O resultado do Caged de março, com perda líquida de 43.196 vagas formais, foi muito ruim, num momento em que o governo e a sociedade mais precisam de alguma injeção de ânimo no front econômico. Ainda assim, levando-se em conta as fortes e não previstas oscilações do Caged no primeiro trimestre como um todo, pode-se dizer que o número de março ainda não caracteriza necessariamente um novo desastre no mercado de trabalho. Mas fica claro que a retomada econômica em ritmo devagar quase parando está azedando o panorama do emprego no Brasil - o que é péssima notícia para o governo.
O resultado negativo do Caged em março faz um chocante contraste com a expectativa mediana dos analistas do mercado financeiro consultados pelo Projeções Broadcast, de saldo positivo de 82 mil vagas.
O economista Daniel Duque, especialista em mercado de trabalho do Ibre/FGV, nota que bom resultado de fevereiro e o mau resultado de março no Caged deste ano são explicados em parte pelo Carnaval (que caiu em março). A série dessazonalizada, ele nota, mostra um pequeno resultado positivo em março, de 7 mil vagas.
Mas Duque frisa que "evidentemente, o resultado ruim vai além desse fator conjuntural". O resultado do primeiro trimestre de 2019, com 195 mil vagas formais em termos líquidos, foi inferior ao de 2018, com 164 mil.
"Isso indica que, na margem, a atividade está sofrendo uma desaceleração a partir de uma velocidade que já estava lenta", diz o pesquisador.
Ele nota ainda que a queda de março foi generalizada, com muitos setores fechando vagas, como indústria e construção civil. Já os serviços, que vinham puxando o emprego, desaceleraram em março para um nível ainda positivo, mas próximo de zero - o que é preocupante dado que este setor é a maior parte da economia.
O economista Bruno Ottoni, pesquisador da IDados, empresa de pesquisa de dados em mercado de trabalho e educação, tem uma perspectiva um pouco menos negativa, mas também longe de reconfortadora.
Ottoni faz a sua análise considerando os dados do Caged ajustados (isto é, incluindo respondentes fora do prazo, o que é um número só divulgado um mês depois do não ajustado), com exceção de março, tanto de 2018 e 2019 (porque ainda não há o dado ajustado de março de 2019).
De fato, houve recuo no trimestre, até maior quando a comparação é feita pelo seu critério: 179.543 vagas formais líquidas em 2019, comparadas a 224.249 no mesmo período de 2018.
No entanto, tomando-se a variação em outros diferentes períodos, observa Ottoni, há melhora ou quase empate em 2019 (sempre no critério ajustado, com exceção de março de 2018 e 2019).
Assim, no bimestre fevereiro-março, o saldo líquido foi de 139.232 em 2019, e de 133.182 em 2018. Nos seis meses até março, de -36.316 (2018/19) e -34.258 (2017/2018). No ano até março, de respectivamente, 472.117 e 251.325.
Evidentemente, não há nada a comemorar. Mas Ottoni efetivamente vê as fortes oscilações do Caged, particularmente neste início de ano, como um fator para se ter cautela antes de ir longe demais nas conclusões a partir do número de março - embora ele comungue da visão de que, na melhor das hipóteses, o mercado de trabalho segue numa recuperação tão débil quanto a da economia como um todo.
Fernando Dantas é colunista do Broadcast
Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 24/4/19, quarta-feira.