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Economia e políticas públicas

Opinião|Saída negociada

Mercado sonha com saída negociada de Temer que preserve agenda de reformas, e cenário externo favorável ajuda a acalmar os ânimos. O risco de não haver reforma da Previdência, entretanto, aumentou. E sem ela, Brasil ficará dependente da complacência dos investidores internacionais.

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Foto do author Fernando Dantas
Atualização:

O mercado, que está mais calmo hoje (23/5/17, terça-feira), está apostando suas fichas numa solução negociada para a substituição de Michel Temer na presidência da República. Os rumores circulam, e hoje, por exemplo, uma das alternativas comentadas colocava Fernando Henrique Cardoso na presidência e Nelson Jobim como vice. Parece "bom demais para ser verdade", para quem torce pela continuidade da política econômica atual.

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"O ideal para o mercado seria que Temer renunciasse, mas de uma forma que tornasse possível reaglutinar a base e continuar as reformas", comentou o sócio principal de uma gestora de recursos.

Na visão de outro gestor, um dos elementos do pânico inicial da quinta-feira, 18 de maio, já foi debelado. "Havia o medo de uma queda imediata de Temer e de que a situação política ficasse totalmente descontrolada".

Nesse sentido, o fato de que PSDB, DEM e a base política não tenham rapidamente "puxado o tapete" do presidente teria contribuído para acalmar os ânimos. Na verdade, esse movimento não foi interpretado como um aval para Temer cumprir seu mandato até o fim, mas sim como o estabelecimento de um tempo adequado para que um novo líder seja encontrado e a base de apoio se reorganize.

Uma visão relativamente otimista da situação dá conta de que o Congresso tem uma grande maioria de centro-direita, com a esquerda bastante minoritária. Assim, seja qual for o nome que venha a substituir Temer - desde que escolhido por eleição indireta -, haverá condições para manter uma política econômica nos moldes da atual.

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Que isso seja suficiente para retomar a reforma da Previdência e aprová-la em curto prazo é duvidoso. O nível piorado de preços dos ativos brasileiros hoje, em relação ao período pré 18 de maio, refletiria uma probabilidade bem mais baixa de aprovação da reforma da Previdência. Porém, na suposição de continuidade da política econômica e de que a reforma não saia da agenda, ainda que tenha que ser postergada, é possível imaginar um cenário piorado, mas não de pânico, desde que o ambiente internacional se mantenha favorável.

Por outro lado, o risco para o mercado é que o atual imbróglio institucional deságue numa eleição direta, na qual Lula teria boas chances de se sagrar vencedor. A vasta maioria de centro-direita no Congresso é um sólido bloqueio a essa alternativa, mas não invulnerável. Caso as ruas explodissem em favor das diretas, o Congresso se sentiria forçado a seguir na mesma direção.

Entretanto, como diz o segundo gestor mencionado acima, "não está dando muito a impressão de que as ruas vão nessa direção - por enquanto (o clamor pelas diretas) está restrito à turma do Lula e as manifestações deste domingo (21/5) fora muito fracas".

As condições para algum nível de tranquilidade no mercado também são reforçadas pela combinação de uma inflação muito baixa, que permite em princípio que o BC prossiga no ciclo de redução da Selic (ainda que o próximo passo possa ser menor do que se nada tivesse acontecido, e que o final do ciclo não seja tão baixo como se previa), com um cenário internacional favorável aos emergentes. Persistem a liquidez e a busca por retornos mais elevados.

Sem reforma da Previdência, entretanto, a estabilidade macroeconômica brasileira fica dependurada na complacência do cenário internacional. Em caso de algum choque de aversão a risco, ou mesmo se os passos projetados do Fed e do BCE no sentido de gradual redução de liquidez começarem a ter impacto mais significativo a partir do início de 2018, o Brasil poderia se ver em apuros caso a reforma da Previdência não tenha sido aprovada. Neste cenário, as dúvidas sobre a solvência pública poderiam voltar ao centro do palco, e o fantasma da dominância fiscal poderia retornar. (fernando.dantas@estadao.com)

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Fernando Dantas é colunista do Broadcast

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 23/5/17, terça-feira.

Opinião por Fernando Dantas
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