Foto do(a) blog

Economia e políticas públicas

Opinião|Qual o verdadeiro PT?

Posições de Marcio Pochmann, que participa da elaboração do programa petista, batem de frente com ideias de Nelson Barbosa, ex-ministro de Dilma e ligado ao PT.

PUBLICIDADE

Foto do author Fernando Dantas
Atualização:

Qual é o verdadeiro PT, quando o assunto é política econômica? Por um lado, há economistas ligados ao partido, como Nelson Barbosa, ex-ministro da Fazenda, que vêm pregando reforma da Previdência, reforma da remuneração dos servidores, responsabilidade fiscal, etc.

PUBLICIDADE

Do outro, há economistas como Marcio Pochmann, que em entrevista publicada ontem (29/4/18, domingo) pelo Estadão, realizada pelas jornalistas Renata Agostini e Luciana Dyeniewicz, diz que "a questão fiscal se resolve com o crescimento", e que "não tem resolução de curto prazo" para a Previdência, aparentemente descartando ou no mínimo tirando a importância da reforma previdenciária.

Um dos formuladores do programa de governo do PT, Pochmann tem ideias que entram em choque frontal com a agenda de Barbosa e de outros economistas que trabalharam com o ex-ministro da Fazenda, como Manoel Pires, hoje pesquisador associado do Ibre-FGV (assim como Barbosa).

As posições de Pochmann tampouco parecem coincidir com o que se supõe seja a agenda de petistas tido como mais moderados, como o ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, cotado como possível candidato a presidente em substituição a Lula.

Existe uma ideia muito ruim no Brasil de que programas de governo são meras peças de propaganda, pouco importantes, e de que o eleitor ignorante, seduzido pelo carisma do candidato escolhido, está pronto para dar um apoio cego a qualquer política pública decidida pelo "ungido" quando chegar ao poder.

Publicidade

Dois episódios de estelionato eleitoral da história recente, com graves consequências políticas - a desvalorização do real por FHC em 1999 e a escolha de Joaquim Levy para a Fazenda por Dilma em 2015 -, não foram suficientes para convencer os políticos da seriedade com que devem encarar programas de governo e promessas de campanha.

Existe hoje no Brasil o embrião de um debate político-econômico sério e consequente. A corrente de economistas ligada ao PSDB e aos partidos e candidatos de centro-direita tornou-se mais explicitamente liberal, defendendo uma privatização mais ampla, uma redução drástica do intervencionismo do Estado e a abertura unilateral da economia.

Pelo outro lado, economistas de centro-esquerda mais próximos ao PT veem espaço para a política industrial e são mais cautelosos quanto à abertura comercial, que idealmente deveria ser feita com contrapartidas dos parceiros.

São discussões relevantes, que podem ser travadas com civilidade, deixando aos cidadãos a tarefa de decidir o que lhes parece melhor para o País.

Entretanto, tanto um lado quanto o outro do debate mencionado acima concordam quanto a alguns pontos básicos: necessidade da reforma da Previdência, ajuste fiscal, reforma da remuneração dos servidores, câmbio flutuante, metas de inflação, equilíbrio macroeconômico, reforma tributária para tornar o sistema mais progressivo e pró-produtividade, etc.

Publicidade

Quando entra em campo um economista como Pochmann, falando em nome do PT, o que se tem é a ruptura dos pontos de consenso mencionados acima.

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

Pochmann tem o direito de defender o que quiser, claro, mas é inegável, pela sua entrevista ao Estadão, que a sua agenda é muito próxima da nova matriz econômica. Para ele, a culpa da crise é do juste ortodoxo de Levy em 2015, das "políticas neoliberais" de Temer e da Lava-Jato, o que significa absolver inteiramente a política econômica do primeiro mandato de Dilma Rousseff.

Além disso, Pochmann defende o papel do BNDES no apoio a grandes empresas, que lembra muito a política das "campeãs nacionais", critica a atual contenção dos bancos públicos e sugere algum esquema - não muito claro - pelo qual o governo assume riscos dos investidores de longo prazo.

Os economistas de centro-direita abominam a política econômica rotulada de "nova matriz", uma avaliação que alguns da centro-esquerda acham exagerada. Contudo, mesmo estes últimos têm críticas relevantes à parte da política econômica do primeiro governo de Dilma Rousseff.

Barbosa, por exemplo, que saiu do cargo de secretário-executivo da Fazenda em 2013, já se pronunciou nesse sentido. É de se crer que um governo petista em que ele fosse o formulador mais relevante de política econômica em hipótese nenhuma reeditaria a polêmica nova matriz. Já com Pochmann, a impressão é exatamente a oposta.

Publicidade

O PT, portanto, parece até agora cultivar a confusão em termos de programa econômico. O desastre político de 2015 não foi uma lição suficientemente clara para o partido. (fernando.dantas@estadao.com)

Fernando Dantas é colunista do Broadcast

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 30/4/18, segunda-feira.

Opinião por Fernando Dantas
Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.