e outros bens não duráveis. O efeito deve ser similar, o que não quer dizer da mesma intensidade, ao do auxílio emergencial na pandemia.

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E, agora em 2022, ainda há a desoneração da gasolina (principalmente), energia e comunicação, que aumenta a renda disponível.

Com o BC pisando no freio e Bolsonaro e Guedes pisando no acelerador, o tal do efeito defasado da  política monetária apertada sobre a atividade "está defasando" ainda mais do que de costume, tardando a vir. Essa é a razão de as projeções de crescimento para este ano subirem.

Em nota divulgada hoje após a divulgação da PMS de maio, o Credit Suisse (Solange Srour, Lucas Vilela e Rafael Castilho) diz acreditar que o crescimento econômico vai desacelerar nos próximos trimestres devido aos efeitos defasados da política monetária, mas faz uma ressalva.

Segundo o banco, a probabilidade de o crescimento em 2022 ficar acima da sua atual projeção de 1,4% aumentou. Eles citam o corte de impostos para eletricidade, combustíveis e comunicações e a PEC dos benefícios.

"O setor de serviços também está mostrando um dinamismo maior do que o anteriormente esperado", acrescenta o relatório.

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O problema é que, enquanto os efeitos da política monetária não se fazem sentir - provavelmente por estarem sendo abafados pelas medidas eleitoreiras -, a inflação muitíssimo acima da meta prossegue e vai criando inércia, tornando-se mais difícil de combater.

Miranda nota que o juro real medido pelo juro referencial do mercado privado de um ano contra a expectativa de inflação nos próximos 12 meses bateu ontem em 8,35%, nível próximo ao do governo Dilma no ano de crise de 2015, quando se atingiu um pico de 9,58%.

É uma enormidade de juro real, que em algum momento atingirá com força a atividade para fazer com que a inflação desça de forma relevante em direção à trajetória da meta.

Se não chegar em 2022, por causa da folia eleitoreira de Bolsonaro e Guedes, essa conta será transferida para 2023 e 2024. Para 2023, a economista prevê crescimento do PIB de apenas 0,2%, mas já não descarta que o número seja negativo.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast (fernando.dantas@estadao.com)

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Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 12/7/2022, terça-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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