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Economia e políticas públicas

Opinião|Proposta para o agronegócio

Cebri e Insper produzem documento de sugestões de políticas públicas para o agribusiness brasileiro, com destaque para inserção internacional, novas tecnologias e meio ambiente.

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Atualização:

Em ano eleitoral, o que não falta é a elaboração de propostas e programas para o governo em geral, abordando políticas públicas e econômicas relativas aos mais diversos setores.

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É comum se tomar com um grão de sal essa profusão de ideias e boas intenções, em contraste com o descalabro na gestão do País que insiste em se manter por longo período de crise econômica, política e social.

Mas é um erro descartar a priori a produção de propostas da temporada eleitoral. Já houve casos em que boas ideias acabaram sendo postas em prática. O mais emblemático foi o da "Agenda Perdida", pré-programa econômico coordenado por José Alexandre Scheinkman e Marcos Lisboa e adotado no primeiro mandato de Lula - apesar de o documento ter sido encomendado por Ciro Gomes.

Um documento atual oportuno, ao qual os candidatos de 2022 deveriam prestar atenção, tem o título de "Políticas Públicas para a Inserção Competitiva e Sustentável do Agronegócio Brasileiro no Mundo", elaborado pelos pesquisadores Amanda Araújo, Camila Dias Sá, Claudia Cheron König e Marcos Sawaia Jank, numa iniciativa conjunta do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri) e do Insper.

O documento nota que o protecionismo e o nacionalismo vêm afetando o comércio agrícola internacional, com acesso crescentemente seletivo a mercados.

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Nesse contexto, o Brasil aparece como grande player global no setor, com exportações agrícolas que sextuplicaram de US$ 20 bilhões para US$ 120 bilhões em 20 anos, abrangendo hoje mais de 200 países. Nesse período, China e outros emergentes substituíram a Europa como principais clientes agrícolas do Brasil.

O documento do Cebri e Insper identifica cinco desafios principais para a agricultura brasileira: estratégia internacional, levando em conta que novos concorrentes vêm surgindo com a expansão da fronteira agrícola em outros países; governança, com ênfase na coordenação entre o setor público e privado; acesso a mercado e diversificação e diferenciação da pauta exportadora; inovação e competitividade, em que entram fragilidades como logística, custo energético, mão de obra insuficientemente qualificada etc.; e agenda ambiental, no qual a rastreabilidade da produção é cada vez mais exigida nos mercados globais.

Os cinco grupos de proposições detalhadas do documento são elaborados a partir desse diagnóstico dos desafios.

Em termos de estratégia internacional, recomendam-se o foco em regiões como Sudeste e Sul Asiático e África Subsaariana - cujas parcelas na população humana já são ou se tornarão cada vez mais majoritárias - além de uma definição mais clara de prioridades nas negociações comerciais.

Na área de governança, algumas das pautas são os mecanismos de coordenação de atores públicos e privados; a reforma do arcabouço sanitário datado dos anos 50, com a introdução do "autocontrole" pelas indústrias da conformidade sanitária, acompanhado de duras punições ao descumprimento; a incorporação do princípio de "One Health", que faz o amálgama entre saúde humana, animal e meio ambiente; e a criação de um banco de dados com respostas-padrão sobre o sistema de inspeção brasileiro.

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Em termos de acesso a mercados, diversificação e diferenciação, os autores enfatizam que uma maior abertura no Brasil facilitaria a conclusão de novos acordos comerciais, e que o setor privado deve ser encorajado a tomar as rédeas em ações para defender seus interesses no mercado internacional.

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Também se mencionam oportunidades trazidas por nichos de mercado, como produtos livres de transgênicos e insumos químicos no mercado europeu, ou nutricionalmente mais ricos, na Europa e em outras regiões.

No desafio da competitividade, entre diversos temas, mencionam-se avanços tecnológicos como geotecnologias, rastreabilidade, big data, gestão de informações e a chamada "agricultura de precisão".

Além da sempre presente cobrança de melhoras e integração de rodovias, ferrovias, portos e setor marítimo, o documento trata também da redução da "dualidade da agricultura", com a integração competitiva dos pequenos produtores e da agricultura familiar.

Na área de meio ambiente, finalmente, a proposta é a "construção da imagem (marca) do Brasil como potência agroambiental". Os autores notam que o código florestal é uma "legislação moderna e das mais rigorosas do mundo", mas tem problemas de implementação ligados a lacunas como a validação de dados declarados no Cadastro Ambiental Rural (que só chegou a 1,6% do objetivo) e a implantação dos Programas de Regularização Ambiental (CAR).

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O documento também observa que a desburocratização da governança de terras é bem-vinda, mas com cuidado para não "induzir a continuidade da ocupação de terras públicas e, por consequência, o desmatamento".

Outros temas tratados são a expansão dos sistemas de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILFP) e o plantio direto, "aliados à baixa pegada hídrica e à matriz energética limpa e renovável do país, [que] certamente facilitam a construção da imagem do Brasil como um país com potencialidades agrícolas e em descarbonização".

Na conclusão do conjunto de propostas, é mencionada também a questão da segurança alimentar, que ganhou destaque com o recente avanço da fome na esteira da crise econômica.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast (fernando.dantas@estadao.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 24/6/2022, sexta-feira.

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Opinião por Fernando Dantas
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