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Economia e políticas públicas

Opinião|Petróleo é termômetro da demanda global

Ben Bernanke, ex-presidente do Federal Reserve (Fed, BC americano), analisa por que cotação do petróleo e índices das Bolsas estão andando juntos.

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Atualização:

Um fenômeno intrigante dos mercados globais recentemente são as flutuações simultâneas - com o sentido predominante de queda - do preço do petróleo e dos mercados acionários. Na visão mais simples de quem acompanha o mercado no dia a dia, as ações seguem os recuos do barril. Isto em princípio contraria a lógica econômica, se for levado em conta que petróleo mais barato aumenta a renda do Leste Asiático, da Europa e até dos Estados Unidos - isto é, de uma parcela esmagadoramente majoritária da economia mundial.

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Há diversas tentativas de explicação da aparente contradição: os ganhadores com o petróleo barato não sabem se a vantagem é permanente, e por isso não aumentam seus gastos; o petróleo e o setor de matérias-primas minerais (que cai junto) representaram uma parte expressiva do investimento no mundo nos últimos anos, o que agora deve retroceder; a queda brusca de preços põe em riscos países, grandes empresas e, em consequência, até os bancos, o que aumenta o risco no mundo; e, finalmente, os operadores das bolsas percebem quedas do barril como sinais de mais enfraquecimento da economia global, aumentando o pessimismo e as ordens de venda.

Quem entrou hoje nesse debate, com um artigo em seu blog, foi o ex-chairman do Federal Reserve (Fed, BC dos EUA), Ben Bernanke.

Ele investiga a possibilidade de que, em vez de a queda do petróleo provocar recuos nas bolsas, o que esteja ocorrendo seja uma reação simultânea de ambos - petróleo e ações - ao enfraquecimento da demanda agregada global que, nas palavras do economista, "prejudica tanto o lucro das empresas quanto a demanda por petróleo".

Mais adiante no artigo, ele acrescenta que resultados dos exercícios estatísticos que fez, com colaboração de outros economistas, "são consistentes com a ideia de que, quando operadores de bolsa reagem a uma mudança no preço do petróleo, eles não o fazem necessariamente porque o movimento do petróleo traz consequências em si mesmo, mas porque as flutuações no preço do petróleo servem como indicadores da demanda e do crescimento global subjacente".

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Assim, de certa forma, Bernanke dá suporte a visão de mercado de que as quedas no petróleo levam a recuos nas bolsas, mas com ênfase no fato de que o preço da commodity, no caso, está funcionando como um termômetro da demanda global.

Em termos do seu método analítico, o ex-chairman do Fed primeiro investiga a relação pura e simples entre a evolução do preço do petróleo e do índice S&P500 desde 2011, notando que às vezes andam juntos e às vezes em direções opostas, mas na média a correlação é positiva - isto é, ambos vão na mesma direção. Então a primeira constatação é que os recentes movimentos não são uma novidade.

A partir daí, ele usa um método em que se computam também a evolução de outros indicadores sensíveis à demanda global - preços de commodities em geral, juros de longo prazo e o dólar.  Dessa forma, conclui-se que 40% a 45% do declínio dos preços do petróleo desde junho de 2014 podem ser atribuídos à fraqueza inesperada da demanda pela matéria-prima. Em seguida, encontra uma correlação de 0,48 entre os preços das ações e o componente de demanda da queda do petróleo, e de 0,39 quando se toma o preço do petróleo como um todo. A correlação das bolsas com o componente não de demanda da queda do barril é menor, de 0,16. É com essas constatações que Bernanke considera que o petróleo pode estar sinalizando o estado da demanda global aos mercados.

O economista faz outros exercícios, incluindo o Vix, o indicador de volatilidade dos índices acionários. A ideia é testar a hipótese de que os investidores também fujam em paralelo de ações e de commodities quando aumenta a volatilidade. A correlação das ações com o componente do preço do petróleo determinado tanto por demanda quanto por volatilidade sobe para 0,68.

Como observação final, Bernanke nota que, neste último exercício, mesmo o componente do preço do petróleo que não está ligado à demanda e à volatilidade tem uma correlação não negativa, próxima a zero, com as ações. Isto em princípio surpreende, porque teoricamente esta componente residual refletiria apenas efeitos positivos da queda do petróleo, em termos de choque de oferta.

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Assim, ele acha que tem mais hipóteses para se examinar sobre a correlação positiva entre ações e petróleo, como a citada ideia de que a queda do barril afete as condições financeiras globais pelo seu forte impacto negativo em países e empresas produtoras da commodity. (fernando.dantas@estadao.com)

Fernando Dantas é jornalista da Broadcast

Esta coluna foi publicada pela AE-News/Broadcast em 19/2/16, sexta-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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