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Economia e políticas públicas

Opinião|Rumo a um "pipeline gordo" de infraestrutura

Especialista Claudio Frischtak fala dos avanços em infraestrutura no governo Temer e início da gestão de Bolsonaro, e do muito que ainda há por fazer.

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Foto do author Fernando Dantas
Atualização:

Apesar de não estarem no foco das atenções, capturado pela reforma da Previdência, os investimentos em infraestrutura estão relativamente bem encaminhados, na visão do consultor Claudio Frischtak, especialista na área.

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O desafio é enorme, na sua visão. Segundo Frischtak, à frente da consultoria Inter.B, o Brasil deve investir em 2009 menos de 2% do PIB em infraestrutura. Pelos seus cálculos, o País necessita investir nesta área 4,2% do PIB por 20 anos para recuperar o tempo perdido.

Observando que o Estado brasileiro "está quebrado", o consultor aponta o fato evidente de que esse esforço adicional de investimento em infraestrutura terá de partir do setor privado.

Para tanto, é necessário preencher algumas pré-condições. Frischtak menciona algumas bem conhecidas, como reduzir o grau de imprevisibilidade regulatória e de insegurança jurídica.

Mas ele acrescenta outra pré-condição, menos alardeada:

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"As empresas que investem nesse setor não investem em único ativo, porque os custos fixos são muito grandes - elas precisam de uma carteira de ativos diversificada, e, para isso, é preciso haver um pipeline gordo de projetos, que dê uma perspectiva de médio e longo prazo", diz.

Frischtak considera bastante positivo o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), criado no início do governo Temer. Dessa forma, diz que "o governo acertou na escolha do ministro, a ideia é não reinventar a roda e o PPI foi um arranjo institucional que deu certo". Ele se refere à nomeação de Tarcísio Gomes de Freitas para ministro da Infraestrutura. Antes da nomeação, Freitas atuou como coordenador de projetos do PPI.

Entre os pontos positivos do PPI, o consultor cita a criação de algo próximo - ainda não se chegou totalmente lá - do conceito internacional de "janela única". Trata-se, para o investidor, de um canal de interlocução com o governo, por meio do qual possa tratar e encaminhar todas as suas demandas, em vez de ter que catar uma a uma em diferentes agências, Ministérios e departamentos.

Outra virtude do PPI foi, nas palavras de Frischtak, "a tentativa de estabelecer alguma prioridade, em função da exequibilidade dos projetos". Ele menciona rodovias, portos e transmissão elétrica, além de petróleo e gás.

O consultor identifica uma série de iniciativas, horizontais e setoriais, que já estão em curso, com recuos e avanços, e que podem contribuir para a retomada do investimento em infraestrutura no País, e introduzir competição no sistema.

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Ele cita, por exemplo, a lei das agências reguladoras que saiu bastante boa do Senado, foi piorada na Câmara, e agora ele espera que seja resgatada na volta ao Senado. A adesão do Brasil à OCDE é outro passo que, na sua visão, dará segurança não só ao investidor internacional, como também ao doméstico.

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Uma área em que o Brasil está dramaticamente atrasado, relativamente a países de renda semelhante, na visão de Frischtak, é o saneamento básico. Ele nota que a MP 844, que trazia mudanças importantes no setor, caiu no final do ano passado, e espera que o atual governo edite uma nova MP que mantenha o que considera essencial na anterior: forçar a competição no setor, e remeter à Agência Nacional de Águas (ANA) a regulação do saneamento quando o município ou Estado quiser recursos federais.

"Hoje infelizmente existe uma coalizão de atraso no saneamento básico, que impede e dificulta a participação do setor privado; os governadores e as empresas estaduais não querem perder poder", comenta o consultor.

No segmento de ferrovias, Frischtak elogia o projeto do senador José Serra (PSDB-SP) que está no Senado, que permite o regime de autorização, mais simples, para a entrada do setor privado, em vez da concessão.

Para o consultor, "esse projeto pode revolucionar o setor ferroviário", permitindo a exploração das chamadas "short lines", trechos ferroviários com pouca receita, e que envolvem investimentos menores. Ele também se mostra animado e aponta caminhos e iniciativas já existentes, ou que estão sendo cogitadas, para áreas como portos, aeroportos, rodovias, hidrovias e petróleo e gás.

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Segundo Frischtak, o Brasil pode estar no limiar de uma transformação na infraestrutura, "mas o governo e a sociedade têm que empurrar". Ele lembra o conceito de "easy life" do monopolista, criado pelo prêmio Nobel de Economia, John Hicks, que faz com que uma agenda desse tipo nunca seja consensual - quem está aproveitando a boa vida da falta de competição sempre se colocará contra.

"Por isso é necessário conhecimento, capital político e disposição para ir contra a vida fácil de alguns", conclui Frischtak.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 14/2/19, quint-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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