Apesar de não estarem no foco das atenções, capturado pela reforma da Previdência, os investimentos em infraestrutura estão relativamente bem encaminhados, na visão do consultor Claudio Frischtak, especialista na área.
O desafio é enorme, na sua visão. Segundo Frischtak, à frente da consultoria Inter.B, o Brasil deve investir em 2009 menos de 2% do PIB em infraestrutura. Pelos seus cálculos, o País necessita investir nesta área 4,2% do PIB por 20 anos para recuperar o tempo perdido.
Observando que o Estado brasileiro "está quebrado", o consultor aponta o fato evidente de que esse esforço adicional de investimento em infraestrutura terá de partir do setor privado.
Para tanto, é necessário preencher algumas pré-condições. Frischtak menciona algumas bem conhecidas, como reduzir o grau de imprevisibilidade regulatória e de insegurança jurídica.
Mas ele acrescenta outra pré-condição, menos alardeada:
"As empresas que investem nesse setor não investem em único ativo, porque os custos fixos são muito grandes - elas precisam de uma carteira de ativos diversificada, e, para isso, é preciso haver um pipeline gordo de projetos, que dê uma perspectiva de médio e longo prazo", diz.
Frischtak considera bastante positivo o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), criado no início do governo Temer. Dessa forma, diz que "o governo acertou na escolha do ministro, a ideia é não reinventar a roda e o PPI foi um arranjo institucional que deu certo". Ele se refere à nomeação de Tarcísio Gomes de Freitas para ministro da Infraestrutura. Antes da nomeação, Freitas atuou como coordenador de projetos do PPI.
Entre os pontos positivos do PPI, o consultor cita a criação de algo próximo - ainda não se chegou totalmente lá - do conceito internacional de "janela única". Trata-se, para o investidor, de um canal de interlocução com o governo, por meio do qual possa tratar e encaminhar todas as suas demandas, em vez de ter que catar uma a uma em diferentes agências, Ministérios e departamentos.
Outra virtude do PPI foi, nas palavras de Frischtak, "a tentativa de estabelecer alguma prioridade, em função da exequibilidade dos projetos". Ele menciona rodovias, portos e transmissão elétrica, além de petróleo e gás.
O consultor identifica uma série de iniciativas, horizontais e setoriais, que já estão em curso, com recuos e avanços, e que podem contribuir para a retomada do investimento em infraestrutura no País, e introduzir competição no sistema.
Ele cita, por exemplo, a lei das agências reguladoras que saiu bastante boa do Senado, foi piorada na Câmara, e agora ele espera que seja resgatada na volta ao Senado. A adesão do Brasil à OCDE é outro passo que, na sua visão, dará segurança não só ao investidor internacional, como também ao doméstico.
Uma área em que o Brasil está dramaticamente atrasado, relativamente a países de renda semelhante, na visão de Frischtak, é o saneamento básico. Ele nota que a MP 844, que trazia mudanças importantes no setor, caiu no final do ano passado, e espera que o atual governo edite uma nova MP que mantenha o que considera essencial na anterior: forçar a competição no setor, e remeter à Agência Nacional de Águas (ANA) a regulação do saneamento quando o município ou Estado quiser recursos federais.
"Hoje infelizmente existe uma coalizão de atraso no saneamento básico, que impede e dificulta a participação do setor privado; os governadores e as empresas estaduais não querem perder poder", comenta o consultor.
No segmento de ferrovias, Frischtak elogia o projeto do senador José Serra (PSDB-SP) que está no Senado, que permite o regime de autorização, mais simples, para a entrada do setor privado, em vez da concessão.
Para o consultor, "esse projeto pode revolucionar o setor ferroviário", permitindo a exploração das chamadas "short lines", trechos ferroviários com pouca receita, e que envolvem investimentos menores. Ele também se mostra animado e aponta caminhos e iniciativas já existentes, ou que estão sendo cogitadas, para áreas como portos, aeroportos, rodovias, hidrovias e petróleo e gás.
Segundo Frischtak, o Brasil pode estar no limiar de uma transformação na infraestrutura, "mas o governo e a sociedade têm que empurrar". Ele lembra o conceito de "easy life" do monopolista, criado pelo prêmio Nobel de Economia, John Hicks, que faz com que uma agenda desse tipo nunca seja consensual - quem está aproveitando a boa vida da falta de competição sempre se colocará contra.
"Por isso é necessário conhecimento, capital político e disposição para ir contra a vida fácil de alguns", conclui Frischtak.
Fernando Dantas é colunista do Broadcast
Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 14/2/19, quint-feira.