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Economia e políticas públicas

Opinião|Questão de confiança

O presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, vem batendo na tecla de que a recuperação da confiança é essencial para que a tênue retomada da economia brasileira prossiga. De fato, o segundo trimestre, que possivelmente registrará índices aceitáveis de crescimento do PIB e da indústria, terminou em nota negativa em termos de confiança.

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Atualização:

Os índices de confiança, que já vinham claudicando nos últimos meses, caíram fortemente em julho. O Índice de Expectativas Empresariais (IEE) e o Índice de Expectativas do Consumidor (IEC), ambos da FGV, recuaram respectivamente 4,1% e 1,6% no mês passado.

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É fácil pensar causas para a piora da confiança, como a desvalorização do câmbio e a alta dos juros de mercado, na esteira de sinais de normalização da política monetária americana; a desaceleração na China; e as manifestações de junho no Brasil, que tiveram um efeito imediato de perturbar o comércio e a indústria e lançam dúvida sobre o quadro político daqui em diante.

Por outro lado, há certa perplexidade em alguns analistas com a virulência do efeito daquelas causas sobre a confiança. Às vezes, é difícil concatenar a força e a extensão do ocorrido com suas aparentes causas. Num à parte anedótico, este colunista conversou hoje com um integrante da banda de um dos mais famosos astros da música popular brasileira, e ele relatou que as vendas de ingressos para um show no Rio em agosto, curiosamente, tiveram uma grande queda a partir do momento em que se iniciaram as manifestações. É de se perguntar por que um protesto em junho faria alguém deixar de comprar um ingresso para um show em agosto.

De qualquer forma, está claro que a confiança, um ingrediente de natureza muito psicológica, está no centro do nó que hoje parece minar a energia da economia brasileira.

Para um experiente analista do mercado financeiro, a grande questão atual é saber como o governo vai lidar com essa crise da confiança. Outra dúvida crucial é a de saber se a forte piora das expectativas é um fenômeno persistente ou circunstancial. Fica claro que, quanto mais adequada for a reação do governo, maiores as chances de que o mau momento psicológico seja passageiro.

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Aquele analista lista diversos tópicos importantes para aumentar a confiança empresarial: a capacidade da presidente Dilma Rousseff de reestabelecer uma boa relação com o Congresso; o processo de concessões de ferrovias e rodovias, e como o governo vai lidar com a questão da taxa de retorno; a consistência da política fiscal, que deveria ser apertada para ajudar o Banco Central no combate à inflação; e a política monetária em si, sobre a qual ainda restam algumas dúvidas em termos da sua real determinação de fazer a inflação convergir para o centro da meta em prazo razoável.

Uma última questão, segundo o analista, é a da permanência do ministro da Fazenda, Guido Mantega, no cargo. Apesar de todos os desmentidos oficiais, ele observa, permanecem os rumores sobre troca de comando na Fazenda. Esta incerteza, evidentemente, não ajuda em nada a confiança, mesmo porque está longe de claro qual seria o perfil de um eventual novo ministro no caso da hipotética saída de Mantega.

O analista nota que junho e julho foram meses marcados por manifestações, férias, visita do Papa e recesso no Congresso. De certa forma, a pauta de política pública arrastou-se mais devagar. "Agora, em agosto, é que o segundo semestre começa, e é a hora em que o governo poderia dar um impulso na confiança", ele diz.

O atual chairman do Goldman Sachs no Brasil, Paulo Leme, acha que a questão chave para melhorar a confiança e a credibilidade é a previsibilidade e a transparência da política econômica, e um casamento racional de instrumentos com objetivos.

"A política tem de ser consistente e crível", ele diz. Para Leme, isto significa usar a taxa básica de juros (Selic) para combater a inflação, deixar que o câmbio faça o reequilíbrio requerido no balanço de pagamentos, ter a política fiscal como instrumento de gestão de demanda e retomar reformas para aumentar a produtividade e o crescimento potencial.

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O economista Samuel Pessôa, sócio da gestora Reliance em São Paulo e pesquisador do Ibre/FGV, tem uma conta esquemática para o que considera a queda de cerca de dois pontos porcentuais no potencial de crescimento da economia brasileiro do segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para o governo de Dilma Rousseff (de cerca de 4% para 2%).

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Meio ponto porcentual seria atribuível à piora do cenário internacional, meio ponto a problemas demográficos (basicamente, a redução do ritmo de crescimento da população em idade de trabalhar) e um ponto porcentual à piora da política econômica, no que ele chama de "ensaio de nacional-desenvolvimentismo". Na conta deste ensaio, o economista coloca inúmeras ações do governo, como a mudança do modelo do petróleo para o pré-sal, o agigantamento do BNDES e o festival de desonerações setoriais.

Pessôa acha que a piora da política econômica afeta tanto a eficiência diretamente, travando o aumento da produtividade pela má alocação dos recursos, quanto a confiança das empresas.

Esta coluna foi publicada originalmente na AE-News Broadcast

Fernando Dantas é jornalista do Broadcast. E-mail: fernando.dantas@estadao.com

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Opinião por Fernando Dantas
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